Menu
Brasília

Travada: invasão coloca em risco a regularização do Porto Rico

Em 2010, os donos da região chamada Fazenda Santa Maria, assinaram TAC doando para o GDF o quinhão de 352 hectares

Ary Filgueira

15/10/2021 5h00

Atualizada 14/10/2021 19h15

Área invadida em Santa Maria Foto: Tereza Neuberger/ Jornal de Brasília Data: 14-10-2021

Depois de uma longa espera, moradores de áreas ainda classificadas como assentamento em Santa Maria viram uma luz no fim do túnel para ter realizado o sonho de regularização das suas casas. Em 2010, os donos da região chamada Fazenda Santa Maria, onde essas verdadeiras cidades foram erguidas, mas de forma desordenada, assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) doando para o Governo do Distrito Federal (GDF) o quinhão de 352 hectares e assim garantido a moradias dessas 16 mil famílias carentes.

Área total de propriedade particular é de 704 hectares. Os proprietários prometem doar 352 hectares, onde estão Porto Rico, Santa Maria Sul e Central. Lá vivem já 16 mil famílias. Mas uma invasão de 60 casas erguidas do dia para noite pode inviabilizar essa doação. Áreas doadas. Amarelo: 162 hectares. Azul: 90 hectares. Verde: 100 hectares. Total: 352 hectares.

Acontece que essas pessoas poderão não pegar suas escrituras definitivas. Pior: o fantasma do despejo e o som de tratores destruindo suas casas ameaçam rondá-las novamente. Tudo por causa de um novo assentamento que surgiu em 2016 na Área Central 403/404 daquela cidade, o que fere o TAC assinado entre os proprietários e o GDF em 2010. Uma das contrapartidas em troca da doação da área, na ocasião, era o compromisso do governo de não permitir novas invasões na região.

Mas o GDF encontra-se de mãos atadas. O DF Legal até que tem tentado impedir o surgimento de novas edificações irregulares. Porém, esbarra em decisões judiciais em favor dos invasores. A última movimentação do Tribunal de Justiça do DF (TJDFT) acerca do caso foi no dia 6 (quarta-feira). Num ato monocrático, o desembargador Alvaro Ciarlini determinou a suspensão das derrubadas por entender que não houve prévio aviso aos moradores. No mesmo despacho, o magistrado ressaltou que há pessoas que moram no local desde 2015 e que teriam ocorrido atos de violência praticados por policiais durante as desocupações.

Nesta semana, o processo subiu para o Supremo Tribunal Federal (STF). Dessa vez, foi a ministra Rosa Weber que ratificou a suspensão da retirada daquela invasão em Santa Maria. A liminar foi deferida a pedido da Defensoria Pública do Distrito Federal e levou em consideração decisão anterior da corte máxima que suspendeu as remoções de áreas ocupadas antes da pandemia.

Diante desse cenário de incerteza, os verdadeiros donos dos 704 hectares que englobam o Porto Rico, Santa Maria Sul e Central ameaçaram recuar da doação e revogar o TAC pelo não cumprimento dos tópicos do acordo firmado em 2010. O Porto Rico possui uma área de 90 hectares. A terra pertence a compradores que adquiriram a região total em 2016.

A venda desse quinhão de 704 hectares foi concretizada naquele ano. A gleba pertencia a família Pereira Braga. Em 1963, foi julgado o inventário das terras, divididas as frações em 300 herdeiros. Eles então resolveram se desfazer das suas propriedades, vendendo elas para pessoas físicas e empresas. Apenas uma família permaneceu com a herança. Os irmãos Wagner, Luzinete e Valdir Pereira Cardoso possuem juntos pouco mais de 700 metros quadrados de terra.

Mas com a mesma matrícula do imóvel registrado em cartório eles multiplicaram essa metragem para 40.000m². A denúncia foi feita na Delegacia do Meio Ambiente (Dema) da Polícia Civil do DF. Wagner e Valdir são suspeitos de venderem lotes na região para terceiros, prometendo a eles serem regularizados. Para isso, apresentam a matrícula dos únicos imóvel que de fato possuem. A reportagem procurou os dois, mas não conseguiu falar com nenhum.

A apreensão provocada pela nova invasão tem tomado conta dos moradores do Porto Rico. Dona Maria do Socorro, 50 anos, reside na Quadra K. Segunda Etapa. Conhecida como Aris Ribeirão. Ela investiu tudo o que tinha no lote. Pegou até dinheiro emprestado para pagar os R$ 5 mil que valia o terreno. Ela lembra, que de 2008 para cá, quando adquiriu sua tão sonhada casa própria, sempre pensou em um dia ver as ruas asfaltadas, ter água potável em casa e luz. Depois que o governo colocou as benfeitorias, só falta uma coisa para que seu sono seja mais duradouro e tranquilo: a escritura definitiva. “Não tenho para onde ir. Só tenho esse pedaço de terra aqui. Meu único bem. Comprei de boa-fé”, afirma a dona de casa, que mora com o marido e três filhos.

O medo de perder seu único patrimônio também atinge a presidente da Associação de Moradores do Condomínio Porto Rico (Aris Ribeirão), Joana D’Arc Tavares. Em entrevista, ao Jornal de Brasília, ela contou que a mesma apreensão de Socorre contagia outros moradores. Joana foi candidata a deputada distrital nas últimas eleições. Teve quase mil votos e hoje assume a principal liderança da comunidade do Porto Rico. Ela é moradora da região desde 2004.

Joana D’Arc Tavares de Souza Presidente da Associação de Moradores do Condomínio Porto Rico Foto: Tereza Neuberger/ Jornal de Brasília Data: 14-10-2021

“São 22 mil habilitastes que aguardam o cumprimento da promessa que o governo firmou com os empresários. É a única expectativa porque muitas benfeitorias só poderão chegar aqui mediante a regularização fundiária. Tem quadra aqui ameaçada por erosão. O Porto Rico tem área para abrigar as famílias, mas não o fazem por causa desse processo. Isso precisa se resolver rápido. Não dá para a gente conviver com essa incerteza”, desabafa Joana, em tom de cobrança.

A reportagem procurou o DF Legal. Este, por sua vez, informou que as decisões judiciais estão sendo tratadas pela Procuradoria-Geral do DF. Sobre a possível revogação da doação das áreas, o governo ainda não tinha se manifestado até o fechamento desta edição.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado