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Política & Poder

Bolsonaro ironiza adversários e tenta reeditar estratégia bem-sucedida de 2018

O presidente Jair Bolsonaro (PL) reforçou o tom de “lacrador” nas redes sociais com a proximidade das eleições em outubro

FolhaPress

17/06/2022 6h48

Foto: Evaristo Sá/ AFP

Thaísa Oliveira e Marianna Holanda
Brasília, DF

Deboches com a saída de João Doria (PSDB) da corrida presidencial, emojis de gargalhadas para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e respostas irônicas à cantora Anitta. O presidente Jair Bolsonaro (PL) reforçou o tom de “lacrador” nas redes sociais com a proximidade das eleições em outubro.

O termo lacrar ganhou popularidade na internet e virou sinônimo de arrasar, sair-se muito bem em algo —tão bem a ponto de deixar alguém sem argumentos e encerrar o assunto.

A estratégia, segundo integrantes da campanha, busca aproximar o mandatário dos jovens, uma parcela do eleitorado em que ele precisa melhorar seu desempenho. Segundo Pedro Bruzzi, sócio da consultoria de análise de mídias sociais Arquimedes, o método é similar ao de 2018, quando Bolsonaro usou as redes para criar a imagem de “mito”.

Levantamento feito pela empresa a pedido da Folha indica que a estratégia tem mostrado resultados em termos de engajamento: dos 20 posts com mais interações no perfil do presidente no Twitter neste ano, 12 são com conteúdos “troll” —uma espécie de provocação—, como as respostas a Anitta e ao ator Leonardo DiCaprio.

Em outro tuíte mais recente, desta quinta-feira (16), Bolsonaro elogiou o mais recente filme de ação de Tom Cruise, “Top Gun Maverick”, e comparou os personagens à Força Aérea Brasileira. Depois, postou uma montagem de uma motociata em que o protagonista do filme aparece ao seu lado.

Em outro, Bolsonaro fez piada com o Dia dos Namorados. “Presidente Bolsonaro decreta, nessa quarta-feira, que todo solteiro, por decreto, terá uma namorada”, compartilhou, junto com a risada “kkkkk” e a mensagem “Obs: sátira”.

Os dados também mostram que o número de publicações no Twitter mais que dobrou em maio, na comparação com janeiro. Passou de 144 para 301, segundo a Arquimedes. Mais ativo na internet, o presidente viu a média de interações nesse período aumentar 18%.

Um dos tuítes com mais engajamento foi justamente em reação à desistência de Doria, ex-governador de São Paulo. Poucas horas depois do anúncio do tucano, Bolsonaro escreveu: “Comunico que estou abrindo mão da disputa do cinturão dos pesos médios no UFC. Boa tarde a todos!”.

As redes sociais do mandatário são comandadas pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos), autor da estratégia digital que ajudou a eleger o pai há quatro anos. Além dele, apenas assessores mais próximos, do chamado “Gabinete do Ódio”, têm ingerência sobre o que Bolsonaro compartilha nas redes.

Nas conversas sobre estratégia, há o entendimento de que o presidente lucra mais politicamente quando é lacrador do que quando adota postura mais autoritária ou hostil na internet.

A pecha de irritadiço e agressivo é justamente uma que os integrantes da campanha tentam tirar do presidente, que está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto. No mais recente levantamento do Datafolha, Lula desponta com vantagem de 21 pontos sobre Bolsonaro —o petista pontua com 48%, ante 27% do mandatário.

A diferença é ainda maior entre jovens de 16 a 24 anos, fatia em que Lula lidera com 58% das intenções de voto contra 21% do presidente. Por isso, o foco na estratégia digital para atrair esse eleitorado.

Especialistas apontam ainda outros motivos para a estratégia digital do presidente: ela mantém a militância bolsonarista ativa e dá visibilidade para os temas que ele seleciona —e não para assuntos incômodos para Bolsonaro, como o aumento dos preços dos combustíveis e o avanço da inflação sobre alimentos.

“O presidente pauta o debate público, tanto na imprensa como nas redes sociais, com temas que não a crise econômica, escapando sobretudo de falar sobre o aumento de preços dos combustíveis e alimentos”, diz Bruzzi. “Resta a Bolsonaro lacrar, ser antissistema, antiprotocolos, contra tudo isso daí.”

Para a doutora em ciência política e coordenadora do Observatório da Abrapel (Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais), Érica Anita Baptista, além de abastecer a militância, o tom debochado do presidente tenta atrair de volta eleitores que votaram nele e se arrependeram.

“Essa ironia vem para reforçar um conjunto de características dele que ficaram marcadas em 2018. Elas o afastam da política tradicional que ele tanto critica, constroem a imagem de homem do povo e reforçam o ‘nós contra eles’, a figura antissistema”, afirma.

David Nemer, pesquisador da Universidade Harvard e professor associado na Universidade de Virgínia, também vê paralelo com a estratégia das últimas eleições.

“Em 2018, Bolsonaro contou com uma rede de páginas e contas que faziam essa zoeira. É uma forma de humanizá-lo e também de engajar com o público mais jovem. Apesar de ele nunca ter saído do modo campanha, isso está sendo intensificado.”

Carlos Bolsonaro escancarou recentemente suas divergências com a estratégia de marketing do centrão —tida como mais profissional— ao se queixar do slogan da primeira inserção do PL na TV, que teve seu pai como protagonista. “Vou continuar fazendo o meu aqui e dane-se esse papo de profissionais do marketing…. Meu Deus!”, escreveu o vereador no Twitter.

No mundo artístico, a cantora Anitta já havia dado seus palpites sobre as estratégias de Bolsonaro nas redes sociais. Crítica do presidente, ela foi alvo de provocações dele e, em vez de respondê-lo, decidiu bloqueá-lo.

Segundo Anitta, a estratégia de Bolsonaro é ganhar relevância e repercussão no Twitter às custas do perfil dela, que tem mais que o dobro de seguidores. Atualmente, 8,2 milhões de usuários acompanham a página oficial do presidente no Twitter. Já a cantora tem 17,2 milhões de seguidores.

Parte do engajamento, dizem especialistas, vem com a ajuda involuntária dos críticos. “Quando ele debocha de um adversário, ele mexe com as emoções dos oponentes. O post acaba sendo compartilhado ou xingado por pessoas que não gostam dele”, explica a pesquisadora em democracia digital Maria Carolina Lopes.

Um exemplo disso, de acordo com ela, foi a montagem com o debate virtual entre o presidenciável Ciro Gomes (PDT) e o humorista Gregorio Duvivier. Os dois bateram boca e, entre outras coisas, o pedetista afirmou que Lula não foi inocentado nos processos da Lava Jato.

Bolsonaro usou um meme [no caso uma montagem] em que ele aparece assistindo TV e insinuou que também estava acompanhando a discussão. A imagem original viralizou em 2020 quando, na verdade, ele acompanhava um pronunciamento do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump.

“Petistas ficaram com raiva pelo fato de o Ciro estar se prestando ao papel de dar palanque para Bolsonaro. Eleitores do Ciro ficaram com raiva do Bolsonaro estar usando isso como palanque. Bolsonaristas aplaudiram e falaram: ‘Olha como meu presidente está debochando da esquerda’, ‘olha como a esquerda está fragmentada’”, diz a pesquisadora.

Para ela, isso mexe com as emoções de quem não gosta do presidente. “Quando a gente fala de furar a bolha, a gente está falando de visibilidade. Eles sabem operar isso bem. Há um espalhamento geral”.

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