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Concursando Direito
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A colisão de dois microssistemas

A mistura do microssistema coletivo de execução com a celeridade do microssistema dos juizados especiais foi tentada na prática.

Werner Rech

16/11/2020 11h50

Execução individual de sentença coletiva em juizado especial, pode isso?

Você já deve ter ouvido falar que as execuções de sentenças coletivas têm seu próprio rito e especificidades, em que pese usar o Código de Processo Civil subsidiariamente. Você também já deve ter ouvido falar que os juizados especiais têm seu microssistema, assim como os direitos coletivos em sentido amplo. Se você não ouviu, “volte duas casas”.

Além da execução de tutela coletiva ter seu rito próprio, os juizados especiais também têm suas especificidades e ambos utilizam o Código de Processo Civil subsidiariamente. A mistura do microssistema coletivo de execução com a celeridade do microssistema dos juizados especiais foi tentada na prática. Contudo, o resultado da tentativa de harmonizar (utilizando os termos da Daiany Nasteoli – Coluna Prazeres do Vinho) os dois microssistemas não deve ter agradado à pessoa que levou adiante essa tese.

Recentemente o Superior Tribunal de Justiça publicou o Informativo de Jurisprudência n. 679 (05 de outubro de 2020), no qual foi apresentado o resultado do Tema de Recursos Repetitivos n. 1029 (REsp 1.804.186-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/08/2020, DJe 11/09/2020). O tema diz respeito a possibilidade de executar individualmente sentença coletiva nos juizados especiais, desde que respeitado o teto do valor da causa.

Para começarmos, é importante entender que as ações coletivas são processadas sob o rito ordinário. Já as ações que estão na alçada dos Juizados Especiais tramitam pelo rito sumaríssimo. Para os entendedores do processo civil isso já ensejaria dificuldades no pleito, pois depois que o nosso sistema processual civil adotou o sincretismo como modo de instrução e execução num único processo, alterar os ritos do processo após a sentença quebraria essa linha mestra processual.

No entanto, as disposições da Lei n. 12.153/2009 (Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública) não se referem aos direitos individuais homogêneos. O art. 2º, 1º, inciso I, da referida lei, apenas proibi a execução de direitos coletivos e difusos. Quando tratamos dos direitos coletivos (em sentido amplo), temos uma divisão clássica tricotômica em: Difusos, Coletivos (em sentido estrito) e individuais homogêneos. Esses últimos são até mesmo chamados de acidentalmente coletivos (Barbosa Moreira), pois embora sejam individuais, por uma questão de utilização eficiente do processo, o legislador permite que seja processado sob a égide do microssistema coletivo. Tudo indicaria que poderia ser considerado um silêncio eloquente do legislador, possibilitando a execução desses direitos por meio de execuções individuais de sentenças coletivas.

Apesar disso, a Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública tem como lei subsidiária a Lei n. 9.099/1995 (Lei dos Juizados Especiais). Nessa última existe disposição proibindo a execução de sentenças que não tenham sido proferidas no âmbito dos juizados especiais (art. 3º, §1º, da citada lei). No mesmo sentido, a Lei n. 10.259/2001 (Lei dos Juizados Especiais da Justiça Federal), aplicada subsidiariamente no caso, também prescreve a execução de suas sentenças (art. 3º, da mencionada lei).

Como se não bastasse, todos esses dispositivos aplicados ao caso, o próprio Código de Processo Civil, mantendo o sincretismo processual, impõe a execução das sentenças perante aos juízos que as proferiram, nos temos do art. 516, vejamos:

“Art. 516. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante: I – os tribunais, nas causas de sua competência originária; II – o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição; III – o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente poderá optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde se encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do local onde deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem.”

Por isso, o Superior Tribunal de Justiça entendeu no sentido de ser inviável a execução individual de sentença coletiva perante os juizados especiais. Fica evidente que as ações que versam sobre direitos coletivos em sentido amplo não tramitam pelo rito sumaríssimo e, por conta disso, jamais terão suas sentenças executadas perante os juizados.

Agora que você sabe tudo sobre essa colidência de dois microssistemas vai assombrar o examinador!

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