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Vinhos e Vivências
Vinhos e Vivências

Lugar de mulher é onde ela quiser!

No âmbito do Dia Internacional da Mulher, a coluna entrevistou a sommelière e jornalista especialista em vinhos Etiene Carvalho, professora da ABS-DF e embaixadora do clube de chaturos Puro World Club

Cynthia Malacarne

10/03/2023 5h00

Dia 08 de março foi o Dia Internacional da Mulher. Fiquei pensando em todos os percalços que nós mulheres passamos ao longo de nossa carreira, das exigências que nos são impostas, das cobranças quando somos mães e esposas, e inclusive se a área em que atuamos é predominantemente masculina e se deveríamos estar ali.

Acredito que os bons exemplos servem de inspiração para muitas mulheres. Hoje, gostaria de deixar registrada nesta coluna a trajetória da brasiliense Etiene Carvalho, servidora pública, sommelière e jornalista especialista em vinhos, a única mulher a possuir certificação internacional de especialista em charutos no Distrito Federal. Etiene também é diretora e professora da Associação Brasileira de Sommelier (ABS-DF) e embaixadora do clube de charutos Puro World Club.

Em entrevista a esta coluna, Etiene compartilhou conosco um pouco de sua experiência e conhecimento nos mundos do vinho e do charuto. Confira:

Vinhos e Vivências: Como começou sua história com o vinho?
Etiene Carvalho: Como muita gente da minha geração, comecei pelos vinhos de mesa, passei pelo Lieubfraumilch, o vinho alemão doce da garrafa azul, e cheguei aos reservados achando que eram os melhores. Depois, aos poucos, fui evoluindo o paladar, na medida em que o mercado brasileiro também se abriu para as importações de vinhos com maior qualidade. Em 2010, após uma fase de terrível estresse, resolvi, por aconselhamento médico, eleger um hobby. Como gosto muito de ler e de pesquisar, achei que estudar vinhos (e poder bebê-los com maior conhecimento de causa, claro) seria uma solução interessante pra combater minha estafa. O incentivo veio da minha mãe. Naquele ano, ela me deu de presente de aniversário meu primeiro curso de vinho básico numa loja do Shopping Iguatemi. Foram 12 horas de aulas teóricas e práticas. Depois, montamos uma confraria que se reunia todas as quartas-feiras. Era perfeito: enquanto o marido ia beber cerveja e assistir a jogos de futebol com os amigos eu ia estudar e beber vinho no shopping!

Quais foram os cursos e especializações sobre vinhos que você fez?
Eu já fiz muitos e continuo fazendo. Adoro aprender! Alguns deles: os níveis 1, 2 e 3 da Wine and Spirit Education Trust; o French Wine Scholar (especialização em vinhos da França); o Californian Wine Specialist (especialização em vinhos da Califórnia); e o Sommelier Avanzado Fisar em parceria com a Universidade de Caxias do Sul. Também sou sommelier pela ABS do Rio Grande do Sul e fiz curso de elaboração de vinhos na Embrapa Uva e Vinho do Paraná.

Atualmente você é professora da ABS-DF. Como surgiu esse convite?
Sou Jornalista de formação e, há dez anos, cursei um mestrado em Comunicación Digital pela Universidade de Alcalá, na Espanha, onde o trabalho de conclusão de curso foi criar um blog. Surgiu assim o Blog Vinho Tinto, onde escrevo até hoje. O blog me abriu muitas portas no mundo do vinho e, por meio do trabalho de divulgação que comecei a fazer, tive oportunidades de conhecer muitos lugares e pessoas e de ter acesso a vinhos excepcionais dos mais variados lugares do mundo.

O convite para integrar a ABS-DF veio da atual vice-presidente, Claudia Oliveira, que me ofereceu a diretoria de mídias da instituição em função da minha experiência na área de Comunicação Enogastronômica. Como eu também já ministrava cursos de vinhos, acredito que isso também tenha tido peso na escolha do meu nome, uma vez que os diretores da ABS-DF são professores da instituição.

Vejo que em Brasília há muitas mulheres envolvidas na cena do vinho, dando cursos, guiando degustações e escrevendo blogs, o que demonstra que esse universo está cada vez mais feminino. Quando você começou, houve algum tipo de preconceito por ser mulher ou foi bem recebida?
À época, já havia algumas mulheres aqui em Brasília envolvidas direta ou indiretamente na divulgação do mundo do vinho, como Liana Sabo, Rachel Alves, Su Maestri, Adriana Nasser, Lu Barbo, entre outras. Talvez elas tenham sentido isso mais do que eu. Na verdade, eu não tive dificuldades nesse sentido.

E como foi a sua chegada ao mundo do charuto?
Degusto charuto há algum tempo, e depois que entrei para o mundo do vinho tive a oportunidade de conhecer mais sobre eles. No entanto, só iniciei os estudos durante a pandemia, quando resolvi me aprofundar no assunto fazendo o curso da International Association of Cigar Sommeliers (o mais respeitado curso da área em nível internacional) e o da Cigar Sommelier Academy com o sommelier Gabriel Lourenço. Fiquei praticamente um ano estudando bastante, não apenas para ter a certificação, mas para aprender de verdade. Comprei e li muitos livros sobre charutos, degustei charutos de vários países e visitei algumas fábricas produtoras para entender o processo de pertinho.

Os charutos brasileiros são considerados de qualidade?
Sim, o tabaco brasileiro é exportado para vários países do mundo e é utilizado em muitos charutos conceituados. Também produzimos excelentes charutos no Recôncavo Baiano e, mais recentemente, começamos a produzir charutos na Amazônia que estão ganhando espaço no cenário mundial tanto pelo ineditismo como pela qualidade.

Você acha que, assim como já ocorreu com o vinho nacional, há certo preconceito com o charuto brasileiro?
Sinceramente, acho que o preconceito não é especificamente com o charuto brasileiro, mas com os off- Cuba, ou seja, com aqueles que não são produzidos em solos cubanos. É preciso que as pessoas entendam que, assim como ocorre com o vinho, o solo, o clima, a altitude e o homem também exercem influência nas características organolépticas do charuto. As pessoas precisam romper esse tipo de preconceito para conseguirem ampliar as suas experienciais sensoriais. Tenho certeza que vão se surpreender!

É possível harmonizar charuto com vinho?
Com certeza, apesar da harmonização clássica do charuto ser com bebidas destiladas, como conhaque. No caso do vinho, a literatura nos ensina a degustar charutos com fortificados, como Porto, Madeira e Jerez. Entretanto, adoro provar rótulos tranquilos e espumantes com charutos. Antes de pensar no vinho que irá acompanhar o charuto, é preciso estudar com carinho esses dois elementos. Mas sou fã dessa harmonização controversa.

No mundo do charuto você recebeu a mesma receptividade do mercado ou foi diferente? O charuto está inserido num ambiente mais masculino do que o vinho?

O mundo do charuto ainda é muito masculino. Penso que ser mulher nesse meio é uma questão de se posicionar e ganhar seu lugar, algo que só é possível com muito trabalho, estudo, prática e, claro, tempo. No mundo do vinho muitas barreiras já foram derrubadas e precisamos fazer o mesmo na área do charuto. Veja bem, ainda escuto de algumas mulheres que seus maridos ou namorados as pedem para não fumar charuto fora de casa por achar a prática vulgar. Parece algo inimaginável em pleno século XXI, mas não é. E é justamente contra esse tipo de pensamento que precisamos nos posicionar de forma mais intensa, mostrando que lugar de mulher é onde ela quiser, fazendo o que ela bem entender.
Por outro lado, existe sim quem respeita e enaltece a presença feminina nessa área. Por exemplo, hoje sou embaixadora do Clube de Charutos Puro World Club e fui contratada não apenas por ter o título de sommelier internacional de charutos, mas principalmente por ser uma mulher. A marca objetiva quebrar paradigmas e valorizar a mulher nesse universo do charuto.

Haverá cursos de charutos no Clube Puro World Club?
Sim, junto com a Puro World Club, o Instituto Todde e outras instituições e sommeliers internacionais, estamos organizando workshops e cursos profissionalizante ainda para esse semestre. Também já fazemos o treinamento das empresas parceiras. Sem dúvida, a minha maior felicidade nessa área do charuto é poder compartilhar o conhecimento que adquiro todos os dias.

Icewine – o vinho do gelo

Já ouviu falar em vinho elaborado com uvas congeladas? Sempre que pensamos em como é produzido um vinho, vem logo à mente os vinhedos no verão, tanto no hemisfério norte, quanto no Sul do Brasil. Isso porque o período de maturação da uva acontece no verão, e logo em seguida é realizada a colheita e vinificação. Entretanto, o Ice Wine é elaborado em regiões onde o verão é quente, mas no inverno as temperaturas são extremamente baixas, e a vindima é realizada no inverno muitas vezes com temperaturas abaixo de 10 graus.

O que é Icewine?
É um vinho de sobremesa elaborado com o mosto intenso das uvas congeladas na videira. A sua produção se limita a alguns países que possuem condições climáticas, como a Áustria, Alemanha e Canadá, sendo este o principal produtor. Considerado um vinho especial pela dificuldade em ser elaborado, normalmente é comercializado em garrafas de 250ml. Com preço elevado é visto por muitos como uma iguaria.

Como é elaborado o Icewine?
Vinho único que pode ser elaborado com as seguintes variedades de uva: Cabernet Franc, Merlot, Gewürztraminer, Riesling, Grüner Veltliner, Chenin Blanc, e Vidal Blanc. Normalmente são utilizadas mais uvas brancas do que tintas para a produção deste vinho, uma vez que estas aguentam temperaturas mais elevadas.

Para receber o nome Icewine no rótulo é preciso que as uvas sejam colhidas congeladas na videira, em temperaturas abaixo de 7 graus. Não vale para uvas congeladas artificialmente. As uvas são vindimas à noite, entre os meses de dezembro e janeiro. As uvas congeladas são levadas para a prensa.

Geralmente, estes vinhos estagiam em barricas de carvalho francês por um período entre 6 a 10 meses. Apenas de 1ml de mosto é obtido com cerca de 10 uvas, assim para cada garrafa de Icewine são necessários 3 kg de uvas. Com essa mesma quantidade é possível fazer algo próximo a sete garrafas de vinho normal. Por isso é um vinho raro e caro.

Por que colher em condições tão extremas?
Quando a temperatura está muito abaixo de zero graus, o teor de água do bago da uva é expelido pelo frio, restando ali maior concentração de açúcar. É esse mosto super concentrado, rico em açúcares e compostos fenólicos (precursores de aromas e sabores), que dará origem ao Icewine, cuja característica marcante é o seu dulçor, acidez marcante e baixo teor alcoólico.

Sabores e aromas
O Icewine elaborado com uvas brancas possui sabores fortes de mel, frutas cítricas, pêssego, damasco seco e frutas tropicais como manga. Já o elaborado com variedades tintas tem notas de frutas vermelhas como morango e leve toque de especiarias. Ambos podem exibir um nariz floral e um final persistente e sedoso e tendem a ter poucos taninos.

Infelizmente é um vinho que não se encontra com facilidade no Brasil, primeiro pelo alto custo e segundo porque a produção mundial é muito pequena. Então caso se depare um um Icewine não deixe de prova-lo, será uma experiência inesquecível.

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