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Psicanálise da vida cotidiana
Psicanálise da vida cotidiana

Aos eleitores: “Tempo de Homens Partidos”

E aí, José? Pergunta histórica do “Itabirano”. E aí, eleitor? Que faremos? Que farão esses homens cindidos? Que Brasil queremos?

Carlos de Almeida Vieira

10/10/2022 7h00

Atualizada 09/10/2022 17h47

Nosso país há tempos vive crises políticas, mostrando a toda população o que nosso querido Carlos Drummond em seu belo e triste poema denunciou: “Este é tempo de partido / tempo de homens partidos”. O Brasil está dividido. Que lástima!

Em psicanálise, nós analistas usamos uma expressão forte quando queremos falar de personalidades com distúrbio de Identidade: falamos em pessoas divididas, splitadas, cindidas, que são incapazes de ter uma percepção inteira de um “objeto”, ou mesmo de pessoas. Internamente essas pessoas são “homens partidos”, homens que não integram os opostos, não toleram as diferenças, não sabem olhar para dentro e para fora, de uma maneira integrada. Daí as paixões doentias, as ideologias extremistas, os pensamentos oniscientes e arrogantes, as atitudes de auto-referência e a persecutoriedade, ou seja, ou são a favor ou contra.

Prossegue o poeta Gauche:

“Este é tempo de divisas
Tempo de gente cortada
De mãos viajando sem braços
Obscenos gestos avulsos…
E continuamos.
É tempo de muletas
Tempo de mortos faladores e velhas paralíticas
Nostálgicas de bailado
Mas ainda é tempo de viver e contar.”

Querido leitor, como Gauche diz, ainda é tempo de viver e contar; é tempo de reconhecer que nossos candidatos à Presidência da República não deixaram de lado suas nuances de personalidades beligerantes, odientas e arrogantes. Continuam a brigar, atacar e usar de verbos que doem aos nossos ouvidos em substituição a mostrar programas de governo e confiabilidade. Penso, inclusive, que não precisamos de salvadores da pátria, necessitamos de pessoas que tenham uma consciência coletiva, social, voltada para as necessidades básicas da população: alimentação, educação, cultura, habitação. Estamos descrentes de delírios de poder, de onipotência e homens de “palavras roucas e duras, irritadas”; pessoas feridas em seu narcisismo mortífero com promessas religiosas. Aliás, estamos vivendo tempos em que lembram a inquisição que Estado e religião seriam uma coisa só.

“…E há mínimos bálsamos
Recalcadas dores ignóbeis
Lesões que nenhum governo autoriza
Não obstante doem
Melancolias insubornáveis
Ira, reprovação, desgosto
Desse chapéu velho, da rua lodosa, do Estado.”

E aí, José? Pergunta histórica do “Itabirano”. E aí, eleitor? Que faremos? Que farão esses homens cindidos? Que Brasil queremos? Estamos submersos nos sofrimento dostoièviskiano, no grito de liberdade de Graciliano Ramos, no absurdo de Albert Camus e na náusea de Sartre. O suicídio tanto individual quanto coletivo tem sido oferecido; o humanismo ficou preso na garganta dos “românticos”; a realidade atual brasileira é de uma cultura dos coronéis e não de democratas verdadeiros. A classe média omissa, o povo sem alternativa de pensamento e a classe dominante oferecendo promessas, promessas e promessas.

“E fomos educados para o medo, Cheiramos flores de medo Vestimos panos de medo De medo, vermelhos rios Vadeamos. Refugiamo-nos no amor, Este célebre sentimento, E o amor faltou: chovia, Ventava, fazia frio em São Paulo."

Fragmentos de versos drumonianos em “O Medo”.

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