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Brasília

Travessia do medo: brasiliense teme atravessar o Eixão por cima ou pelas passagens subterrâneas

MPDFT aponta crimes ocorridos nas passarelas como justificativa para ingressar com Ação Pública contra o GDF pedindo melhorias nas instalações

Afonso Ventania

08/03/2024 5h00

Diante da grande repercussão da Ação Civil Pública impetrada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) contra o Governo do Distrito Federal (GDF) pedindo melhorias nas passagens subterrâneas e a redução da velocidade máxima do Eixão de 80km/h para 60km/h, o Jornal de Brasília foi às ruas para saber se o brasiliense usa ou não as passarelas e os motivos.

Para Maria Lúcia Veloso, 65 anos, os Eixinhos e o Eixão “são intransponíveis para pessoas com deficiência”. Aposentada por causa da esclerose múltipla, ela precisa de uma cadeira de rodas elétrica para circular pela cidade. A moradora da Asa Sul também reclama do estado de conservação das calçadas. “As calçadas são péssimas e muito difícil de transpor. Sobretudo para idosos, cadeirantes e para pessoas com mobilidade reduzida. Gosto muito de passear pela cidade, mas, o que me limita, é a falta de acessibilidade. Calçadas quebradas e falta de rampas”, reclama.

Durante a reportagem, ela fez questão de mostrar a passagem subterrânea localizada na 115 Sul, a mais próxima da casa dela, e observa que a maioria dos usuários ali é constituída de trabalhadores de outras regiões administrativas. Ao chegar na entrada da passarela, ela mostra a rampa com um grau de inclinação extremamente elevado, o que impossibilita o tráfego de cadeiras de roda, elétricas ou não.

Atravessar uma passagem subterrânea como essa é algo impossível para cadeirantes”, aponta. De acordo com Maria Lúcia, apenas as estações do metrô localizadas nos Eixinhos possuem passarelas com rampas de acordo com as especificações mínimas para oferecer aos usuários. “Quando o elevador funciona”, destaca.

O padeiro José Roberto Silva, mora em Ceilândia e afirma viver em um dilema diário quando vai trabalhar no Plano Piloto. Ele critica a alta velocidade dos carros na pista, o que o faz preferir atravessar por baixo, pelas passagens subterrâneas que, segundo ele, são mal conservadas e frequentadas por usuários de drogas e marginais. “Durante o dia, eu uso as passarelas, mas, à noite, com medo de ser assaltado, sou obrigado a encarar os carros na pista. Não temos uma opção melhor e mais segura”, lamenta.

Pesquisa

Estudo divulgado em julho do ano passado sobre a travessia no Eixão, realizada pelo Instituto de Pesquisa e Estatística do Distrito Federal (IPEDF), mostra que Maria Lúcia tem razão sobre o perfil das pessoas que circulam pelas passarelas. De acordo com o levantamento, as passagens subterrâneas são utilizadas, em sua maioria, por trabalhadores de outras regiões que trabalham na Asa Sul e Norte. Outro ponto é que também não são acessíveis para pessoas com deficiência.

A pesquisa destacou ainda que, ao contrário do que se imaginava, 94% das 25 mil pessoas ouvidas atravessam o Eixão por baixo. Outro dado que surpreendeu os pesquisadores foi que mais da metade dos entrevistados (57%), são mulheres. Ou seja, o medo de sofrer atropelamento é maior do que um eventual assédio sexual ou outro tipo de violência.

A aposentada Maria Ester de Brito já foi assaltada anos atrás em uma das passagens subterrâneas, mas ainda prefere enfrentar o risco de perder seus bens do que morrer atropelada atravessando a pista. “Aqui é muito sujo e perigoso, mas ainda prefiro do que enfrentar os carros lá em cima. Poderiam colocar policiais para fazer ronda e garantir nossa segurança”, diz.

Ação Pública

Diante da incapacidade do poder público para resolver todas essas questões, o promotor Dênio Augusto Moura da Primeira Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb), decidiu ingressar com Ação Civil Pública cobrando ação por parte do GDF. Segundo ele, o medo das pessoas em utilizar as passagens se deve, principalmente, pelos crimes que costumam acontecer nesses locais, como roubos, furtos e estupros.

“Essa é uma questão que vem sendo debatida há décadas, onde muitas promessas de melhorias nesses locais já foram feitas. Mas, o certo é que, nesses locais, pessoas continuam morrendo ao tentar atravessar o Eixão, muitas vezes por medo de utilizar as passagens subterrâneas”, explica.

Entre os pedidos feitos pelo MPDFT, está a implementação de soluções que garantam mobilidade, segurança e acessibilidade a pedestres, ciclistas e pessoas com deficiência na travessia. Ainda foi solicitada a preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília, objeto de proteção nos níveis local, federal e internacional.

Outra solicitação feita pelo MPDFT é a redução da velocidade do trânsito do Eixão de 80km/h para 60 km/h. De acordo com o documento, a mudança poderia diminuir o número de atropelamentos aos pedestres, além de acidentes entre os veículos.

“A redução/readequação do limite de velocidade é uma medida fundamental de segurança no trânsito, eficaz não apenas para pedestres e ciclistas, mas também para os motoristas. Em caso de colisão entre motoristas ou com objeto fixo (poste ou árvore, por exemplo), o risco de ferimento grave ou morte também é reduzido drasticamente com o limite reduzido de velocidade”, ponderou Dênio.

Em resposta, o presidente do Departamento de Estradas de Rodagem do DF, Fauzi Nacfur Júnior, defendeu a velocidade atual do Eixão e justificou que o limite de 80km/h foi estipulada através de estudos técnicos. “O GDF já vinha realizando estudos sobre a velocidade do Eixão, onde foi detectado que a velocidade média dos motoristas já é de 60km/h. Então, se nós baixássemos a velocidade regulamentada, estaríamos diminuindo ainda mais a fluidez do trânsito. Por isso, nós decidimos manter a velocidade”.

 

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