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Política & Poder

Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos) é alvo de denúncias e críticas

Arquivo Geral

26/11/2018 7h00

Atualizada 25/11/2018 22h21

Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília.

Francisco Dutra
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O projeto da Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos) é alvo de denúncias e críticas de especialistas e da comunidade. Pelo olhar técnico e popular, o texto é um prato cheio para a especulação imobiliária e crescimento urbano desordenado. No Lago Sul, por exemplo, a proposta transforma áreas institucionais, destinadas para educação, projetos sociais, culturais e lazer em terrenos comerciais, onde podem ser construídos até shoppings. Uma amostra disso é o lote D da QI 5, ao lado do Gilberto Salomão. É o que mostra a primeira reportagem de série sobre a Luos.

Para urbanistas, áreas institucionais possuem importância social. São instrumentos eficazes para fornecimento de serviços a comunidade, como saúde e educação. Por isso, merecem atenção do governo e da sociedade civil organizada . Atualmente a maioria das cidades brasileiras sofre com a falta delas. No DF, Águas Claras é um preocupante exemplo.

Segundo a Norma de Edificação, Uso e Gabarito (NGB) original do terreno, o lote no Setor de Habitações Individuais Sul tinha a finalidade de uso institucional ou como comunitário. Poderia ser usado para atividades educacionais, como escolas, bem como projetos culturais, sociais e de lazer. No entanto, na proposta da Luos em tramitação para votação na Câmara Legislativa, o governo planeja modificar o perfil do local para o uso comercial, na classificação CSII 2.

Na leitura do professor de arquitetura da Universidade de Brasília Frederico Flósculo, a transformação de lotes institucionais em comerciais é um dos graves pontos de risco. O movimento retira do horizonte a construção de serviços essenciais para a população, como escolas, para colocar o comércio ao alcance da especulação. E como o Lago é uma das áreas mais nobres do DF, não haverá limites para a cobiça imobiliária. O urbanista classifica a caso como inaceitável.

“O projeto urbanístico é um contrato. Você entra em um bairro sabendo que vai ter hospital, delegacia, escola, tudo isso você tem que ter. O problema é que você não pode começar o jogo sem conversar com a população. Você sabe aquele lote de escola? A gente vai começar a colocar comércio lá dentro. Você concorda? Ora, o governo tem que explicar porque esse comércio é vantajoso e porque a comunidade vai perder a escola. Isso não está acontecendo”, denuncia.

O mudança dos usos no Lago Sul é apenas um dos pontos gravíssimos na Luos, na avaliação de Flósculo. Junto a conselhos comunitários e associações de todo DF, Flósculo assina um documento público com o alerta: da forma como está, a Luos permite centenas de micro-operações de regularização imobiliária, pavimentando um “trem da alegria” imobiliário. Para o professor, a intenção do governo é transformar o Lago Sul em uma nova e rentável área de uso misto.

O especialista e moradores levaram o caso para a Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb), do Ministério Público do DF e Territórios. Antes de o projeto ir para o plenário de votação, urbanistas e conselhos comunitários brigam para incluir uma auditoria em todo texto, para revelar todos os detalhes das 702 páginas do projeto. Isso sem contar com as emendas dos distritais, que até agora totalizam 80 documentos adicionais.

Efeito dominó

O suposto descontrole da Luos não condena o DF apenas a ser vítima da avareza da especulação. Segundo Frederico Flósculo, lá na frente, a população ficará sem recursos hídricos, segurança, mobilidade e as obras de drenagem para evitar alagamentos. Na manhã desse domingo (25), urbanistas e lideranças comunitárias de todo DF fizeram uma reunião no Lago Norte para traçar um estratégia contra o risco do caos.

“Isso não é governo. É bagunça. A comunidade quer ordem, quer previsibilidade e qualidade de vida para todo mundo”, alfineta o professor. O grupo não pretende ficar de braços cruzados. “Essas pessoas estão preocupadas com a Luos de baixa qualidade. E mais ainda com o governo que está suprimindo cláusulas da lei de controle comunitário. A comunidade tem que ter o direito de dizer o seguinte: você não pode fazer esse centro comercial aqui, esse shopping de 20 andares”, defende o urbanista.

Documento comprova a finalidade original do terreno.

Outro lado

O secretário de Gestão do Território e Habitação, Thiago de Andrade, refuta plenamente que a Luos esteja preparando terreno para especulação. Segundo o secretário, o projeto tramitou com transparência pela Câmara e passou por mais de 90 reuniões de debate com a comunidade, sem contar a consulta pública pela internet. Para Andrade, sentaram-se à mesa todos os atores.

Questionado sobre o caso da QI 5, Andrade disse que o espírito da Luos é regularizar a cidade real, ressaltando que já existe atividade comercial no terreno. Também alegou que todo uso comercial permite o uso institucional. “Neste caso, não altera os potenciais de construção, ocupação e altura”, acrescentou. Segundo o secretário, a mudança está fundamentada com estudos técnicos dentro dos critérios urbanísticos.

Contudo, no olhar de especialistas e da comunidade, esta mudança é um chamariz para a especulação. Afinal, o terreno de uma escola é cobiçado para a construção de shopping. Mas, dificilmente, o shopping dará lugar para uma sala de aula.

Saiba Mais

Sobre as áreas residenciais, Thiago Andrade alega que em 2017 governo e comunidade chegaram à decisão de que não haverá mudança. Dessa forma, escritórios e outras atividades que existam hoje só terão licença para continuar apresentando farta documentação para comprovar a regularidade. Além disso, a comunidade pode solicitar o fechamento, respeitando um rito rigoroso.

 

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