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Brasil

De Oswaldo Cruz a Teich: veja histórico de como gestores da Saúde enfrentaram epidemias

O país já enfrentou, pelo menos, 8 surtos de doenças contagiosas e o isolamento social se mostra uma medida comum de prevenção

Agência UniCeub

16/05/2020 10h49

O ministro da Saúde, Nelson Teich. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Samara Schwingel
Jornal de Brasília/Agência UniCEUB

Nesta sexta-feira (15/05), o até então ministro da Saúde, Nelson Teich, deixou o cargo em meio a pandemia da Covid-19. Teich e o presidente Jair Bolsonaro divergiam sobre as medidas de combate ao coronavírus, principalmente o uso da cloroquina e da hidroxicloriquina como tratamento para a doença. O oncologista durou menos de uma mês no cargo. Teich era o substituto de Luiz Henrique Mandetta que deixou a pasta em 15 de abril, também por divergir de Bolsonaro.

Assim como Mandetta e Teich, alguns ex-ministros da Saúde do Brasil enfrentaram crises de saúde públicas.

Relembre alguns deles:

Em 1903, Oswaldo Cruz assumiu a Diretoria-Geral de Saúde Pública (DGSP), equivalente ao Ministério da Saúde na época. Três anos antes, teve início a epidemia de peste negra no Rio de Janeiro. Ao se tornar diretor de Saúde Pública, Oswaldo Cruz tomou algumas medidas sanitaristas, como o extermínio de ratos, para tentar erradicar a doença. Além disso, ele também institui o isolamento dos doentes e notificação compulsória dos casos positivos. Com o Instituto Soroterápico Federal (atual FioCruz) como base de apoio, em poucos meses a incidência da peste negra diminuiu.

Outro adversário de Oswaldo Cruz foi a febre amarela. Desde o primeiro caso, em 1685, O país encarou diversos surtos epidêmicos da enfermidade. Além disso, a doença comprometeu muito a economia do Brasil pois navios não atracavam em portos e as atividades turísticas diminuíram por medo da contaminação.

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Na época, Oswaldo foi contra a crença da maioria dos médicos e da população que acreditavam na transmissão da doença por meio de roupas, suor, sangue e secreções. O diretor de Saúde Pública acreditava, no entanto, que o transmissor da febre era um mosquito. Assim, substituiu as desinfecções por medidas sanitárias para eliminar o foco do inseto. As casas eram vistoriadas pelo governo sem necessidade da autorização do dono. Proprietários de imóveis insalubres eram multados e intimados a demoli-los ou reformá-los.

Em 1904, Oswaldo Cruz enfrentou a varíola. Para combatê-la, instituiu a vacinação obrigatória. Agentes de saúde entravam nas casas e vacinavam todos que lá estavam. Eis as cláusulas da lei para imunização compulsória:

  • vacinação antes dos seis meses de idade e para todos os militares
  • revacinação de sete em sete anos
  • exigência de atestado de imunização para candidatos a quaisquer cargos ou funções públicas, para quem quisesse se casar, viajar ou matricular-se numa escola
  • punições e multas para médicos que emitissem atestados falsos de vacinação e revacinação

Porém, essa forma de agir acarretou na Revolta da Vacina. O governo venceu os protestos, mas retirou a obrigatoriedade da vacinação. Em 1907, o grande número de casos de varíola levou a população em massa aos postos de vacinação. Oswaldo permaneceu no cargo de diretor de Saúde Pública até 1909.

Em 1918, a gripe espanhola chega ao Brasil. O diretor-geral de Saúde Pública era Carlos Pinto Seidl pediu demissão do cargo e foi substituído por Carlos Chagas. Na época, as grandes cidades foram as mais atingidas e tomaram medidas de prevenção como:

  • proibição de aglomerações públicas
  • fechamento de escolas, bares, restaurantes

Chagas implementou a criação de hospitais emergenciais e postos de saúde para atendimento à população. Entre as mortes pela influenza está Rodrigo Alves, presidente eleito na época. Em 2009, o vírus volta ao país com a pandemia do H1N1.

O primeiro caso de AIDS no Brasil foi registrado em 1982 durante a gestão de Walcyr Mendes Arcoverde como ministro da Saúde. Na época, a doença ainda era muito desconhecida e estudos eram realizados para tentar entender o que até hoje não tem cura.

Em 1986, o então ministro Roberto Santos criou o Programa Nacional de DST e Aids. Em 1996, sob a gestão do ministro José Carlos Seixas, o Brasil lança a terapia antirretroviral e transforma o HIV em uma doença crônica.

José Gomes Temporão foi ministro de 2007 a 2010. O problema que desafiou o ex-ministro foi o surto de H1N1 em 2009. Foram registrados 20 casos nos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins.

Em protocolo divulgado na época pelo Ministério da Saúde, as orientações gerais para a comunidade eram parecidas com as adotadas no combate ao coronavírus. Entre elas:

  • Lavar as mãos frequentemente;
  • Evitar tocar olhos, nariz ou boca;
  • Evitar contato próximo com pessoas que apresentem sintomas de gripe

Entretanto, medidas mais severas como o isolamento social não foram necessárias. Uma ação que facilitou o controle da doença foi a intensificação das vacinas contra gripe e a ampliação dos grupos prioritários para a vacina. Além disso, o Ministério da Saúde também recomendava o uso de antiviral em alguns pacientes específicos.

Arthur Chioro assumiu a direção da pasta em 2014 e permaneceu até outubro de 2015. Durante a gestão, Arthur se deparou com o surto de Zika vírus no Brasil. Os primeiros casos foram registrados em abril de 2015 na cidade de Camaçari, região metropolitana de salvador (BA) e a região mais afetada foi o Nordeste.

O protocolo adotado pelo governo na época incluía, principalmente, a eliminação do mosquito transmissor, pois não existe vacina ou medicamento para o vírus. Porém, segundo a especialista em sistemas de saúde Lydjani Paz, o zika vírus demorou a ser identificado. “Acredita-se que muitos casos de zika foram notificados como dengue ou chikungunya cerca de dois anos antes de sua identificação”, diz. Ela ainda explica que a médica responsável pela identificação do vírus chegou a enfrentar muita resistência, além de ser desacreditada até por colegas de profissão.

Após uma reforma ministerial feita pela então presidente Dilma Rousseff, Marcelo Castro assumiu o comando do Ministério da Saúde. Ele também enfrentou a crise do zika vírus, mas deixou o cargo ainda no meio da crise em 2016 pois o PMDB rompeu com o governo petista. Ricardo Barros foi nomeado para a pasta, onde permaneceu até 2018.

Em relação ao surto de zika vírus, Leydjani afirma que o momento foi importante e deixou um legado para futuras crises. “Durante a Copa do Mundo, em 2014, o governo investiu na formação de profissionais para o enfrentamento de calamidades como o Covid-19”, diz.

Ricardo Barros deixou o cargo de ministro da Saúde em abril de 2018 dando espaço a Gilberto Occhi. Em 2019, Occhi entrega a liderança da pasta para Luiz Henrique Mandetta. Em todas essas gestões, o Brasil enfrentou surtos de dengue. Em relação a essa doença, Lydjani considera que o país sempre correu atrás do prejuízo. “A cada novo tipo de dengue, o país é assolado pelos casos, muitos deles graves, resultando em óbito. O sucesso do controle varia de região para região”, explica.

Melhor estratégia

Leydjani considera que o Brasil tem um bom histórico de combate a doenças transmissíveis. Porém, ela ressalta que a eficácia das medidas está relacionado a disponibilidade das ferramentas necessárias. “Temos ilhas de excelência como o programa de HIV (1980). Mas temos lacunas importantes como no enfrentamento de agravos de tuberculose e hanseníase”, diz.

Sobre as medidas adotadas no combate às doenças transmissíveis, Leydjani acredita que o Ministério da Saúde investe na formação de profissionais capacitados, além de adotar os protocolos já estabelecidos para situações de crises. “Em 2001, o Ministério da Saúde promovia um curso para a formação de epidemiologistas de campo em parceira com a CDC (Centers for Disease Control and Prevention)”, diz. Essa experiência, segundo Leydjani, resultou em uma transferência de conhecimento e tecnologia para o Brasil que devem ser aproveitadas contra a Covid-19.

Teste de coronavírus feito no Estádio Mané Garrincha. Foto: Vítor Mendonça/Jornal de Brasília

De acordo com a especialista, em situações de crise, é importante ter um comando único e claro estabelecido para que o combate a doença tenha mais chances de ser bem sucedido. “É um momento de união, questões ideológicas precisam ficar a parte, em segundo plano”, diz Leydjani. Além disso, ela ressalta que a manutenção da atenção básica e o apoio aos profissionais de saúde são primordiais em momentos de crise. “A saúde coletiva requer ações de base sustentáveis e contínuas. O caminho a seguir os profissionais já conhecem, agora eles precisam ser apoiados”, conclui.

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