Jéssica Antunes
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Mais de 72 mil eleitores brasilienses participam de um pleito obrigatório pela primeira vez na vida neste ano. São jovens de 18 e 19 anos que sequer tinham direito ao voto nas Eleições 2014 por terem idade inferior ao permitido pela legislação eleitoral: 16 anos. Agora, criados com redes sociais e diante de uma disputa polarizada, eles querem ter voz, militam e ficam frente a frente com a urna eletrônica para ajudar a definir os rumos do país.
“Devemos procurar por um Brasil melhor, pegar os erros do passado e não repetir no futuro, mas a juventude parece perdida”, acredita Mirella Cornélio, 18 anos. Aluna de Gestão de Políticas Públicas na Universidade de Brasília (UnB), a moradora do Taquari não se sente representada pelos candidatos que disputam a presidência no segundo turno. “De um lado, temos o PT super criticado. Do outro, um candidato polêmico. Tenho medo do futuro. Medo por mim, por meus amigos, por minha família. Vou sempre escolher a democracia”, resume.
Apesar de ser o primeiro pleito com voz ativa, a estudante conta que sempre se interessou pelo assunto e percebe uma polarização histórica. Nas Eleições 2014, as discussões ocorriam na sala de aula: “Parecia até que a gente votava”. Para escolher os candidatos, ela não vê alternativa além de pesquisar. “Se não for atrás das informações, a pessoa pode ficar alienada pelas notícias falsas”, acredita.
Para Matheus Rezende, o cenário é outro. “Eu nem sabia quem estava na política quatro anos atrás”, confessa. Morador de Samambaia de 18 anos, ele cursa o último ano do Ensino Médio em uma escola particular. Agora, é obrigado a opinar. “Temos muita responsabilidade. A gente tem que buscar o que é melhor para o nosso Brasil, para a nossa sociedade, para a nossa família”, avalia.
Matheus garante que buscou o máximo de informações antes de optar pelos números do primeiro pleito da vida. Ele terá de pesquisar ainda mais para o segundo turno. O estudante diz que não votou em nenhum dos candidatos que chegaram a essa etapa. “Tem até debate na família para decidir. Uma vez teve discussão em casa, mas tranquilo”, conta.
Entre os novos eleitores brasileiros, 2,8 milhões têm 19 anos (1,91%) e 2,3 milhões tem 18 anos (1,58%). No Distrito Federal, 39.727 têm 19 anos (1,91%) e 32.277 têm 19 anos (1,60%).
Política se discute, sim
Eleições também foram assunto discutido em sala de aula. “É o que a gente mais discute nas aulas de sociologia, e acho importante estudar sobre política”, diz Amanda Teixeira, 18 anos. Estudante do 3º Ano do Ensino Médio de escola pública e prestes a enfrentar provas importantes, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e o Programa de Avaliação Seriada da Universidade de Brasília (UnB), ela vê o ano como determinante em todos os sentidos.
Da carteira escolar, ela diz ter aprendido sobre bancadas e legendas partidárias, funções dos votos e funcionamento dos poderes Legislativo e Executivo. “Passamos a ter obrigação de votar em um ano muito difícil. Apesar de sermos da geração da Internet, temos infinitas notícias falsas para lidar e há preguiça de pesquisar. Acho que os jovens estão muito inocentes e correndo o risco de eleger um candidato ruim”, opina a moradora de São Sebastião.
Esperança em meio a escolha difícil
Moradora do P Norte, em Ceilândia, Fernanda Barradas tem 18 anos e faz faculdade Cosmetologia Estética em uma instituição particular. Ela se diz confusa com o pleito. “Não me vejo com poder de escolha”, revela. Para ela, o parecia mais fácil quando era mais jovem e via os pais decidirem os candidatos que votariam nas eleições. Na última, em 2014, ela tinha 14 anos e sequer pensava em política. “Meus pais explicavam, mas eu nunca procurava”, diz.
Fernanda acredita que o meio digital pode ser usado como aliado. “A Internet ajuda a pesquisar sobre cada candidato e a debater com colegas, o que pode agregar”, diz a jovem, confessando que chegou a entrar em embates. “No primeiro turno, votei no que mais me identifiquei, mas não fiquei completamente satisfeita. Agora a escolha é ainda mais difícil. Enquanto tiver um finalzinho de esperança temos que fazer nossa parte”, afirma.
Ponto de Vista
Para o cientista político Murilo Aragão, essa geração é diferente daquela que começou a votar em 2014. “São essencialmente millenials, do novo século, com formação diferente. Não se informam pela imprensa, se comunicam por redes sociais e são de formação mais abrangente, menos ideológica e mais de agendas. De segurança, de políticas de inclusão e gênero, de desenvolvimento econômico, de desemprego”, afirma. De acordo com ele, terem nascido na era da Internet é um facilitador porque facilita o acesso à informação, mas pode faltar leitura diante de tantas possibilidades.
Voto facultativo
O eleitorado de 16 e 17 anos é 33% menor na capital. Nessa faixa etária, os jovens estão aptos a votar de acordo com as exigências do sistema eleitoral, embora não sejam obrigados a comparecer às urnas.
Na ponta do lápis, dados do Tribunal Regional Eleitoral mostram que a quantidade de adolescentes de 17 anos passou de 16.956 no pleito passado para 10.778 (36% a menos). Já aqueles que completaram 16 anos reduziu de 5019 para 3760 (queda de 25%).
No Brasil, são 3,8 milhões. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), apenas 2 milhões fazem parte das estatísticas do eleitorado. Em dez anos, essa faixa etária passou de 2,1% para 1,3% de eleitores.