Maria Paula Meira e Maria Tereza Castro
Jornal de Brasília/Agência UniCeub
“(…) Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície inata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço (…)”
O trecho destacado acima é da obra “Procura da poesia”, de Carlos Drummond de Andrade. O poeta teve, desde 2015, sua data de nascimento homenageada pelo decreto que torna 31 de outubro o Dia Nacional da Poesia.
Poesia que encanta jovens como Serena Franco, de 20 anos, e Ylla Baudelaire, de 21. Serena relata que desde criança adora livros, familiarizada com diversos estilos. Na poesia, o que a encanta é a precisão em falar sobre as coisas ao redor, quem escreve deve conhecer muito bem para expressar.
“Para mim, a poesia também é a busca pela beleza, mas não pelo padrão estético, ela está em todos os lugares e isso é muito bonito”, afirma.
No período de pandemia, ela conta que ler poesia foi o que a manteve sã, com essa imersão pôde descobrir coisas que a encantam na arte, que muitas vezes não reparamos. Nesse contexto, ela descobriu um novo nicho que tem estudado: a poesia hispanohablante. “É muito diferente, eles têm um fulgor, uma intensidade, que traz um ritmo muito bonito”, conclui.
A poetisa diz que escreve há quatro anos e , durante esse tempo, sua escrita mudou tanto quanto seus gostos, mas afirma que ainda não está sedimentada. “Eu tenho um livro publicado e detesto ele, porque era uma época muito visceral, só ficava sofrendo, isso é diferente do que eu gosto hoje em dia”. Serena declara que, antigamente, a poesia triste era o que a encantava, porém, agora parece somente um derramamento de emoções. Segundo ela, a beleza pode também estar nas palavras contidas, colocadas no lugar certo.
A jovem cita o poeta Caio Fernando Abreu ao falar sobre a transformação promovida pela arte:“Escrever é enfiar um dedo na garganta. Depois, claro, você peneira essa gosma, amolda-a, transforma. Pode sair até uma flor”. Ela diz acreditar que, ao trabalhar essa “coisa horrorosa” que está dentro de você, ela pode se tornar algo bonito como uma flor, como a poesia.
A estudante de letras, Ylla Baudelaire, conta que começou a escrever no bloco de notas do seu celular, quando tinha insônia. Dessa forma, passou a externar tudo o que sentia. Aos poucos, mostrando para amigos, ela foi motivada a divulgar e percebeu que existem pessoas que também se interessam por poesia hoje em dia.
Um dos temas principais de seus textos é a saudade. Afirma que seu objetivo é que as pessoas possam se identificar com a sua poesia e evitar que se sintam sozinhas. “Espero que elas possam se encontrar e pensar: ‘caramba’, isso também me pertence, é isso que eu sinto”, ressalta.
Acrescenta que, para ela, a poesia representa um “sentir palpável”. Assim, ela transforma suas obras em algo material, com a venda independente de ecobags e adesivos. Ylla também possui um canal no YouTube, em que posta vídeos poéticos. Confira uma produção dela:
Ambas as poetisas enfatizam a falta de reconhecimento das obras de artistas independentes. Serena considera que as pessoas não estão familiarizadas com a poesia e tem visões restritas a autores como Vinícius de Moraes e Fernando Pessoa. Enquanto Ylla acrescenta que conhece muitos escritores talentosos, mas que não ganham alcance porque não é uma escrita voltada para a venda: “A poesia deveria ter uma visibilidade maior, pois é uma potência muito grande, deveria ser mais trabalhada nas escolas, em todos os espaços. As pessoas deveriam promover mais saraus e encontros culturais”.