ALEXA SALOMÃO E HELENA SCHUSTER
SÃO PAULO, SP E PELOTAS, RS (FOLHAPRESS)
O vice-presidente Geraldo Alckmin, no exercício da Presidência da República, vetou trechos da MP (medida provisória) do setor elétrico que tratam do cálculo de royalties do petróleo e da compensação aos produtores pelas perdas com cortes na produção de energia, com custo estimado de R$ 7 bilhões.
Os vetos, publicados no Diário Oficial da União desta terça-feira (25), haviam sido adiantados pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em entrevista ao programa Roda Vida, da TV Cultura, na noite de segunda (24).
A Folha de S.Paulo obteve, antes da publicação oficial, uma lista com 13 itens principais vetados pelo governo (veja abaixo).
Durante o programa, o ministro justificou alguns dos vetos da presidência, como o que retirou o trecho que revisava o preço de referência do barril de petróleo usado no cálculo dos royalties. Segundo Silveira, o texto foi barrado para preservar projetos da Petrobras. “Nós resolvemos manter o pulso firme para que a Petrobras continue com seu papel e seu plano de investimentos”, disse.
O governo federal enfrentou uma disputa interna sobre essas mudanças, que foram incluídas na MP pelo senador Eduardo Braga (MDB-AL).
Os royalties são valores pagos ao governo por empresas que fazem a extração do óleo. No Brasil, são distribuídos entre União, estados e municípios, com o objetivo de compensar a sociedade pela utilização do bem público, financiar investimentos em áreas como educação e saúde, e mitigar os impactos ambientais da exploração.
Hoje, o valor é calculado mensalmente pela ANP (Agência Nacional do Petróleo), e vigora uma espécie de tabela que, na prática, acaba deixando o valor do barril abaixo do preço de mercado. O texto vetado previa que o número teria como base uma média de cotações produzidas por agências internacionais de preços.
De um lado, auxiliares do presidente defendiam a medida visando melhorar a arrecadação e fortalecer as contas públicas, com estimativa de aumento de cerca de R$ 4 bilhões a partir de 2026, como revelou a Folha de S.Paulo.
A mudança, porém, poderia afetar o plano de investimentos da Petrobras. Os defensores do veto argumentaram que a mudança afetaria o fluxo de caixa operacional da empresa e o repasse de dividendos e impostos ao governo federal.
COMPENSAÇÃO
Silveira também confirmou o veto à emenda incluída de última hora pelo deputado Danilo Fortes (União-CE) na MP, que previa o repasse do ressarcimento a usinas eólicas e solares prejudicadas pelo “curtailment” (termo em inglês para corte de geração de energia) para a tarifa de energia.
O corte de geração é determinado pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) a certas unidades quando fica identificada a necessidade de redução da geração de energia em determinadas circunstâncias por questões de segurança da rede. Há diferentes motivos para os cortes, como condições meteorológicas extremas, além de atrasos e problemas de capacidade em linhas de transmissão.
Segundo a Abrace, entidade que representa empresas que são grandes consumidoras de energia, essa era a despesa mais alta da MP. O texto determinava o pagamento dos prejuízos de setembro de 2023 a dezembro de 2025, o que poderia aumentar em R$ 7 bilhões a conta de luz dos consumidores.
O governo federal já havia avisado a parlamentares neste mês que barraria o trecho. Foi mantida, no entanto, a garantia de que as empresas produtoras serão pagas se tiverem que cortar a produção por problemas técnicos na rede.
A Abrace celebrou a confirmação dos vetos, afirmando em nota que eles “representam preocupação com custo da energia e podem sinalizar início de ciclo de melhorias para o setor”.
Já a Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica) criticou a retirada do artigo. Para a entidade, a medida “representa grave risco aos projetos existentes e pode levar à perda de credibilidade, fuga de capital, fechamento de empresas, perda de empregos e retrocesso na transição energética”.
Durante a entrevista, Silveira também justificou a manutenção do trecho que prorroga a compra de energia de usinas a carvão até 2040. “Ainda precisamos dessas fontes energéticas para dar segurança ao sistema”, disse Silveira em resposta a pergunta feita pela Folha de S.Paulo.
A Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) manifestou preocupação com a prorrogação da geração de energia a carvão. Segundo a entidade, o trecho “representa um custo superior a R$ 1 bilhão por ano até 2040 e configura um retrocesso ambiental relevante”.
Silveira defendeu na segunda-feira (24) o resultado final da MP, afirmando que, após os vetos, o governo “chegou ao equilíbrio do setor elétrico”.
VEJA A LISTA COM OS PRINCIPAIS VETOS DO GOVERNO
- Curtailment: Foi rejeitada regra de compensação pelas perdas com cortes de energia. No entanto, o veto manteve a garantia de que as empresas produtoras serão pagas se tiverem que cortar a produção por problemas técnicos na rede.
- Leilão de baterias: Foi vetada a regra que forçava apenas quem produz energia a pagar pelos grandes sistemas de armazenamento.
- Regras de concorrência: Foi retirado o trecho que tornava obrigatório que os processos de concorrência do setor elétrico seguissem estritamente as diretrizes do planejamento do setor.
- Divisão de Prejuízo: O governo rejeitou um mecanismo que forçaria os produtores de energia a dividir entre si parte dos custos de quando há cortes de energia. O tema foi adiado para ser discutido depois, incluindo as regras de micro e minigeração distribuída.
- Taxas para o comércio de energia: Foi barrada a obrigação das empresas que comercializam energia (mas não a produzem) de pagar por pesquisa e eficiência energética.
- Micro e minigeração distribuída: Foi vetada a inclusão de novos custos da micro e minigeração distribuída (estimados em R$ 5 bilhões) na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
- Leilões isolados: Veto mantém que a realização de leilões para locais que não estão conectados à rede principal de energia seja definida pelo planejamento do setor. Também evitou uma regra específica que atribuía responsabilidade à distribuidora do Amazonas.
- Migração de grandes geradoras: Veto impede que usinas de energia que já operam no mercado livre migrem para o sistema de geração distribuída (onde as regras são diferentes).
- Punição para servidores: Foi vetada a regra que tornaria a omissão ou a falta de contratação de serviços essenciais de energia um ato de improbidade administrativa para o servidor público.
- Custo da TV na conta de luz: Foi rejeitada a regra que permitiria a utilização de recursos do programa Luz para Todos para equipamentos de recepção de sinal de televisão aberta (“banda Ku”).
- Linha de Transmissão RO-AM: Foi retirada a obrigação de licitar de forma imediata o sistema de transmissão que ligaria Porto Velho (RO) a Manaus (AM). O veto mantém que o planejamento do setor defina as melhores alternativas para essa ligação.
- Leilões anuais: Foi vetada a regra que obrigava a realização de leilões de potência para garantir energia extra todos os anos. Agora, o governo decide quando fazer esses leilões.
- Preço do petróleo: Foi vetada uma regra que revisava o preço de referência do barril de petróleo usado no cálculo dos royalties. O governo justificou o veto afirmando que a redefinição da base de cálculo geraria “insegurança jurídica e risco de judicialização, bem como comprometeria investimentos de longo prazo em curso no setor de óleo e gás”.