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Brasília

Reviravolta: preso por atropelar PM revela ter sido espancado

De acordo com o dito ao delegado Josué Ribeiro da Silva, o PM viu o homem caído no chão, ensanguentado e cercado por populares, mas não o agrediu e não identificou quem o fez

Olavo David Neto

04/05/2020 18h14

No último sábado (2), a DF-001 foi tomada de tensão. Entre 18h e 19h horas, um Volkswagen Fox vermelho entrou no acostamento da via e fechou uma dupla de ciclistas que percorriam o local. Na confusão, um das vítimas foi arremessada da bicicleta. Era o terceiro-sargento da Polícia Militar (PMDF) André Custódio Braga, 39. A outra, o irmão do militar, Alessandro Augusto Braga, 41. Na ocorrência, lavrada na 12ª Delegacia de Polícia (Taguatinga), André alega lesões no braço quando do suposto atropelamento.

No depoimento, o policial militar afirma que caiu da bicicleta e “apagou”. Quando acordou, além de dores na clavícula e no ombro esquerdos, percebeu que o carro que supostamente o atropelou continuava em movimento, cerca de 100 metros à frente de onde estava deitado. Pendurado na janela estava Alessandro, que, segundo o relato, perseguiu o veículo de bicicleta para evitar um possível fuga. Conforme descreveu o PM, só então o irmão o amparou. Ao constatar a relativa integridade física, André se dirigiu ao carro.

De acordo com o dito ao delegado Josué Ribeiro da Silva, o PM viu o homem caído no chão, ensanguentado e cercado por populares, mas não o agrediu e não identificou quem o fez. O relato do terceiro-sargento, porém, não bate com o depoimento do terceiro-sargento da PMDF Leonardo Rodrigues do Reis, lotado no 17º Batalhão de Polícia Militar (Águas Claras) condutor de uma viatura acionada pelo sistema da corporação às 20h.

Segundo contou Reis na 12ª DP, “o ciclista que é policial militar foi socorrido pela ambulância” do Corpo de Bombeiros (CBM-DF), não tendo “presenciado nenhuma agressão”, e nem visto “o estado de saúde do condutor do veículo”. No hospital, os policiais aguardaram os procedimentos médicos no autor e solicitaram a realização do teste do bafômetro. Conforme o subtenente Valtency Alves de Oliveira, presente numa das viaturas que atendeu ao chamado, Valdez fez o exame “voluntariamente”. O resultado apontou o,76 mg de álcool por litro de ar expelido. “Diante dessa situação foi dada voz de prisão ao condutor”, relatou o PM.

“Foi um milagre”

O motorista do Fox vermelho é o advogado Valdez Santiago Gomes, 77. Em meio à confusão, teve o celular extraviado, forma pela qual uma testemunha encontrou um contato denominado “Meu filho”. Do outro lado da linha, Carlos Eduardo Gomes, 47, recebeu a notícia de que o pai se envolvera num acidente de trânsito e apanhara dos ciclistas até a intervenção verbal da própria testemunha. “Foi um milagre eu ter encontrado meu pai vivo”, afirma Carlos ao Jornal de Brasília.“Cheguei e meu pai estava entrando na ambulância. Perguntei porque bateram nele, mas me mandaram calar a boca”, relatou.

No local, segundo o filho do advogado, cerca de 20 viaturas da Polícia Militar interditaram parte da via nos dois sentidos. A corporação informou à reportagem que duas viaturas compareceram ao local, mas, como o chamado se deu por acidente de trânsito com fuga, é possível que mais veículos oficiais tenham atendido a ocorrência para cercar o local. Os PMs demonstraram desconforto com a aglomeração, formada majoritariamente por moradores do Núcleo Rural 26 de Setembro.

Assim, dispersaram os populares, inclusive testemunhas oculares do episódio – incluindo a que alertara Gomes sobre a situação do pai. “Quando eu peguei meu celular para contatar a corregedoria, eles tomaram meu celular por uns 30 minutos”, acusa o filho de Valdez. Responsável pela guarda do carro – encaminhado ao depósito do Departamento de Trânsito (Detran), onde, segundo o Boletim de Ocorrência, será realizada a perícia -, Carlos acionou a irmã para acompanhar o pai no Hospital Regional de Taguatinga (HRT).

Lá, Luciana Gomes chegou a pedir desculpas aos dois ciclistas supostamente vitimados por Valdez, mas notou certa alegria e descontração entre o Policial Militar e os colegas que o auxiliaram. Segundo Luciana, não havia qualquer tipo de curativo, bandagem ou mesmo tipoia para sustentar o braço esquerdo do PM, onde, em tese, houve luxação no ombro. Quatro policiais fardados aguardavam a liberação de Valdez na ala de Primeiros-Socorros do HRT. Todos ríspidos e hostis, conta Luciana. “Eles estavam tão descontrolados que um policial civil que fica de plantão no hospital chegou a dar voz de prisão, mandando parar de gritar”, relata.

Junto ao pai quando o advogado acordou, ela foi retirada à força da baia onde Valdez estava sentado numa maca para realização do teste do bafômetro. O resultado foi encaminhado à imprensa pela corporação, mas sem preenchimento dos nomes de examinado ou examinador. Valdez Gomes foi liberado do HRT após os procedimentos de saúde, inclusive no Hospital de Base (IHB), onde realizou cirurgia, e está em recuperação na própria residência.

Respostas

André não atendeu às ligações da reportagem nos dois números obtidos pelo JBr. Sem se identificar, a reportagem entrou em contato com o 17 BPM, onde está lotado o terceiro-sargento Braga, mas não foi informada sobre o estado de saúde do militar. A PMDF encaminhou nota à reportagem na qual desconsidera as agressões, já que quando chegada das viaturas, “já estava sendo socorrido pelo CBM, não havendo contato por parte de policiais militares”.

A corporação aponta um atropelamento, graças ao qual o agente “luxou a clavícula, chegando a
desmaiar”, e deixa as investigações à Polícia Civil. Não houve resposta, entretanto, ao questionamento de quantas viaturas se deslocaram ao local no período do acidente, além de possíveis investigações internas para apuração dos fatos. A força não soube informar se André deu entrada no serviço hospitalar da PM.

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