Aos quatro anos de idade, Janaína Kuhn, hoje com 40 anos, sofreu uma queda e, tempos depois, um osso começou a se formar na sua lombar. Somente por volta dos seus 22 anos, ela finalmente descobriu a razão do seu corpo desenvolver um esqueleto extra sempre que se machucava, ocasionandno rigidez dos seus movimentos: a fibrodisplasia ossificante progressiva (FOP), doença genética ultrarrara que afeta uma a cada um milhão de pessoas no mundo.
“Eu era uma menina muito traquina, então, terminei o ensino médio sentada na carteira da escola, pois meu quadril já se encontrava totalmente ossificado”, conta Janaína, que aos 18 anos, foi submetida a uma cirurgia, o que gerou ainda mais complicações para sua qualidade de vida. “Dizia para o médico: ‘me dá uma roupa de espuma e me dá alta’”, brinca.
Por conta de toda a experiência com a doença, Janaína Kuhn se tornou presidente da Associação Brasileira de Fibrodisplasia Ossificante Progressiva (FOP Brasil) e membra do Comitê Internacional de Presidentes (IPC) do International Fibrodysplasia Ossificans Progressiva Association (IFOPA).
A médica Patrícia Delai, especialista em FOP, explica que os traumas e processos inflamatórios sofridos pelos músculos geram a morte da fibra e em seu lugar um osso na região. “É uma doença muito desafiadora, pois transforma as pessoas em verdadeiras estátuas”, diz. Somente em 2006, os pesquisadores descobriram o gene responsável pela FOP. Denominado de ALK2/ACVR1, o gene estimula a produção de uma proteína que interage com as chamadas proteínas morfogenéticas ósseas ou BMPs, resultando na formação das estruturas ósseas.
Por menor que seja, qualquer trauma, como injeções, viroses, machucados, procedimentos odontológicos, cirurgias e até fisioterapia tradicional, pode desencadear a formação de estruturas ósseas entre os tecidos moles e conjuntivos, como músculos, tendões e ligamentos, causando dores e limitações motoras para a pessoa com FOP. Por anos, o diagnóstico era clínico por meio da identificação da malformação dos dedos grandes dos pés virados para dentro e nódulos incomuns na cabeça, pescoço ou na parte superior das costas.5,6 “Os exames de imagem como raio x e tomografia também ajudam a confirmar a FOP, mas hoje já existe exame genético. O diagnóstico precoce é essencial para que seja iniciado um manejo adequado da pessoa. Em caso de suspeita, é mandatório suspender todos os procedimentos cirúrgicos, injeções e vacinas intramusculares, pois qualquer trauma no músculo pode desencadear a formação de um novo osso”, explica a médica.
São justamente os diversos traumas que definem a qualidade de vida das pessoas. “O diagnóstico não chegou a me assustar. A partir dele, comecei a investigar o que eu tinha e perceber que fazia tudo errado até os meus 22 anos, inclusive fisioterapia. Hoje me cuido. Estou dura, mas estou caminhando”, conta Janaina. Sua principal bandeira à frente da FOP Brasil é aumentar a conscientização sobre a doença, principalmente com profissionais de saúde para buscar reduzir o tempo até o diagnóstico e com isso dar o acompanhamento adequado para os pacientes. “Há um desconhecimento sobre a doença. Os médicos com quem consulto discutem comigo qual medicamento eu devo tomar, mas muitas pessoas ficam quietas diante dos médicos”, argumenta ela, que ainda tem a esperança de chegada de um tratamento específico para a doença.