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Brasília

Número de mães solo cresce no DF

Levantamento realizado pelo IBGE constatou que, somente no DF, existiam 197.952 famílias formadas somente por mulheres e seus filhos

Mayra Dias

10/05/2022 17h25

Mayra Dias
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“O que eu tenho hoje é o amor mais puro e verdadeiro, é o amor de mãe e filha”, afirma Daniele Oliveira. Aos 41 anos, ela é uma das brasilienses que criam seus filhos sozinhas. Até 2017, um levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), constatou que, somente no DF, existiam 197.952 famílias formadas somente por mulheres e seus filhos, o que representa 19,2% de todos os tipos possíveis de arranjos familiares.

Como conta a secretária, que é mãe de duas meninas, a decisão veio após se ver em um relacionamento infeliz e sem estrutura. “Eu havia passado a gravidez toda sozinha, então não precisava me submeter a estar em um lugar que não me fazia bem”, compartilha a moradora de Sobradinho DF. Assim como Daniele, essa é a realidade de muitas outras mulheres na capital. Uma outra pesquisa, desta vez realizada pelos Carto?rios de Registro Civil do Distrito Federal, apontou que, nos quatro primeiros meses deste ano, foram registradas 924 crianc?as somente com o nome materno, o maior nu?mero percentual para o mesmo peri?odo desde 2018.

O levantamento está disponível no novo mo?dulo do Portal da Transpare?ncia do Registro Civil, denominado Pais Ausentes, lanc?ado no me?s de marc?o, e que integra a plataforma nacional, administrada pela Arpen. Ele reu?ne as informac?o?es referentes aos nascimentos, casamentos e o?bitos registrados nos 7.654 Carto?rios de Registro Civil do Brasil, presentes em todos os munici?pios e distritos do pai?s.

Tais dados inéditos recebem ainda mais atenção quando se observa que, esse ano, foi registrado o menor nu?mero de nascimentos para o peri?odo, totalizando 15.526 rece?m-nascidos. Diante disso, constata-se que 5.95% do total de rece?m-nascidos no DF tem apenas o nome da ma?e em sua certida?o de nascimento.

Quando comparado com o mesmo peri?odo de 2018, onde nasceram 17.980 crianc?as e 1.022 delas foram registradas somente com o nome da mãe, o nu?mero de ma?es solos diminui 98 registros,porém houve aumento proporcional de 0,24% no nu?mero de ma?es solo. “O crescimento do nu?mero de ma?es solo mostra a necessidade de um trabalho de conscientizac?a?o dos pais, que sa?o igualmente responsa?veis pela criac?a?o de seus filhos, tanto no que se refere ao amor, como tambe?m a?s responsabilidades”, aponta Gustavo Renato Fiscarelli, presidente da Associac?a?o Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil).

Conforme pondera o presidente, com a divulgação desses dados é possível analisar de forma mais ampla e concreta o total de crianças registradas apenas com o nome da mãe “e, posteriomente, embasar a criação de medidas e políticas públicas que atendam as demandas e solucionem os problemas desse público”, declara o titular.

Reconhecimento de paternidade

Assim como Daniele, quem também enfrentará, nos próximos meses, a jornada de chefiar uma casa sozinha é Priscila Ferreira, de 29 anos. A moradora do Noroeste conta que engravidar não estava nos seus planos, mas um encontro ‘casual’, como ela descreve, mudou o seu futuro. “Foi com uma pessoa com quem já me relacionei. Por razões de saúde, não posso tomar anticoncepcional. Tomei a pílula do dia seguinte, mas não funcionou”, diz a empresária. Apreensiva com a vida de mãe, Priscila conta que, no momento, o que mais a incomoda são questões relacionadas à paternidade da criança. “Aparentemente, para os homens, só virá filho depois que nasce. Somos nós, mulheres, que passamos pelos altos e baixos da gestação”, acrescentou.

Entenda

Desde 2012, com a publicac?a?o do Provimento no. 16, do Conselho Nacional de Justic?a (CNJ), o procedimento de reconhecimento de paternidade pode ser feito diretamente em qualquer Carto?rio de Registro Civil do pai?s. Aqui, não se faz necessa?ria a decisa?o judicial nos casos em que todas as partes concordam com a resoluc?a?o.

Nos casos em que seja do pro?prio pai, basta que ele comparec?a ao carto?rio com a co?pia da certida?o de nascimento do filho, sendo necessa?ria a anue?ncia da ma?e ou do pro?prio filho, caso ele seja maior de idade. Quando o filho é menor, e? preciso a anue?ncia da ma?e, e caso o pai na?o queira reconhecer o filho, a ma?e pode fazer a indicac?a?o do suposto pai no pro?prio Carto?rio, que comunicara? aos o?rga?os competentes para que seja iniciado o processo de investigac?a?o de paternidade.

Além disso, tambe?m e? possi?vel, desde o ano de 2017, realizar em Carto?rio o reconhecimento de paternidade socioafetiva, ou seja, aquele onde os pais criam uma crianc?a mediante uma relac?a?o de afeto, sem nenhum vi?nculo biolo?gico, desde que haja a concorda?ncia da ma?e e do pai biolo?gico.

Nestes casos, é de responsabilidade do registrador civil atestar a existe?ncia do vi?nculo afetivo da paternidade ou maternidade, e isso se dará mediante apurac?a?o objetiva por intermédio da verificac?a?o de elementos concretos. São eles, inscric?a?o do pretenso filho em plano de sau?de ou em o?rga?o de previde?ncia, registro oficial de que residem na mesma unidade domiciliar, vi?nculo de conjugalidade (casamento ou unia?o esta?vel) com o ascendente biolo?gico.

Todo apoio é bem vindo

Por mais que esse cenário seja cada vez mais comum, vale destacar que criar um filho sozinha não é algo fácil e, nestes casos, todo apoio e amparo é necessário. Como esclarece Thamiris Dias, psicóloga clínica e especialista em saúde da mulher, a maternidade pode ser um acontecimento traumático na vida da mulher.

“Traumático no sentido de ruptura, de quebra, de uma vida que jamais será a mesma, exigindo da mulher grande adaptação e até mesmo um processo de luto dessa vida que não existirá mais”, afirma a especialista.

De acordo com a profissional, nesse sentido, ser mãe solo torna esses processos ainda mais intensos, já que não se tem com quem dividir as dificuldades, momentos e o cuidado com a criança.

Por essa razão, Thamiris destaca a importância de uma rede de apoio. “O que muitas mães solo sentem, principalmente as que não possuem uma rede de apoio e suporte, é a solidão. Essa solidão pode trazer prejuízos significativos na vida dessa mulher, como dificuldade de retomar ao trabalho, a vida social, ouvir julgamentos externos sobre sua conduta como mãe etc, o que pode ocasionar em sofrimento psíquico para essas mulheres”, acrescenta a psicóloga.

Amparo, felizmente, é o que não falta para Priscila. Mesmo com medo do que estar por vir, e tendo sido pega de surpresa pela gestação, a autônoma diz ter recebido muito apoio da família e amigos. “Acho que se não fossem eles eu não sei o que seria de mim, pois foram uns três meses de muito choro pra aceitar a gravidez”, conta. “Não era um sonho, hoje, ser mãe. Eu estava totalmente focada na minha carreira”, acrescentou. Mesmo fora dos planos, contudo, Priscila Ferreira diz estar focada, e mentalizando que será uma fase nova mas gostosa em sua vida. “Acredito muito nisso”, finaliza.

Conforme destaca Thamiris, um dos problemas mais recorrentes enfrentados por essas mulheres é o julgamento e, sobre isso, Daniele Oliveira entende bem. “Querendo ou não, a sociedade olha diferente para quem é mãe solteira”, diz. Conforme salienta a psicóloga, o necessário é quebrar o estereótipo de mãe solteira, e entender que, independente do caso, o que importa é o amor. “É importante saber que a mãe perfeita não existe, que cada mãe é a mãe que é possível de ser, a mãe suficiente para o seu filho”, pontua a profissional. “E para todos aqueles que não são mães, que fique o ensinamento de que todos nós somos enquanto sociedade, responsáveis pelas nossas crianças, assim não julguemos as mães, mas a apoiemos sendo rede de apoio sempre que possível”, argumenta.

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