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Quinto Ato
Quinto Ato

Nossos corpos são jardins

“Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o bem que poderíamos conquistar se não fosse o medo de tentar”. Por isso plante seu jardim e decore sua alma, pois Shakespeare pode ajudar a curá-la.

Theófilo Silva

07/08/2020 8h33

Atualizada 06/08/2020 23h39

A sentença de Pitágoras dita cinco séculos atrás “Eduquem as crianças e não será preciso punir os homens” parece caminhar ao encontro de outra de Shakespeare, em Otelo, que diz que “Nossos corpos são jardins e nossa vontade é o jardineiro”. Podemos perceber, claramente, que as duas frases podem funcionar como linhas paralelas caminhando juntas à procura do aperfeiçoamento do ser humano. Ecoando o que os físicos dizem que as paralelas se encontram no infinito. Ou seja, trata-se de uma parceria frutífera da educação com o autoconhecimento rumo à harmonia. E de harmonia é tudo que precisamos no momento.

Ainda em Otelo, Shakespeare nos diz que “Depende de nós mesmos sermos deste ou daquele jeito” quer dizer que a partir de nossas escolhas, podemos nos tornar pessoas equilibradas e sensatas ou vilões irresponsáveis. Nesse monólogo, ele compara nosso corpo a uma horta, em que “podemos plantar urtigas e cansanção”, ou seja, ervas daninhas, que fazem mal, danificando o corpo e a alma, ou “plantar e cultivar camomila e hortelã” ou outras espécies de plantas ou ervas medicinais que curam nossos males. Assim, a escolha pode ser sua, que é a mesma coisa que torná-lo “estéril pela preguiça ou então fertilizá-lo pelo trabalho”. Já que está em nós mesmos o poder para isso, já que “na balança da nossa vida temos que ter o prato da razão para equilibrar o outro prato das paixões”, pois sem isso sofreríamos graves consequências. Assim, o prato da razão ajuda a esfriar nossos ímpetos e apetites desenfreados. Como não concordar com esses preceitos?

São pensamentos e passagens como essa que transformam Shakespeare num autor essencial para nos trazer amadurecimento e autoconhecimento. Shakespeare nunca dá conselhos, ele apenas, por intermédio de seus personagens, nos mostra as consequências de nossas escolhas e atitudes ao longo de nossas vidas. “Quantas coisas o tempo faz chegar á estação própria, ao louvor da perfeição”. Pois “As feridas que fazemos em nós mesmos cicatrizam-se mal” e que “a ordem em fazer o necessário sela uma ordem ao perigo, e o perigo como uma enfermidade penetra-nos sutilmente, mesmo que estejamos deitados indolentemente ao sol”. Assim, precisamos nos vigiar para não nos machucarmos a nós mesmos com ódios, loucuras e rixas gratuitas.

Se Shakespeare foi traduzido em todos os idiomas conhecidos, e sua obra concorre com a Bíblia em número de publicações, é porque ele fala direto ao nosso coração e a nossa alma. Lembrando que Shakespeare não é somente literatura, mas teatro, e teatro significa filmes: televisão, cinema e vídeos. E vídeos são o que há de mais atual, e hoje qualquer pessoa vê e faz vídeos em seus celulares, repercutindo o dia a dia como um cronista.

E outra coisa, Shakespeare é dos escritores clássicos o mais acessível à leitura, sendo um dos raros autores que escreveram antes do século XVI, que continua sendo lido por todos. Por que isso? Simplesmente, porque ele pode ser compreendido por qualquer pessoa que goste de ler. Quem quiser se divertir, cair na gargalhada, procure conhecer Falstaff e seus companheiros de bebedeiras, ou de Lúcio e Pompeu ou dos muitos Bobos da corte e palhaços existentes em suas comédias imortais.

Nesse gigantesco mosaico em que ele imita a vida, ou até mesmo a recria, o bardo nos ensina a encarar os desafios, a seguir em frente, passando por cima dos obstáculos que a vida nos apresenta. Ele diz em Medida por Medida que “Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o bem que poderíamos conquistar se não fosse o medo de tentar”. Por isso plante seu jardim e decore sua alma, pois Shakespeare pode ajudar a curá-la. Portanto, corra e vá ler ou ver Shakespeare no conforto de sua casa! Faça isso!

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