João Paulo Mariano
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Quem precisa atravessar de um lado para o outro da Via Estrutural já está acostumado com a espera. Sem passarelas ou passagens subterrâneas, a travessia tem que ser feita com todo o cuidado possível, pois os carros passam em velocidade igual ou maior que 80 km/h. Tem gente que espera cinco minutos ou mais para não ser atropelado. O problema poderia ser evitado se as três passarelas prometidas na altura de Vicente Pires fossem finalizadas no prazo correto: a previsão de entrega era 23 de novembro. Decisão do Tribunal de Contas parou a construção.
Segundo a Secretaria de Mobilidade (Semob), as obras estão paralisadas há quase cinco semanas, sem prazo para retorno. Enquanto isso, a população espera no acostamento o momento de se arriscar e cruzar a pista. Às vezes, o jeito é juntar três ou quatro pessoas e pedir para que os policiais do Batalhão de Policiamento Rodoviário (BPRv) da PMDF, que fica na altura do km 8, parem o tráfego.
Quem não quer esperar os policiais auxiliarem no cruzamento acena por sua conta e risco e torce para que todos os carros parem. Há momentos em que dá certo, e outros não. A doméstica Luzinete Souza, 31 anos, dá um jeito de cruzar a via quando vê a primeira oportunidade. Quando perguntada se ela tem medo do risco que corre, ela é enfática: “Preciso atravessar todo dia para ir para casa. Não tem outro jeito. Se tivesse uma passarela seria ótimo, porque nem todos os motoristas respeitam quando a gente tenta atravessar”.
A mulher se diz sortuda por nunca ter passado por um acidente e percebe que a passarela seria muito importante, pois aumentaria a segurança. Ela reclama que faz tempo que não vê ninguém nas obras e denuncia o abandono.
E, realmente, em todo o tempo que a reportagem do Jornal de Brasília esteve neste trecho da Via Estrutural, não havia ninguém em serviço. Mesmo com uma placa dizendo que a obra da passarela no KM 8 deveria ficar pronta no dia 23 de novembro deste ano, o que se vê no local são apenas tapumes e a fundação da estrutura.
- Pedestres precisam se arriscar entre os carros em alta velocidade. Foto: Myke Sena
- Tapumes no canteiro de obras cercam o início da edificação. Foto: Myke Sena
Custos
De acordo com o planejamento da Semob, três passarelas deveriam estar prontas na Via Estrutural: uma a cerca de 500 m do BPRv; outra no Km 8, para justamente auxiliar nas travessias constantes próximas ao batalhão; e a última, a um quilômetro dali. Cada uma deve custar cerca de R$ 2,2 milhões, totalizando quase R$ 7 milhões.
As obras começaram em 26 de julho deste ano, após assinatura de contrato com a empresa Engemil, ganhou a licitação fazendo o preço mais barato. Os planos iniciais eram construir apenas duas passarelas na DF-095 e uma outra próximo à entrada do Parque Nacional de Brasília, na Epia. Porém, após estudos de utilização, foi percebido que a demanda na Estrutural era sete vezes maior que na entrada da Água Mineral. Essa última não teve nem a fundação iniciada já que eram necessários mais estudos.
Vaivém do projeto desde janeiro
Em julho deste ano, quando o JBr. mostrou o problema, a Semob alegou que havia a vontade de fazer a obra, mas o Tribunal de Contas do DF (TCDF) teria suspendido a licitação depois que a segunda colocada, a AJL Engenharia e Construção Ltda, entrou com recurso pedindo a nulidade do certame, mesmo tendo feito um preço de R$ 1 milhão mais caro que a primeira colocada. Isso em janeiro.
Só que, em abril, o Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) proferiu liminar derrubando a decisão do TCDF. Ou seja, a permissão para a construção foi concedida. Segundo o secretário-adjunto de Mobilidade, Dênis Soares, as obras começaram em julho, mas paralisadas devido a um novo pedido do TCDF, que precisava analisar o processo, em 16 de novembro.
Contudo, o TCDF alegou em nenhum momento houve autorização para a construção e que o processo está sobrestado (teve seu andamento paralisado) desde 5 de setembro deste ano. A última movimentação nessa ação, dentro da Corte de contas, foi na decisão 5587/ 2017, onde os conselheiros decidiram pela “imediata cessação de qualquer ato” referente a essa obra. Isso ocorreu depois que a empresa AJL apontou descumprimento da paralisação.
A assessoria de imprensa da Semob alegou que a pasta começou a obra levando em consideração a decisão tomada pela desembargadora Carmelita Brasil, do TJDFT, em abril, que derrubou a liminar do TCDF. O órgão foi notificado em julho, mês em que iniciou a atuação na Estrutural. Assim, não teria ocorrido nenhuma legalidade, já que a nova proibição do TCDF veio somente em novembro.
Único meio
“Hoje, não podemos continuar a obra. Estamos dentro do prazo recursal e estamos preparando a peça para pedir a liberação”, afirma o secretário-adjunto. Ele estima que, após o retorno da construção, o término levará 120 dias. “A principal ação que a secretaria está se empenhando para a região é a passarela. Conseguimos obter recursos do BID [Banco Interamericano Desenvolvimento], licitar a obra e esperamos resolver o problema”, frisa.
Enquanto isso, o pedreiro Cidney Alves, 42, vai continuar enfrentando perigo para atravessar a rodovia. “É uma vergonha passar por isso todo dia”, reclama.
Ponto de vista
“A população perde em dois sentidos: com o gasto que não foi revertido em auxílio para a população, e com a falta de segurança na travessia, pois se existe a necessidade da construção é porque existe o risco”, alega o especialista em trânsito Márcio de Andrade. Para ele, a frota de carros aumenta a cada dia e a pista é de grande velocidade, assim não tem como fazer travessia ou construir outro instrumento que não sejam as passarelas.

