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Brasília

Mortes caíram pela metade nos 20 anos da faixa de pedestre, mas ainda falta respeito

Arquivo Geral

31/03/2017 7h00

Atualizada 30/03/2017 22h15

Assim como muitos motoristas ignoram a faixa, há pedestres que deixam de utilizá-la. Foto: Breno Esaki

Jéssica Antunes
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Em duas décadas, a faixa de pedestre reduziu em 50% as mortes por atropelamento no Distrito Federal, mesmo com crescimento de 154% da frota de veículos. Segundo dados do Departamento de Trânsito (Detran), as estatísticas passaram de 266 acidentes fatais em 1996, ano anterior à implementação do dispositivo, para 132 em 2016. No ano passado, pelo menos quatro pessoas foram mortas justamente sobre as pinturas que deveriam oferecer segurança. Há falhas de comportamento de motoristas e pedestres, além de problemas com manutenção.

Modelos

  • Ao longo das duas décadas, vários modelos de faixas foram implementados e testados. Há, pelas regiões administrativas, faixas com sinal sonoro, com rebatedores de luz, simples e com demarcação em zigue-zague. Cada situação é pensada individualmente de acordo com as necessidades do local.
  • O sinal sonoro, sempre acoplado a um semáforo, serve para orientar pedestres com deficiência visual. É colocado em pontos específicos, como perto de escolas, onde há mais travessia de pessoas nessas condições, apesar de o item não ser obrigatório. A iluminação, por sua vez, é inserida em locais de visibilidade reduzida.

Em dezembro do ano passado, uma menina de 6 anos morreu após ser atropelada quando atravessava uma faixa de pedestres da Avenida Sucupira, no Riacho Fundo I. Com traumatismo craniano, ela chegou a ser transportada ao Hospital de Base, mas não resistiu aos graves ferimentos. Ela foi uma das cinco vítimas mortas em atropelamentos sobre a faixa naquele ano. O número foi maior que o de 2015, quando quatro pessoas perderam a vida da mesma forma. No ano anterior, foram sete atropelamentos fatais. No pior ano, em 2009, foram 11.

Em 2017, até o momento, nenhum óbito foi registrado. Para o Detran, sequer há registro de atropelamento em faixa de pedestre nos primeiros meses do ano. No entanto, em janeiro, o Corpo de Bombeiros socorreu uma jovem de 20 anos atingida enquanto atravessava uma faixa na EQNP 13/17, no Setor P Norte, em Ceilândia. O motorista, de 30 anos, não tinha carteira de habilitação e foi encontrado com uma porção de maconha.

Comportamento

No trânsito, o condutor do veículo tem obrigação legal de zelar pela segurança e integridade física dos pedestres, que são mais frágeis no tráfego. Os carros têm de parar nas faixas de pedestre, mas também cabe ao transeunte ter bom senso ao atravessar as vias. A aposentada Inês Brandão, por exemplo, não se move até que todos os veículos estejam parados. “Não dá para arriscar. É perigoso porque nem sempre param”, explicou a mulher de 66 anos, momentos após ter o aceno ignorado por um motorista.

Dados

Atropelamentos na década*

  • 3.882 acidentes com morte
  • 1.262 foram em atropelamentos
  • 1.319 pedestres morreram
  • 32% das mortes em acidentes foram por atropelamentos

Por sexo

  • 72,4% das vítimas eram homens
  • 27,5% das vítimas eram mulheres

Por idade

  • Até 9 anos: 5%
  • De 10 a 17 anos: 3,6% (1 em 2017)
  • De 18 a 19 anos: 1,4%
  • De 20 a 29 anos: 12,5%
  • De 30 a 39 anos: 18,2%
  • De 40 a 49 anos: 18,8%
  • De 50 a 59 anos: 11,8% (1 em 2017)
  • 60 anos ou mais: 25,3% (1 em 2017)

* Estatística do intervalo entre 2007 e janeiro de 2017
Fonte: Detran-DF

Antes da implementação da preferência ao pedestre nas pistas do DF, houve massivas campanhas de conscientização, o que tornou a capital exemplo de respeito e cidadania. “Ainda é importante, mas já não é como antes. Os motoristas não se veem como pedestres”, lamenta o aposentado Ronaldo Malagoni, 63 anos. Para ele, é preciso valorizar o caminhar e as pessoas têm de se certificar, cada vez mais, de que o caminho é seguro. “Há muita distração. Muitos chegam na faixa olhando para o celular”, ressalta o homem, que reivindicou mais passagens próximo de casa.

Do outro lado também tem reclamação. “Pedestre não espera o carro parar, se joga em cima da faixa e acaba acontecendo um atropelamento”, diz o gesseiro Wesley de Castro, 30. Ele explica que o carro leva um tempo para reduzir até a parada total e, por isso, quem deseja atravessar deve esperar os veículos estagnarem, por segurança. “Eu mesmo sempre paro, mas pode acontecer algo adverso, o carro de trás bater e causar um acidente.”

Abandono dificulta visualização

Há, em todo o Distrito Federal, cerca de cinco mil faixas de pedestres – muitas desgastadas, apagadas, tampadas por recapeamento asfáltico. A revitalização, assegura o Detran, é contínua. Parte das ações atende a demandas da população encaminhadas à Diretoria de Engenharia. Além das faixas, abrange outras sinalizações como faixa de retenção, zebrados, delimitação de vagas de estacionamento, linha de bordo e faixa contínua. No ano passado, o valor investido em sinalização horizontal e vertical foi de R$ 7,7 milhões.

Para instalação de novas são considerados fatores como o fluxo de pedestres e de veículos, a velocidade regulamentada e as condições do pavimento e de visibilidade do lugar. Quando se trata da implantação de novas faixas, elas necessitam de estudos técnicos.

Ações educativas

Em celebração dos 20 anos da faixa de pedestre, o Detran e o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) farão atividades educativas até segunda-feira. Até as 14h de hoje, atuam no dispositivo em frente ao Colégio La Salle (906 Sul).
Amanhã, a comemoração será no Parque Ana Lídia, das 7h30 às 13h, com blitz educativa e entrega de fôlderes, cartilha educativa e a conscientização sobre a importância da faixa de pedestre e os cuidados com a vida.

Na segunda-feira começa o Projeto Sinalize no Colégio Nossa Senhora de Fátima (906 Sul), das 9h às 11h. Para tudo isso, porém, o Detran não informou quanto será gasto. Segundo o órgão, o valor da campanha de aniversário da faixa ainda não está fechado.

Ponto de vista

“O Distrito Federal deveria estar em um estágio em que o pedestre fosse nitidamente respeitado, e não só na faixa”, opina o especialista em Trânsito Luiz Miúra. Ele lembra que, à época da implementação, gentileza e respeito ditaram a adesão ao dispositivo e, “se evoluíssemos com a mesma inteligência, o cenário seria esse”. “Educação no trânsito tem que ser cuidada como terapia, que precisa de acompanhamento e evolução técnica e inteligente”, defende. As ações realizadas ao longo das décadas, acredita, foram “não evolutivas”: “Teima-se em fazer campanha para que o pedestre atravesse na faixa. Isso não vai surtir o efeito esperado porque não existem ou existirão faixas suficientes. Ainda que tivesse, o hábito de atravessar fora continuaria. O objetivo principal de campanhas tem que ser responsabilizar o motorista, que é quem está com a arma na mão”. Mesmo assim, o especialista crê que o pedestre precisa ser censurado e criticado quando fora de razão.

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