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Analice Nicolau
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“Infelizmente, quando o negro consegue chegar no topo, ele se esquece dos irmãos”, desabafa a influenciadora Isis Lyon

Filantropa e musa da Unidos de Vila Maria, Isis Lyon afirma que ainda enxerga uma resistência dos negros da classe artística em apoiar ações sociais

Analice Nicolau

13/07/2021 16h00

Filantropa e musa da Unidos de Vila Maria, Isis Lyon afirma que ainda enxerga uma resistência dos negros da classe artística em apoiar ações sociais

O empoderamento negro ganha vez mais destaque na mídia, trazendo representatividade dando passos importantes no combate ao preconceito. Mas, segundo a influencer Isis Lyon, a união entre os negros não é tão forte assim – pelo menos não no Brasil.

“A militância contra a violência e os maus tratos ao negro é fundamental, mas, na prática, não é o que acontece”, aponta. “Quando começa a melhorar de vida, o negro acaba se distanciando dos demais que não conseguiram o mesmo que ele, em vez de ajudar os outros negros a crescer. Assim como o branco tem capacidade, o negro também tem e a nossa luta foi muito mais dolorida. Ainda tem cicatriz, ainda tem marca, a gente tem calo, entende?”

Isis viu de perto a mudança de comportamento dos chamados “negros de elite” e reprova o tipo de segregação que eles promovem. “É importante para que eles se misturem com os brancos para se tornarem brancos, tão brancos quanto os brancos. É impressionante, né? Você olha para um negro com dinheiro e ele dificilmente está com outros negros. Ele tem vergonha de sua cultura, de sua família. Infelizmente, quando o negro consegue chegar no topo, ele se esquece dos irmãos. Mas a sociedade sempre arranja um jeito de lembrá-lo que ele é negro por meio de uma situação de preconceito”, explica.

A própria influencer já sofreu com racismo vindo de outros negros. Para ela, a pior parte é saber que a pessoa que cometeu o ato conhece a dor de ser vítima de preconceito, e, mesmo assim, insiste em praticá-lo.

“O que mais dói é quando o negro é racista com você. Por exemplo, negro desconfia de você no mercado, achando que você vai roubar alguma coisa. Ele te vê como um fenótipo de meliante, te enxerga como lixo. Ele não vai seguir o loirinho de olho azul que talvez esteja roubando e colocando na mochila para trocar por droga. Vai seguir você, que trabalhou o dia inteiro e está cansado, indo ao mercado comprar um miojo para comer em casa”, descreve. Ela lista outras situações delicadas.

“O manobrista não te dá seu carro porque é bom e negro não tem carro bom. Para entrar no condomínio, o porteiro confirma mil vezes o seu documento, pede para abaixar sua máscara para confirmar que é você porque o seu tom de pele é escuro. Impossível você ser tão bem de vida sendo negro e honesto, né? Já sofri de diversas formas, até vindo de vendedores de loja. Dói que todos eram escravizados, somos todos iguais. E pode ser claro, mulato, negro retinto. Isso dói muito”, desabafa.

Além de influenciadora, Isis também é filantropa e musa da escola de samba Unidos da Vila Maria. Ao comandar a sua ONG, a GR Together, ela sente resistência da classe artística em apoiar projetos sociais.

“Sofri demais para ter apoio de negros nas campanhas da ONG, mesmo ajudando pessoas em situação de rua e em comunidades, onde a maioria é preta. Mas, ao dar uma olhada nas redes sociais desses famosos, eles levantam bandeira e defendem causas que nem são nossas. É pura hipocrisia porque o Brasil é o país mais racista do mundo, mas os negros não se unem”, lamenta.

A influencer acredita que a realidade mudaria completamente se os negros fossem mais unidos. Ela utiliza como exemplo o impacto da cultura negra nos Estados Unidos. “Por lá, o presidente já foi preto, assim como a primeira dama e a atual vice. Vejo os negros representando tantas marcas e sendo artistas poderosos. Quando vou assistir a um filme, a maioria dos personagens são negros, representando o nosso sangue. E aqui ainda não há nada disso, de reivindicar o que é nosso”, destaca. “A gente só sabe lutar pelo negro quando um americano morre. Quantos negros no Brasil morrem só porque são negros? É um absurdo”, questiona.

“Deveríamos crescer estudando Martin Luther King. Como a história do negro, principalmente do Sul dos Estados Unidos, foi transformada. O negro parou de sentar no fundo do ônibus, o negro parou de ter que usar um banheiro e um bebedouro específico por ser considerado sujo. A união não faz só a força, ela traz poder. Ninguém vai te humilhar e rir do seu cabelo quando você tem outro negro ao lado porque ele vai tomar suas dores. E não só ele como a sociedade, que vai te enxergar com mais respeito”, finaliza.

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