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Brasília

Saúde do DF vira caso de polícia

Arquivo Geral

18/08/2016 7h00

Atualizada 17/08/2016 23h48

Hugo Barreto

Francisco Dutra e João Paulo Mariano
[email protected]

A Saúde do Distrito Federal virou, para valer, um caso de polícia. Uma operação conjunta do Ministério Público com a Polícia brasiliense fez ontem uma série de buscas e apreensões no próprio Palácio do Buriti.

Para complicar, a Câmara Legislativa virou alvo de investigação do Ministério Público. A conduta de uma série de distritais, incluindo a presidente Celina Leão, foi colocada em xeque por gravações feitas pela ex-vice-presidente da Casa, deputada Liliane Roriz (PTB). Os áudios levantam a suspeita da existência de um esquema para garfar recursos da saúde pública.

Desde denúncia de propina feita pela presidente do SindSaúde, Marli Rodrigues, surgiu o questionamento sobre a ameaça de uma grande rede de corrupção na saúde que chegaria ao Buriti e à esfera federal. Agora, as suspeitas recaem também na Câmara, na qual seguiam os trabalhos da CPI da Saúde, com o objetivo de investigar malfeitos na rede pública. .

No caso dos grampos de Liliane Roriz, o MP instaurou investigações em 12 de agosto. Em uma das gravações da parlamentar, Liliane conversa com Celina Leão. A presidente da Casa diz que a colega estaria dentro de um “projeto”. “Cê tá no projeto, entendeu? Você não tá fora do projeto, não”, afirmou Celina.

Em outro áudio, Liliane conversa com o ex-diretor geral da Câmara, Valério Neves, indicado por Celina para o cargo. Valério diz que a Mesa estava tendo dificuldades com o remanejamento de R$ 31 milhões em emendas. O dinheiro iria para a saúde ou educação. Segundo o ex-diretor, os deputados Julio César (PRB) e Bispo Renato (PR) não conseguiram sucesso em uma negociação com um empresário. No entanto, graças a suposto contrato para pagamento de dívidas de UTIS acompanhado pelo deputado Cristiano Araújo (PSD), o grupo teria êxito. Então foram remanejados e gastos R$ 30 milhões.

Procurada pela reportagem do Jornal de Brasília, a deputada Liliane Roriz não quis comentar o caso. O escândalo causou mal estar dentro da Câmara. Os integrantes da Mesa Diretora não foram vistos pela Casa. Segundo o presidente da CPI da Saúde, Wellington Luiz (PMDB), a comissão pretende incluir as denúncias de Liliane nas investigações que já estão em curso. “Os fatos estão colocados pela mídia. Ainda são extra-oficiais. Mas vamos apurar com cautela e sem negligência”, comentou.

Na análise de Wellington, os deputados citados neste turbilhão de denúncias não têm mais condições de participar da CPI, mesmo sem qualquer pré-julgamento. “É um decisão que deveria ser deles. Eu não ficaria mais”, afirmou. Neste caso, o deputado se refere à Cristiano Araújo, Bispo Renato, Robério Negreiros (PSDB) e também a Julio César, cotado para ingressar na comissão com a iminente saída de Roosevelt Vilela (PSB) – Ele deixará a Casa com o regresso de Joe Valle (PDT).

“Não creio que ninguém tenha capacidade de barrar a CPI. Ela caminha agora com pernas próprias”, ponderou Chico Vigilante (PT). Sua bancada redigiu nota pública exigindo ampla investigação do caso, com a devida punição de eventuais culpados. Hoje a Mesa Diretora fará um reunião com todos os membros da Casa para examinar o caso.

Buriti questiona postura da CPI

Ao saber do escândalo envolvendo a cúpula da Câmara Legislativa, o Palácio do Buriti questionou as condições da continuidade dos trabalhos da CPI da Saúde. ”As investigações demonstram que essa CPI não tem a menor credibilidade para investigar a saúde. Temos todo interesse de conhecer os fatos. Queremos a investigação e entendemos que só uma instituição independente, como o Ministério Público, tem condições de fazê-la”, declarou o governador Rodrigo Rollemberg. Entre os distritais governistas, a CPI é vista como um palco para ataques contra a gestão Rollemberg e o projeto de contratação de Organizações Sociais (OSs) em serviços da saúde. Dentro do MP, as investigações se dividem em duas linhas. Uma delas é na Promotoria de Justiça da Saúde (Prosus). Outra segue em sigilo na Vice-Procuradoria-Geral de Justiça, por envolver nomes com foro privilegiado.

Equipe faz busca no Buriti

O trabalho da Divisão Especial de Repressão aos Crimes Contra a Administração Pública (DEC AP) e da Promotoria de Saúde do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) começou pela manhã, com desdobramentos no início da noite. Logo cedo, os investigadores deflagraram oito mandados de busca e apreensão no Palácio do Buriti, Codeplan e na residência de três ex-servidores do GDF – um da vice-governadoria e dois da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão (Seplag). A tarde, a Justiça expediu mais mandados de prisão que foram cumpridos a noite. Dessa vez, apenas na Vice-Governadoria, na sala do ex-funcionário.

Os investigadores buscavam informações em computadores, celulares e em documentos que auxiliassem em investigação que é conduzida pela Polícia Civil desde maio. O esquema foi denunciado ao governo pela presidente do SindSaúde, Marli Rodrigues, em dezembro do ano passado.

Os investigados são: o ex-ouvidor da vice-governadoria Valdecir Medeiros, o ex-técnico da Seplag, Edvaldo da Silva e o ex-gerente de Cessões e Requisições da Seplag, Christian Popov. O delegado da DECAP, Alexandre Linhares, afirma: “(O que encontramos) já está corroborando com os primeiros indícios que tínhamos colhido. Cresce a convicção de que havia um esquema criminoso para que os servidores obtivessem benefícios”. O processo corre em segredo de justiça na 3ª Vara Criminal do DF.

De acordo com a DECAP, por meio de ameaças de descredenciamento do sindicato perante ao governo, os servidores tentaram tirar R$ 214 mil do SindSaúde. O esquema funcionava desta forma: todo servidor faz uma contribuição mensal ao sindicato na qual faz parte. Essa contribuição é retirada automaticamente do salário e passa pelo governo que tem uma rubrica para cada sindicato pegar o dinheiro. Se houver alguma irregularidade ou falta de documentação, não é possível usufruir do montante.

Era aí que os suspeitos entravam. Eles faziam contato com o Sindicato falando da irregularidade e davam um prazo pequeno para que não fosse possível corrigir os problemas. Assim, eles ofereciam o serviço de assessoria técnica para resolver a situação, afirmando até que segurariam o processo e que a instituição não seria denunciada.

Versões oficiais

Em nota, a Mesa Diretora da Câmara afirmou que a emenda questionada é da própria Liliane Roriz. Segundo a Casa, os áudios estão “evidentemente” editados, e as conversas, fora de contexto.

A assessoria de Cristiano Araújo declarou que ele só fará comentários quando receber a denúncia formal.

“É evidente que me mantenho na CPI. As suspeitas que pairam sobre alguns não podem manchar os demais. Sou probo e quem pecou que pague por seus erros na Justiça”, disse Robério Negreiros.

O gabinete de Raimundo Ribeiro (PPS), membro da Mesa, não quis se pronunciar.
Bispo Renato negou por nota conhecimento das denúncias e disse ter sido citado indevidamente por terceiros.

Em nota, Julio Cesar também declarou que foi citado indevidamente por terceiros e tomará as medidas necessárias para investigar os fatos .

Todas as partes citadas negaram oficialmente envolvimento em qualquer irregularidade.

Celina Leão parte para o contra-ataque

Sem ressalvas, a presidente da Câmara Legislativa, Celina Leão declarou que a denúncia de Liliane Roriz tem raízes políticas para barrar a CPI e também como vingança contra a Casa, em função da abertura de um processo de cassação contra ela neste ano. Liliane é um dos nomes classificados como aliados da gestão Rollemberg no Legislativo.

“Todos estes áudios foram editados. Essa suposta emenda é aquela que todos os deputados fizeram para ajudar a saúde em 2015. Mas está tudo documentado, vamos desmontar essa armação toda com provas”, rebateu Celina. A presidente fez questão de salientar que a emenda citada nas gravações é da própria Liliane.

Segundo Celina, quando ela falou em “projeto de todos”, queria dizer que a questão envolveria todos os parlamentares da Casa, da base, independentes e da oposição. A presidente da Casa estaria sinalizando que todos iriam juntos dialogar com o Executivo.
A presidente lembrou que a própria Câmara abriu um processo contra Liliane sobre o escândalo dos apartamentos que é objeto de ação judicial. “Essa é uma questão que inclusive está em discussão no Tribunal de Justiça do DF. Na verdade, só estávamos esperando o tribunal se pronunciar, para avançar com a investigação que está na Corregedoria”, argumentou Celina.

Celina afiançou que possui documentos para confirmar a veracidade de cada alegação sua. Lembrou ainda que a denúncia ganhou o público “justamente no momento em que a CPI da Saúde começou a abrir a caixa preta da saúde pública” brasiliense.

Sobre as falas de Liliane com Valério, Celina voltou a enfatizar que os áudios foram editados. “Hoje vou conversar com todos os deputados na Câmara. Vou explicar tudo. E depois à imprensa”, prometeu.

Liliane Roriz renunciou à a vice-presidência. Ela está muito distante, politicamente, de Celina. A presidente busca a aprovação de um projeto de lei para viabilizar a possibilidade de reeleição, mas não contava com o apoio de Liliane.

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