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Brasília

Embate entre policiais legislativos e vândalos no Congresso Nacional dentro da Casa durou mais de três horas

A urgência dos oficiais dentro do Congresso Nacional era proteger, de todas as formas, um dos maiores símbolos da democracia no país

João Victor Rodrigues

19/01/2023 6h31

Foto: Banco de imagens

“Prioridade ao Plenário, prioridade ao Plenário!”. Assim comunicava incisivamente pelo rádio o coordenador de policiamento da Polícia Legislativa da Câmara dos Deputados, policial Paz. Durante mais de 3h de combate aos ataques feitos no dia 8 de janeiro, domingo, essa era a urgência dos oficiais dentro do Congresso Nacional: proteger, de todas as formas, um dos maiores símbolos da democracia no país.

Durante a manhã e o início da tarde daquele domingo, a manifestação que descia a Esplanada dos Ministérios era pacífica e ordeira, sem indícios de que haveria violência e invasões aos Três Poderes da capital. A situação começou a mudar por volta das 15h, quando um cordão de policiamento foi rompido na via N1, já próximo ao gramado do Congresso Nacional. Cerca de 40 segundos depois, os primeiros vândalos já estavam na rampa da sede do poder legislativo, prontos para invadir.

“Eles não estavam concentrados no gramado. Quando chegaram, já foram direto para o primeiro confronto. Foi muito rápido”, contou Paz ao Jornal de Brasília. Assim que o primeiro cordão da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) foi rompido e o grupo começou a descer, a equipe legislativa que estava montada na base da rampa do Congresso Nacional começou a lançar bombas de gás lacrimogêneo, a fim de conter o avanço dos que corriam em direção a eles. Sem sucesso, os primeiros ataques começaram a ser feitos.

A linha de combate foi então movida para o lado esquerdo do Congresso, próximo à N1, por onde os invasores avançaram. A intenção era que a entrada pelo Salão Branco (Chapelaria) fosse evitada. Para lá se deslocaram policiais e viaturas, mas diante da quantidade de pessoas correndo, o recuo foi inevitável. Aqueles agentes que estavam próximos do grupo e dentro dos carros da polícia legislativa viraram alvo do grupo.

Com a ação violenta, 11 policiais ficaram feridos. Oito tiveram escoriações, mas outros três foram enviados para hospitais, uma vez que os ferimentos demandaram atendimento especializado. Contra eles foram desferidos chutes e pontapés, socos e ataques com paus. Tentando se desvencilhar do grupo, o efetivo ferido conseguiu chegar à linha montada dentro do Congresso Nacional para se protegerem dos agressores.

Já dentro da casa legislativa, os invasores começaram a ameaçar os policiais e a destruir o local, quebrando janelas, móveis, itens históricos e o que encontrassem pela frente. “A nossa dificuldade, da polícia legislativa e da PMDF, era de que aquele não era um grupo comum. Eles vieram preparados com técnicas e táticas de confronto. Sabiam como entrar, estavam com máscaras de gás, porretes, detectamos alguns facões, e não sabemos se estavam armados [com armas de fogo]. Foi uma situação bem tensa”, disse Paz.

Paz então solicitou o apoio dos demais agentes de serviço que estavam de plantão na Câmara. Ele desceu correndo em direção ao Plenário, porém, neste momento, muitos manifestantes já estavam descendo quase que ao lado da equipe, mas não os agrediram. “Quando estou indo para o plenário, eu peço, via rádio, prioridade para ele, que é nossa área principal da Casa. É algo simbólico para a democracia e ali é o nosso ponto principal de defesa. Poderíamos perder todas as áreas, mas era nossa missão manter o plenário intacto.”

No primeiro momento, foi possível conter os invasores por meio do diálogo dentro do primeiro salão. “A partir daqui vocês não passam”, diziam os policiais, referindo-se à entrada do Plenário. “Estamos com equipamentos e não permitiremos que passem”, diziam. A quantidade de pessoas chegando por outros acessos da Casa, como Salão Nobre, Salão Negro, Salão Verde, porém, aumentou rapidamente e o tom de ameaça e agressão do grupo ficou mais intenso.

O efetivo inicial de 30 policiais dentro do local foi crescendo conforme o reforço chegava, até que eram 100 agentes legislativos contendo os vândalos. “Tinha momentos que não conseguíamos ver um metro à frente, porque tinha muita fumaça de gás lacrimogêneo e de granadas de efeito moral”, relatou.

Então, os invasores começaram a ameaçar que iriam invadir o Plenário. “A gente vai entrar aí, a gente vai destruir e vai colocar fogo em tudo”, relembrou Paz das palavras dos agressores. “É melhor vocês correrem, porque se estiverem aí, vão morrer junto”, diziam eles.

“Mas conseguimos investir contra justamente pelo nosso treinamento. Se não fossem os policiais treinados ali, altamente capacitados, não teríamos conseguido conter eles [fora do Plenário]. Estávamos muito bem treinados porque fazemos simulações desse tipo de situação com nossos policiais, mas ali era real. Tivemos dificuldade justamente pelo fato do grupo ter técnicas e táticas de combate. Por isso demorou quase 3h, porque não conseguimos repelir tão facilmente”, continuou.

A preparação e força dos invasores foi tamanha, que fizeram uma espécie de rapel entre a área mais elevada e a mais baixa do Plenário. Conforme o relato, eles arrancaram gradis de ferro que estavam fixos ao chão – “extremamente pesados”, segundo Paz – e, após descerem pelas cordas, os unificaram com bandeiras e camisetas e montaram uma escada improvisada, para que mais pessoas conseguissem subir e descer.

“Plenário é sagrado”

Como impedir a entrada ao Plenário era a prioridade dos policiais, o efetivo, juntamente com o apoio da tropa de Choque da PMDF, que reforçou o combate aos vândalos, montou três principais linhas de proteção nos possíveis pontos de acesso ao objetivo dos ataques: portas centrais, laterais e galerias. Nesses ambientes, com muito esforço, os agentes forçaram a saída dos invasores, quase três horas depois do primeiro avanço.

“Nossa linha foi ficando cada vez mais consistente, com mais policiais chegando de outros lugares, e fomos nos concentrando na entrada do plenário, que era nossa prioridade: manter o processo legislativo intacto dentro da democracia. Nós policiais temos o Plenário como algo realmente sagrado. Ali era questão de honra, de que eles não iriam ganhar o Plenário. Não vão”, decretou.

Apesar dos esforços, alguns conseguiram adentrar, mas logo foram retirados. Eles entraram por outro acesso, mais difícil de ser acessado, via cúpula, pelo alçapão. De acordo com o coordenador de policiamento, havia um portão de ferro que foi rompido. A expulsão dos vândalos foi feita e eles se dirigiram para o Senado e de volta para a cúpula. A entrada foi bloqueada novamente. Tentaram voltar atirando pedras, paus e grades, mas não conseguiram mais acessar o local.

“Tivemos princípios de incêndio em algumas salas – na sala da liderança do PT e do PSDB, que foram locais que foram bastante destruídos e que tentaram atear fogo. Com a nossa Central de Monitoramento, somadas às brigadas, conseguimos, de uma forma muito eficiente, detectar onde estavam tendo esses focos de incêndio, que era nosso temor maior. Caso pegasse fogo mesmo, seria uma tragédia. E conseguimos conter essa situação”, acrescentou Paz.

Os gases de gás lacrimogêneo e granadas que foram utilizados até afastavam momentaneamente os agressores, mas eles utilizaram mangueiras contra incêndio para lavar o rosto e aliviar os efeitos do gás. Assim, tinham mais força para avançar e tentavam novamente a invasão. Com o apoio do Choque da PMDF, começaram, enfim, a varrer e começar a tirar o grupo do Salão Verde. “Fomos jogando eles para a área do Salão Negro e depois para a área externa”, disse Paz.

“Houve uma demora para tirar eles da rampa da varanda do Congresso Nacional por uma situação técnica, porque o Choque precisava tirar primeiro as pessoas do Palácio do Planalto e do STF [Superior Tribunal Federal]. Quando não restasse mais ninguém na Praça dos Três Poderes, começaríamos a dispersar o pessoal a partir da linha do Congresso Tivemos apoio de uma forma muito eficiente da PMDF, principalmente com o químico”, ressaltou o coordenador.

Vitória

Após o sucesso na retirada dos invasores é que a gravidade da situação recaiu sobre a consciência dos policiais. O confronto vivenciado foi inédito para todos os agentes. A missão para proteger o Parlamento, porém, foi bem sucedida.

“Para nós parece que foram segundos, muito rápido, mas foram mais de três horas […]. Tenho 13 anos de Câmara e 13 anos de PMDF. Em todos eles, nunca vivenciei algo parecido. Nunca tínhamos presenciado [agressões] nas proporções que foram. […] Tenho certeza que eu e meus companheiros cumprimos a missão de forma muito guerreira. Protegemos o símbolo maior da democracia, que é o Parlamento. […] É o que sempre dizemos: todo policial tem que estar preparado para o pior, mesmo que não aconteça”, finalizou o coordenador.

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