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Histórias da Bola
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Neco, o dono da camisa amarela

Moda que pegou, por acaso, no Mineirão da década-1960

Gustavo Mariani

06/10/2021 20h39

Atualizada 07/10/2021 11h34

Aos 38 anos de idade, no dia 21 de dezembro de 1983, após disputar, no Maracanã, a sua última partida como goleiro profissional, Raul Guilherme Plasmann fez questão de homenagem um colega de profissão que não era badalado pela imprensa, nunca idolatrado por torcedores e jamais chamado para a Seleção Brasileira: o lateral-esquerdo Neco (circulado na foto). Sem querer, o amigo contribuíra, enormemente, para a idolatria dele, pela torcida cruzeirense. Por inteiro acaso.

Um dia, o roupeiro não levara para o estádio uma camisa que coubesse em Raul. O que fazer, se o jogo estava para começar? Neco lembrou-se de que havia em sua bagagem uma camisa de mangas compridas, tipo das usadas em dias de frio. Coube certinho no colega. O mais foi improvisar o número 1, com esparadrapo. E Raul surpreendeu o Mineirão, surgindo à boca do túnel vestido de amarelo, em uma época em que os colegas de posição só usavam o preta. E a surpreendente cor virou o seu símbolo do goleiro, quando ele já era paqueradíssimo pelas torcedoras da “Raposa”, por ser alto, loiro e cabeludo, como um cantor de iê-iê-iê, que estava na onda.

Embora não ganhasse aplausos como Tostão, Dirceu Lopes, Natal, Piazza e o próprio Raul, entre outros, Neco foi um dos mais constantes titulares na melhor fase cruzeirense de todos os tempos. Por exemplo, em 1967, quando o time estrelado sagrou-se tricampeão mineiro, ele fez 35 partidas durante a temporada, sendo o terceiro que mais atuara em jogos no Mineirão, só suplantado por Pedro Paulo (37), Dirceu Lopes, Natal, Procópio e Raul (36). Em 1968, durante a campanha do tetra, embora tivesse jogado menos (25 vezes), ainda assim integrou o time dos 11 com mais atuações.

Por causa do acaso, Raul incluiu Neco entre os amigos inesquecíveis de parte dos seus tempos estrelados que lhe renderam 10 títulos estaduais mineiros e a Taça Libertadores-1976 – pelo Flamengo, onde chegou, em 1978, foi campeão da Libertadores e do Mundial Interclubes, ambos em 1981, tri brasileiro e de várias disputas cariocas.

Neco era um sujeito com opinião dentro da média dos brasileiros. Considerava Pelé o cracaço do futebol mundial; Aírton Moreira (montador do grande Cruzeiro da décda-1960 e irmão de Aymoré e de Zezé) o melhor treinador; Armando Marques, o melhor árbitro; o avião, o maior invento humano e a morena como a dona da pele mais bonita. Sobre ele, apontava a sinceridade como a sua maior virtude, jurando ser incorruptível.

Embora não fosse tietado pelos torcedores cruzeirenses, Neco garantia não ter queixas do futebol. Analisava as críticas e aceitava as corretas; jamais fora ameaçado por torcedores fanáticos, após as derrotas; não discutia com os árbitros, por achar que não valia a pena; falava o suficiente em campo, apenas “cantando” jogadas, e evitava revidar deslealdades dos adversários. Por isso, era constante em campo.

Quando os repórteres chamava Neco para as chamadas entrevistas “bate pronto”, ele era “rápido no gatilho”. Apontava o gramado onde o Cruzeiro jogava em Sete Lagoas-MG o pior que conhecera e o do Maracanã o melhor. Sentia um pouco medo de viagens áreas, em tempos chuvosos, mas, para rolar a bola, não faria diferença se fosse inverno ou verão. Concentração? Se não fosse longa, tudo bem. Menor e maior “bicho” recebidos por vitória? Cr$ 1 cruzeiro, nos tempos de Villa Nova, de Nova Lima-MG, e Cr$ 650, ao eliminar o Grêmio Porto-Alegrense, da Taça Brasil-1966.

Era assim o homem que merecia homenagens. No mais, dizia só dizia que camisa não ganhava jogo, que não havia vitória melhor do que sobre o Atlético Mineiro e que ele era, meramente, “um elemento útil ao time do Cruzeiro”.

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