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Brasília

Planaltina: cidade de milhares de anos

Série de reportagens mostra descobertas recentes sobre a história da cidade mais antiga do DF

Redação Jornal de Brasília

21/02/2022 5h00

Atualizada 23/02/2022 20h17

Foto: Jornal de Brasília

Gabriel de Sousa
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Distante 38,5 Km do Plano Piloto, Planaltina é a cidade mais antiga do Distrito Federal, criada oficialmente em 1859. Apesar disso, a cidade não consta na lista dos 57 sítios arqueológicos já catalogados no DF. Mas essa realidade pode estar prestes a mudar. Afinal, objetos líticos cuja fabricação, supostamente, data de até 12 mil anos, foram encontradas na zona rural da cidade pelo professor de artes rede pública de ensino Adeilton Oliveira.

Foi enquanto pedalava pelas trilhas do Parque Ambiental Colégio Agrícola que o professor de artes se deparou com objetos que lhe chamaram à atenção. Ele imediatamente associou as pedras às imagens ds livros que usa para ensinar a arte no período neolítico e paleolítico para seus alunos adolescentes de Planaltina.

Ele passou a prestar mais atenção às pedras da trilha e, de agosto de 2021 até janeiro deste ano, foi colecionando os achados.

No início do ano, ele reuniu os artefatos e pediu ajuda de especialistas de fora do DF para investigar a origem dos objetos. Foi quando veio a grande surpresa: Adeilton poderia ter achado batedores indígenas que podem ter sido feitos há até 12 mil anos atrás.

O arqueólogo e professor André Moura, integrante do Cerrado Rupestre, consultoria do Distrito Federal que resgata materiais arqueológicos, afirma que as duas peças foram feitas por grupos antigos, mas que precisam de estudos mais aprofundados para atestar uma datação confiável. Os artefatos podem explicar ainda mais sobre a vida no DF pré-colonial. “A maioria dos sítios arqueológicos não são encontrados assim. Geralmente arqueólogos vão em busca de vestígios. Eu fico bem feliz quando alguém leigo consegue identificar”, afirma.

Segundo Moura, os achados arqueológicos no DF são importantes para derrubar o “mito fundador”, segundo o qual Brasília teria sido criada em um local supostamente nunca habitado, no meio de um vazio do imenso Cerrado. “Quando a gente fala de um sítio arqueológico dentro do Distrito Federal, perto do centro do poder, isso chama muito a atenção”, observa o arqueólogo.

Para o especialista, graças aos estudos arqueológicos, é possível ensinar que existiam outros habitantes no local que hoje conhecemos como o Distrito Federal.

Os especialistas de fora do DF, analisaram primariamente a primeira pedra encontrada em agosto, e informaram para Adeilton que o objeto pode ter a sua origem entre 6 mil a até 12 mil anos. Adeilton relata que achou o objeto em cima de um morro, perto de nascentes de água. “Ao mesmo tempo em que é um local bem alto onde dá para ver bem a região, também tem muita água. Então é uma região propícia para se habitar e se proteger”, arrisca.

Foto: Gabriel de Sousa

Para o especialista, graças aos estudos arqueológicos, é possível ensinar que existiam outros habitantes no local que hoje conhecemos como o Distrito Federal. A primeira pedra encontrada em agosto, pode ter a sua origem entre 6 mil a até 12 mil anos. Adeilton relata que achou o objeto em cima de um morro, perto de nascentes de água. “Ao mesmo tempo em que é um local bem alto onde dá para ver bem a região, também tem muita água. Então é uma região propícia para se habitar e se proteger”, arrisca.

Entre os objetos colhidos também há um bastão polido, que pode ter sido feito há até 4 mil anos. De acordo com Wesley Charles de Oliveira, mestre em arqueologia e diretor da Habilis Consultoria, empresa especializada em escavações arqueológicas, caso realmente seja confirmado que se trata de um objeto indígena, ele pode ter servido como uma mão de pilão por povos indígenas jês e tupis que habitavam a região antes da fundação do DF. “Parece um quartzito, e a utilização dele naquele período era mais para polimento”, explica.

Procurado pela reportagem do Jornal de Brasília, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), disse que os objetos são “provavelmente verídicos”, e utilizados nas oficinas de lascamento e fabricação de instrumentos. O órgão disse que irá entrar em contato com Adeilton para orientá-lo, e que após a verificação por um arqueólogo no local, poderá ser feita uma escavação para achar outros itens, e, possivelmente, ser registrado um novo sítio arqueológico no Distrito Federal.

Ele quer recontar a história

Com a possível descoberta de objetos feitos por planaltinenses de até 12 mil anos atrás, agora o maior desejo do professor de artes, Adeilton Oliveira, é recontar a história da sua cidade. Ele diz sempre ter questionado a falta de achados pré-coloniais na região administrativa, e se opõe à tradicional forma como é explicada a fundação e o surgimento dos primeiros moradores de Planaltina.

Segundo esses relatos, por volta de 1800, um mestre de armas se estabeleceu no local, que começou a crescer devido a uma epidemia de peste bubônica. “As pessoas que moravam aqui prometeram para São Sebastião que se a peste fosse embora eles doariam as suas terras para a igreja”, conta o professor.

Foto: Gabriel de Sousa

Planaltina então foi construída em volta do que hoje é a Praça São Sebastião, e logo se tornou um entreposto de escravos e do comércio de ouro que era encontrado em Goiás. “No início da cidade, 86% dos habitantes eram escravos e apenas 14% eram brancos. Tem um grupo aqui que fica brigando para contar a história das famílias tradicionais da cidade. Eu quero apresentar a história dos verdadeiros cerratenses, os primeiros planaltinenses, e não dos invasores”, indaga.

O professor e ciclista deseja doar as peças que encontrou para o Instituto de Geociências da Universidade de Brasília (UnB), e diz que é importante divulgar os achados para contar “a verdadeira história da cidade”, que pode ter sido iniciada há milhares de anos, em regiões rurais distantes do atual centro de Planaltina.

Graças a uma bicicleta e um acaso, a cidade mais antiga do DF, que é conhecida por ser bicentenária, existente desde a época do domínio português, pode ter mais séculos de idade acrescentados em sua certidão de nascimento.

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