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Brasília

No Plano Piloto, carros estacionam debaixo dos pilotis

Mesmo que alguns possuam liberação para a prática, a atividade é contra projeto urbanístico original de Brasília

Redação Jornal de Brasília

26/08/2022 10h50

Foto: Divulgação

Mesmo sendo irregular, motoristas em algumas quadras do Plano Piloto têm estacionado entre as áreas públicas dos pilotis na Asa Sul. A prática acontece há anos e vai contra o determinado no plano diretor da cidade de Brasília, que estabelece que a área com as colunas embaixo dos prédios deverá ser de uso exclusivo de pedestres.

A questão é regulamentada pela Portaria nº 116 do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), no artigo 32, inciso I, alínea f). O trecho estabelece que os Setores de Habitações Coletivas Norte e Sul devem ter “blocos residenciais multifamiliares implantados em projeções, com pilotis livres e de uso público, garantindo a franca circulação de pedestres e usuários”.

Também reforçando a questão, a alínea i) determina que a circulação de pedestres no térreo dos blocos é livre e “garantida pela ausência de barreiras de qualquer natureza, inclusive cercas-vivas, nos pilotis e espaços públicos”. De acordo com o Iphan, os órgãos responsáveis pela fiscalização das áreas quanto ao estacionamento são os de trânsito.

Ao Jornal de Brasília, a Secretaria DF Legal informou que em alguns projetos originais, certos prédios tinham a autorização para usar os pilotis como estacionamento dos prédios. Não foram especificados quais, entretanto. Aqueles sem a permissão, de acordo com a pasta foram notificados, mas os casos foram judicializados. “Portanto, a DF Legal não pode se manifestar sobre o assunto, neste momento”, afirmou em nota.

“Já a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação esclarece que norma de edificação, uso e gabarito vigente para os blocos residenciais, bem como a Lei nº 2.046, de 04 de agosto de 1998, que define o aproveitamento dos pilotis dos prédios residenciais edificados, não preveem a utilização do pavimento pilotis com vagas de estacionamento”, continuou a nota.

Na mesma nota conjunta, a Administração Regional do Plano Piloto informou que ainda tem articulado parcerias para o desenvolvimento de estratégias de gestão da mobilidade nas áreas da Região Administrativa. “A Regional reforça que a política de mobilidade desaconselha a ampliação de áreas de estacionamento”, disse.

O Departamento de Trânsito (Detran-DF) destacou que tem feito operações para coibir o estacionamento irregular de forma diária, autuando de acordo com o artigo 181 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). A legislação descreve a infração como gravíssima, com multa e/ou remoção do veículo.

Uma das quadras em que a reportagem encontrou a situação foi a 104 Sul, nos blocos B e E, com os pilotis sendo utilizados como estacionamento de carros e motos. A situação se estende há anos, de acordo com o apurado pela reportagem. Situação similar acontece nas quadras 110, 111 e 113, também da Asa Sul.

Falta Código de Posturas, diz pesquisador

Para o professor e pesquisador de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), Frederico Flósculo, esse tipo de comportamento dos moradores das quadras acontece por “pura imitação entre moradores”. Quando um começa a fazer e não é punido, outros também começarão a fazer, segundo ele.

“É uma coisa errada, porque de modo algum os pilotis foram construídos para carros. Eles pertencem aos pedestres da comunidade toda. É uma obrigação das quadras deixá-los livres para as passagens de todo mundo à vontade. Esse é o projeto para Brasília”, destacou. “Mas tem gente que é mal educada de nascença e não aprende a usar direito o que uma cidade nova apresenta.”

Conforme explicou, o uso do bem público como particular acontece também devido à falta de um documento de normas denominado Código de Posturas, presente em capitais e municípios brasileiros em estados como Goiás, São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, entre outros.

A escritura tem o poder de regularizar questões urbanísticas nas cidades, com normas e políticas administrativas, incluindo punições àqueles que o descumprirem, além de tratar da conduta das pessoas nos espaços públicos. “Esse é um item vazio na legislação de Brasília, que é a única capital sem o Código de Posturas. “Essas irregularidades no comportamento das pessoas quanto ao uso do espaço público deveria ser cobrado num código de posturas”, destacou.

“Essas coisas [uso errado do espaço público] são como aqueles filhos mal educados que agem de qualquer maneira e nenhum pai – governadores e administradores – faz algo para mudar. Dizem que sempre foi assim e fica por isso mesmo”, criticou o professor da UnB.

Segundo ele, o tema também poderia ser resolvido de maneira simples, até mesmo com pessoas que exercem a função de estabelecer a ordem social, desde policiais até órgãos fiscalizadores. “Mas o que é errado prevalece. O que há é muita desculpa. É uma frustração imensa ver o meu país sendo desautorizado por gente mal educada. Não queremos naturalizar o mau comportamento, a maldade e o prejuízo público. É inaceitável”, finalizou.

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