
O CCBB Brasília apresenta, em seu Teatro I, a temporada da comédia dramática Modéstia, de 20 de abril a 13 de maio. A peça tem autoria do argentino Rafael Spregelburd, com direção de Pedro Brício, que também assina, junto com as atrizes Leticia Isnard e Isabel Cavalcanti, a tradução do texto. No elenco, Bel Garcia, Fernando Alves Pinto, Gilberto Gawronski e Isabel Cavalcanti, todos em papéis duplos.
A peça apresenta estórias paralelas: uma que se passa na Argentina contemporânea e a outra na Rússia ‘tchecoviana’, em guerra. Os atores se desdobram em dois papéis, ora interpretando o personagem de uma estória, ora de outra, num incessante abrir e fechar das portas no cenário. Aparentemente, as estórias não têm relação, mas aos poucos suas conexões, complementaridades e contradições, se revelam num brilhante jogo dialético.
A elaborada dramaturgia de Modéstia expõe uma consistente discussão sobre as fronteiras nos dias de hoje – fronteiras políticas, culturais e de linguagem. E versa também sobre as incertezas do mal, e sobre a modéstia como pecado: “Esse prazer soberbo e culposo de se sentir um pouco menos do que se é, com o objetivo íntimo, talvez, de pagar em cotas cômodas uma dívida infinita”, resume o autor.
A estória coloca em cena quatro personagens, no apartamento de um condomínio de classe média. Arturo (Gilberto Gawronski), Angeles (Isabel Cavalcanti), Maria Fernanda (Bel Garcia) e San Javier (Fernando Alves Pinto) se envolvem numa rede de confusão de identidades, de apartamentos, traição amorosa, obsessão com a imigração coreana e uma trama de suspense, a partir do desaparecimento de fitas cassetes.
A crise dos personagens é um espelho do caos social em que eles vivem. Já a estória que se passa na Rússia tem como tema a criação artística e a luta pela sobrevivência. Forçado pela esposa, Anja Terezovna (Isabel), Terzov (Fernando), um escritor turbeculoso tenta vender os direitos de um livro que não é seu. O comprador, Smeredovo (Gilberto), um médico imigrante, casado com Leandra (Bel), que troca o tratamento pelos direitos do livro. A trama fala sobre a crise do escritor, o valor da arte e a modéstia como pecado.
Inédito no Brasil, o texto faz parte de uma heptologia escrita por Spregelburd. Inspirado pela pintura A Roda dos Pecados Capitais, de Hieronymus Bosch, o autor decidiu escrever peças sobre o que para ele seriam os sete pecados contemporâneos. A primeira foi A Inapetência, seguida de A Extravagância (ambas de 1996); e A Modéstia (1999). Depois vieram A Estupidez; O Pânico’(2002); A Paranóia (2008); e A Teimosia (2009).
Segundo Pedro Brício, a vontade de montar esse texto vem da relevância e originalidade que a obra tem, além de uma enorme identificação com a linguagem do autor. “A pesquisa de uma dramaturgia atual, a valorização da palavra em cena e o uso de uma comicidade que dialoga com o drama, a poesia e o absurdo, são qualidades do texto de Rafael Spregelburg e também elementos fundamentais da minha pesquisa”, afirma do diretor.
Modéstia é uma obra contundente, de franca comunicação com o público. Desde a sua primeira montagem na Argentina, ganhou inúmeros prêmios de melhor texto, entre eles o Prêmio Teatro XXI (GETEA), Prêmio María Guerrero, Prêmio Trinidad Guevara, Prêmio Diario Clarín (1999), Prêmio Teatro del Mundo, Prêmio Florencio Sánchez (2000) e Prêmio Ciudad de Almagro, Espanha: melhor obra dramática, Festival de Teatro Contemporâneo (2005).