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Brasília

Hora de ajudar quem tanto ajuda

Casa de apoio Restaurando Vidas precisa de doações para reabrir e poder atuar regularmente como comunidade terapêutica

Redação Jornal de Brasília

03/10/2021 19h12

Atualizada 06/10/2021 15h24

Instituto Restaurando Vidas

Foto: Amanda Karolyne/Jornal de Brasília

Amanda Karolyne
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Para continuarem em atuação, muitas casas de recuperação foram fechadas temporariamente para cumprirem exigências da Vigilância Sanitária e dos bombeiros. Foi o caso do Instituto Restaurando Vidas, que está há sete meses sem funcionamento. A instituição precisa arrecadar em torno de R$ 15.446,77 para fazer os reparos necessários e ser regularizada como comunidade terapêutica.

Considerada como serviço essencial pelo Governo Federal no início da pandemia, as atividades das comunidades terapêuticas não foram interrompidas. Mas isso não impediu que várias casas de apoio fossem fechadas no entorno do Distrito Federal. Por meio de nota, a Secretaria de Justiça do Distrito Federal informou que nenhuma unidade de acolhimento, casa de passagem e república, sob responsabilidade da Secretaria de Desenvolvimento Social, foi fechada, e que pelo menos sete novas estruturas voltadas ao acolhimento institucional abriram desde 2020.

No entanto, a casa da IRV, localizada em uma chácara em Valparaíso de Goiás-GO, foi fechada no dia 24 de maio de 2021. De acordo com o presidente, pastor Sérgio Maciel, 48, o local estava funcionando em 2020 sem ocorrência de covid-19 porque todos ficaram de quarentena quando tudo começou. Ele explica que, antes da pandemia, pagava R$ 6 mil de aluguel, mas com a situação apertada, pediu para o dono do lote baixar o valor pela metade.

O idealizador do projeto fez 14 cursos na área de dependência química para poder tocar o trabalho de acolher pessoas viciadas. São necessárias 300 horas de curso em drogadição para a Vigilância Sanitária autorizar um empreendimento desses. Ele também estava se formando em Serviço Social, mas com a pandemia precisou trancar a matrícula.

O plano de Sérgio é começar a vender queijo minas para tentar arcar com os custos, comprar sensor de incêndio e detector de fumaça para poder reabrir o espaço. “Choro todo dia ao ver essa casa fechada, tanta gente na rua precisando de um local, uma ajuda, a gente com estrutura para receber, falta tão pouco, e não podemos.”

Alguns internos quiseram ajudar a arrecadar o necessário para atender as exigências. Um deles é Flávio Roberto Ricarte de Magalhães, 38, interno desde a primeira chácara, que acompanha o pastor Sergio nessa situação. Com o benefício do seguro desemprego, ele ajudou com R$ 700 reais. E, como se não bastasse terem de arrecadar os custos altos para os reparos exigidos, não faz menos de dois meses que foram roubados, ficando ainda mais prejudicados.

De volta para as ruas

Depois que a casa teve de fechar as portas, Sérgio destaca que muitos dos 20 internos que moravam no Instituto voltaram para a rua. “A pessoa já está lutando com toda forçam aí vem isso e desestabiliza”, comenta o responsável pelo instituto. Ele explica que quem é acolhido se acostuma com aquele lugar como um lar, confia nas pessoas ali e não aceitam serem realocadas em outra casa.

Quando o instituto está em seu funcionamento pleno, os internos contam com serviços de exemplo e testemunhos, seis reuniões por semana, narcóticos anônimos e partilha de sentimentos. “Mas compartilhar sentimento é algo difícil, a pessoa vai se abrindo aos poucos”, conta Sérgio. Eles também praticam atividades laborais, fazem cursos, têm musicoterapia e recebem atendimento psicológico e psiquiátrico. De três em três meses eles realizam uma gincana. Mas enquanto o local está fechado, nada disso acontece e os gastos continuam altos.

Quando voltar a funcionar, a instituição vai oferecer 40 vagas na casa para homens de 18 a 59 anos — 50% da capacidade. O espaço tem dez banheiros, uma piscina, árvores e espaço para plantio, refeitório, sala de convivência, oito dormitórios, uma biblioteca, academia, escritório, sala de jogos, quadra de esportes e um salão para os eventos, além de espaço ao ar livre.

Mais de 17 anos longe das drogas

Sérgio é um exemplo do impacto positivo dessas instituições — ele está há 17 anos sem usar drogas. O pastor lembra bem da última vez que usou, dia 19 de maio de 2005. “As vezes sinto uma vontade muito louca de usar droga mas consigo controlar a fissura, suporto na carne o desejo”, afirma. “Antigamente eu acreditava que era só um vício, mas hoje foi comprovado, e eu acredito que é uma doença, com abstinência pro resto da vida, vontade compulsiva”, complementa.

Ele conta que quando recebeu alta da internação, foi para a igreja e nunca mais saiu. Começou a trabalhar e levar as pessoas para casas de internação. Logo fundou a instituição que gerencia, regularizada há 11 anos — sem documento são 16 anos de funcionamento. O instituto já funcionou em outros lugares, como uma chácara cedida onde ficou instalado por três anos; depois no Lago Azul, por mais seis anos; e agora, há 3 anos, em Pacaembu, Valparaíso, um local afastado da cidade, que segundo Sérgio, é bom para transmitir paz e tranquilidade a quem procura a reabilitação.

Com orgulho, Sérgio conta que nesses três anos de endereço novo o índice de recuperação foi de 70%. Ele explica que o método de atuação da casa mudou com o tempo. “Antigamente quem entrava, a gente cortava tudo, hoje em dia é aos poucos, como os 12 passos falam”. Para ele, quem trabalha em comunidade terapêutica hoje precisa ter carinho e gostar do que faz.

Vício em café, álcool, droga e tecnologia

O presidente do Instituto Restaurando Vidas hoje é casado e tem duas filhas com a esposa e também é pai orgulhoso de mais 7 filhos de outros dois casamentos. Sérgio pretende escrever um livro, e até já começou. Vai contar sobre sua história conturbada de ex-traficante, que nunca se imaginou vivendo em sociedade.

Vestido com uma blusa confeccionada pelo Instituto com a frase “Crack: é possível vencê-lo”, Sérgio conta que a vontade de usar droga vem em três minutos. “Se conseguir passar pelos três, consegue vencer a fissura diariamente”, acredita.

Foto: Amanda Karolyne/Jornal de Brasília

A casa é voltada para atender viciados em drogas e bebida alcoólica, mas ele destaca que já teve interno com vício em café, e até por conta de vício em tecnologia. Sérgio informa que os vícios são como uma compulsão, e que na maioria das vezes, as pessoas trocam um vício por outro.

De acordo com a presidente da Federação Centro-Oeste de Comunidades Terapêuticas, Célia Regina de Moraes, a comunidade terapêutica é regida pela Resolução da Diretoria Colegiada RDC 29 e pela resolução do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas 01 2015. A RDC pede o licenciamento do GDF, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária com os próprios pré-requisitos, ambiente adequado, número de leitos compatíveis, cozinha industrial e espaço de convivência. “E quando a vigilância visita uma comunidade terapêutica para dar o alvará, ela não amolece, tem que estar rigorosamente dentro da lei”, destaca.

Mas ela destaca que as comunidades terapêuticas são residenciais de prevenção e saúde e não clínicas, hospitais ou farmácias. Por isso, a Federação Centro-Oeste de Comunidades Terapêuticas está com um ofício para questionar o posicionamento da vigilância sanitária que atua em Goiás, exigindo coisas de clínicas para as CTs, como no caso do Instituto Restaurando Vidas.

Serviço:

Sérgio Maciel: 61 9 96317575

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