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Brasília

Policiais combinam blitze só para motoboys

Em grupo de aplicativo, policiais também convocaram ato de apoio a colega, a quem chamam de “guerreiro”

Larissa Galli Malatrasi

22/01/2020 6h40

Após a confusão envolvendo um policial militar e um motoboy na portaria do condomínio Carpe Diem, em Taguatinga Norte, na noite do último domingo (19) — e a manifestação da categoria em frente ao edifício na segunda (20) —, um suposto grupo de PMs ameaça fazer uma retaliação aos motoboys de Brasília. O Jornal de Brasília teve acesso a prints de conversas de policiais militares no grupo de whatsapp “União Pela PMDF e CBMDF” com mensagens que sugerem fazer uma “perseguição” à classe.

Em uma das mensagens, um membro do grupo comenta que a retaliação é uma “resposta à altura aos motoboys que se acharam no direito de se unirem e intimidar um policial militar em sua casa, após este policial ter se envolvido em uma ocorrência”, referindo-se à manifestação . “Vamos abordar geral”, ameaça a mensagem.

Nas mensagens, os policiais também combinavam de fazer uma manifestação em frente ao “prédio do nosso guerreiro para unidos nos solidarizarmos a ele”. Um outro integrante do grupo sugeriu que a abordagem generalizada aos motoboys seria mais eficiente. “Por mim, abordar todos os motoboys de Brasília e cumprir à risca o Código de Trânsito seria melhor do que o protesto. Fazer uma blitz só para abordar motoboy”, escreveu. “É mais um vagabundo querendo atrapalhar a vida de um policial. Vai se lascar, motoboy de merda”, dizia outra mensagem.

Um motoboy que não quis se identificar disse ao Jornal de Brasília que se sente intimidado pelas ameaças. “É muito constrangedor. Agora a gente tem que ficar se escondendo, tem que ficar fugindo deles, com medo. A sociedade paga os policiais para proteger a gente, e não para ameaçar”, disse.

“Eu sustento minha família desde sempre com o dinheiro que ganho sendo motoboy. Tive minha moto roubada há 37 dias no Setor de Rádio e TV Norte e a polícia militar não achou até hoje… Mas ficam repreendendo, coagindo e colocando medo na gente”, desabafou o entregador, que trabalha com entrega de comida por aplicativo. ”Sou casado, pago aluguel, tenho três filhos e um pai com depressão que precisam do dinheiro que eu ganho com meu trabalho”, completou.

O presidente do Sindicato do Motociclista (SindMoto), Luiz Carlos Garcia Galvão, contou que teve acesso aos prints das ameaças dos policiais, mas que está tranquilo. “Quem não deve, não teme. Quem está com tudo certo, vai seguir com o trabalho na humildade e simplicidade”, pontuou. “Nós somos a casca do ovo, a parte mais frágil, então temos que manter nossa humildade”, completou.

Em defesa de seus direitos, os motoboys de Brasília estão organizando uma manifestação pacífica — desta vez na Esplanada dos Ministérios — , na próxima sexta-feira (24).

PM também é investigado pela PCDF

Na segunda-feira, o motoboy envolvido na discussão com o policial militar foi preso por receptação, uso de documento falso e adulteração de sinal identificador. Segundo depoimento da PMDF, a corporação recebeu uma denúncia anônima de que a placa da moto do entregador era clonada. A polícia foi, então, até a casa do motoboy onde a moto estava. Ele e o veículo foram conduzidos até a 27ª Delegacia de Polícia, no Recanto das Emas. A moto foi apreendida e o motoboy foi encaminhado para a carceragem da Delegacia de Polícia Especializada (DPE).

O delegado Pablo Aguiar, responsável pelo caso na 27ª DP, disse que a prisão do motoboy e o ocorrido do último domingo são “casos paralelos” e que “um não tem nada a ver com o outro”. Segundo Pablo, a audiência de custódia do motoboy deve acontecer hoje e os juízes decidirão se ele continua preso pelos crimes relacionados ao veículo ou não.

Em nota, a PMDF informou que a moto do entregador tinha a placa clonada de uma motocicleta usada por uma moradora de Aparecida de Goiânia (GO). Segundo informações enviadas pela corporação, a proprietária do veículo original chegou a registrar um boletim de ocorrência Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos de Veículos, no estado de Goiás, no dia 23 de junho, após receber multas em locais pelos quais ela não havia transitado.

O presidente do SindMoto ressaltou que o sindicato sempre reconheceu o motoboy como um trabalhador, apesar dos problemas que teve no passado. “O rapaz estava trabalhando, tentando ganhar a vida. Independente das passagens, nada justifica o policial ter agido daquela forma. Foi um abuso de poder. Ficou claro que ele quis ameaçar — senão, não mostrava a arma”, disse.

PCDF investiga agressão

A investigação da agressão ocorrida na noite do último domingo está sob responsabilidade da 17ª Delegacia de Polícia (Taguatinga Norte). O delegado Mauro Aguiar contou que a participação do policial militar e do motoboy estão sendo investigadas. “Como o policial estava fora do horário de serviço, fica a cargo da Polícia Civil a investigação da conduta dele na situação”, esclareceu.

De acordo com o delegado, a PCDF também está ouvindo as testemunhas que estavam presentes no momento da confusão para aferir o ocorrido. O vídeo que circulou nas redes sociais também foi anexado ao processo.

Em nota, a PMDF afirmou que também vai analisar as imagens do vídeo para verificar e apurar qualquer excesso por parte do militar.

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