A escritora norte-americana Elizabeth Hardwick tem nome de bruxa. Ao compor Noites Insones, sua terceira publicação, parece ter tomado uma poção mágica que lhe deu a inspiração exata na hora de permear a ficção e a realidade de maneira fluida e imaginativa. O enredo nos move a todo momento para o passado e presente. Quase como uma novela, onde flashbacks se misturam às cenas do dia-a-dia. Num momento, a autora está em Kentucky, sua terra natal e onde passou a infância entre vales nevados, a natureza próxima e a vida pacata. No outro, se remete aos tempos áureos em Nova York, entre 1950 e 1970. Prostitutas, artistas desconhecidos e até Billie Holiday integram a lista de moradores vizinhos de um hotel no subúrbio onde morava com um amigo homossexual.
Elizabeth, que também dá este nome à protagonista do romance, diz que boa parte do livro “é inventada”, mas não deixa isso claro quando narra em primeira pessoa numa espécie de auto-retrato íntimo. Ela lembra de Alex, seu namorado que lhe ensinou a praticar sexo em vez de saboreá-lo, de sua amiga lésbica, a vizinha prostituta que morreu “de gripe”, e da mãe. Por muitas vezes, Elizabeth parece brincar com o leitor num jogo de esconde-esconde. Tenta mergulhá-lo numa história, quando na verdade se trata de sua história. E o contrário também acontece. Os críticos norte-americanos dizem que é exatamente aí que reside seu talento e seu charme: a construção de uma narrativa que ganha forma com fatos jornalísticos, absolutamente reais, como os últimos dias de vida de Billie Holiday e sua trajetória tumultuada com drogas e bebidas. Transportado para os tempos modernos, pode-se dizer que Noites Insones é o retrato de Alice (do País das Maravilhas) mergulhada nas agruras do cotidiano.