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Quinto Ato
Quinto Ato

Oh, admirável cidade nova!

Theófilo Silva

21/04/2021 0h00

Oh, admirável cidade nova!

Se Ariel, o ser alado, mágico, personagem da peça A Tempestade, de Shakespeare, ambientada numa ilha deserta e inóspita, “cheia de árvores e sons de bichos”, sobrevoasse o Planalto Central do Brasil em 21 de abril de 1960, ele iria achar estranho o novo ambiente, e com certeza ele diria essa preciosidade: “Oh, que maravilha, como é bela a humanidade! Oh, admirável mundo novo em que vivem tais pessoas”. Pois se existe uma frase de Shakespeare que sintetiza bem o impacto que devem ter sentido todos aqueles que conheciam o enorme espaço vazio no meio do cerrado, no coração do Brasil, e de repente, estupefatos, como se acordassem de um sonho, vissem Brasília, após sua rápida construção, como se fosse obra de um milagre, diriam “Oh, maravilha, como é bela esta cidade”.

Pois sabemos que Brasília foi construída no meio do nada, na solidão do coração do Brasil. Mas o que muita gente não sabe, é que Brasília, a capital do país, não foi produto de um “Sonho de uma noite de verão”, de um rompante de um presidente, de único homem, mas de muitos, muitos deles, brasileiros, e até mesmo estrangeiros. Esse sonho, esse projeto começou no século XVIII, com os inconfidentes mineiros, Dom João VI, Marquês de Pombal, Visconde de Porto Seguro, Luís Cruls, Floriano Peixoto, Getúlio Vargas, Epitácio Pessoa, para citar apenas os principais atores.

Foi Dom Bosco, em1841, que viu Brasília num sonho. O padre italiano previu “o nascimento de uma rica e próspera civilização no hemisfério sul, no mesmo paralelo onde seria construída a futura capital federal, o local da terra prometida”. Falando para sua congregação, Dom Bosco disse que ouviu uma voz que lhe disse várias vezes “Quando escavarem as minas escondidas no meio desses montes aparecerá aqui a grande civilização, a terra prometida, onde correrá leite e mel. E será de uma riqueza inconcebível” “E que essas coisas acontecerão na terceira geração”. Não foi na terceira geração, mas foi perto disso.

Mas um sonho precisa de alguém para realizá-lo. E foi Juscelino Kubitscheck, o carismático e simpático presidente da República, com seu lema ”Cinquenta anos em cinco” que “Arregaçou as mangas” e resolveu transformar o sonho de quase dois séculos em realidade. Foi ele o construtor, que juntamente com Oscar Niemeyer, Lúcio Costa e Burle Marx criaram a belíssima Brasília a qual sonhava Dom Bosco.

A quantidade de obstáculos que Juscelino enfrentou para construir a capital, em apenas cinco anos, foi um tarefa hercúlea, que somente um homem provido de coragem e raro traquejo político seria capaz de fazer. Para começar, havia o Rio de Janeiro, a cidade maravilhosa, que há quase duzentos anos substituíra Salvador como capital do país. Sem contar os enormes custos da construção de uma cidade a partir do zero, havia todo um gigantesco contingente de funcionários públicos que não queriam “Se mudar para o meio do deserto”, longe do litoral carioca, longe de Copacabana, longe do carnaval! Uma imprensa que o questionava o tempo todo: “O senhor está louco de construir uma cidade no meio deserto?”. Onde ele ia achar água, se não havia um rio?! Mas Juscelino fez um rio. Mandou cavar e criou um enorme lago artificial que nunca deixou faltar água na cidade. Juscelino queria uma capital como Nova Delhi, Washington, Wellington, seguir a nova tendência mundial.

E Juscelino teimou… E venceu. Os brasilienses nasceram, mais brasileiros vieram para a cidade, e hoje já são mais de três milhões deles. E Brasília, que foi concebida como um ser alado, um Ariel, um avião prestes a decolar, com suas enormes asas sul e norte transformadas em blocos de apartamentos cheios de pessoas, com sua fuselagem de prédios públicos de arquitetura revolucionária e inovadora, que encantam o resto do Brasil e o mundo.

Assim, Brasília venceu a tempestade humana contrária à sua existência. Dom Bosco virou o patrono da cidade, e Juscelino uma estátua na Esplanada. Brasília é hoje uma sessentona que decolou, encantando o mundo com sua beleza, e hoje voa junto com Ariel, ecoando a frase de Shakespeare: “Nós somos feitos da mesma matéria de que são feitos os sonhos”. Vida longa, Brasília! Feliz Aniversário!

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