Menu
Mundo

Putin finaliza anexação na Ucrânia mesmo perdendo terreno para Kiev

As explosões, na semana passada, causaram um grande vazamento de gás no mar Báltico, por onde o sistema ligando Rússia e Alemanha passa

FolhaPress

05/10/2022 16h29

Foto: Reprodução

Igor Gielow
São Paulo, SP

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, finalizou nesta quarta (5) a sanção das leis regulando a anexação do equivalente a cerca de 18% da Ucrânia, a maior tomada territorial à força na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. Moscou já havia anexado a Crimeia, 4,5% do vizinho, sem conflito em 2014

O Kremlin, contudo, continuou sem definir exatamente de quais fronteiras estão previstas na absorção denunciada como ilegal no exterior. O motivo são os avanços de Kiev nas regiões de Donetsk (leste) e Kherson (sul). Mas manteve o tom desafiador.

“Por favor, leia o decreto [presidencial que foi convertido em lei e, depois, sancionado pelo próprio Putin]. No geral, claro, ele se aplica ao território onde a administração civil-militar estava operando no momento do acesso [à Rússia]. Eu repito: alguns territórios serão retomados e nós vamos continuar a consultar a população que deseja viver na Rússia”, disse o porta-voz Dmitri Peskov.

Em uma conversa televisionada com professores, Putin sugeriu que o cenário militar não é bom. “Estamos trabalhando assumindo que a situação nos territórios irá se estabilizar.”

Apesar do apelo do porta-voz, os textos dos quatro decretos assinados por Putin na sexta (30) nada têm de claros. Supõe-se que, no caso de Donestk e Lugansk, o chamado Donbass (bacia do rio Don), que as fronteira sejam aquelas estabelecidas em 2014 pelas autoproclamadas repúblicas populares que agora Moscou anexou.

Nesse caso, é a fronteira legal dos oblasts (regiões, na complexa divisão territorial da antiga União Soviética ainda válida) ucranianos de Lugansk e Donetsk. Hoje, a Rússia ocupa quase todo o primeiro, onde Kiev tem atacado, e cerca de 60% do segundo. Assim, Peskov volta ao ponto que havia citado na semana passada: que a guerra tem como objetivo atual no mínimo acabar de capturar aquela área.

Mas a coisa fica mais nebulosa ao tratar de Kherson e Zaporíjia. Na primeira área sulista, o controle russo era quase total, mas há infiltrações blindadas ucranianas e a capital homônima está em uma posição bastante exposta, com o rio Dnieper às suas costas.

Resta saber se Kiev vai querer aplicar um cerco à população civil lá presente ou mesmo se os russos vão recuar para pontos mais defensáveis, usando o rio como fronteira. Em Zaporíjia, o norte da região nunca chegou a ser conquistado por Moscou e, nesta quarta, Putin ordenou que a maior usina nuclear da Europa, que fica na área ocupada, seja assumida pela estatal russa Rosatom.

“Não há contradição. Eles [os territórios] serão da Rússia para sempre”, sustenta Peskov, parecendo dourar a pílula da situação no campo. Legalmente, Moscou está infringindo o Memorando de Budapeste, um acordo em que reconhecia as fronteiras da antiga Ucrânia soviética, assinado em 1994.

Falando no seu canal do Telegram sobre Kherson, o famoso blogueiro militar Roman Saponkov, que acompanha as forças russas, foi cândido: “Não sei o que dizer. A retirada do norte no lado direito do rio é um desastre”.

A Rússia parece estar ganhando tempo para que sua criticada mobilização, atacada até por propagandistas do governo, surta algum efeito. Concorre para esta tese a ameaça nada velada de Moscou de usar armas nucleares para defender seu novo território: analistas veem chance de ser só um blefe, ainda que a Ucrânia tema ação real.

O Ministério da Defesa diz já ter alistado 200 mil dos 300 mil reservistas que deseja para combate, e que alguns poderão estar em ação já em novembro.

As ações russas foram chamadas pelo chefe do gabinete presidencial de Kiev, Andrii Iermak, de “hospício coletivo” e atos “de um país terrorista”. Estados Unidos e União Europeia as condenaram e elaboraram novas sanções econômicas contra Moscou.

A China, principal aliada de Putin, nunca condenou a invasão e se absteve da sessão do Conselho de Segurança da ONU que discutiria o caso, obstruída pelo poder de veto do Kremlin. Outros membros sem tal prerrogativa, como Índia e Brasil, também se abstiveram para insistir na neutralidade em favor de vantagens econômicas.

No Ocidente, cresce a preocupação com guerra energética. A Casa Branca criticou a decisão da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados de grande corte de produção de óleo, que segundo os EUA foi um favor feito à Rússia, próxima da Arábia Saudita no grupo.

Segundo o governo da Dinamarca, a gigante estatal Gazprom começou a desviar gás enviado para países europeus por meio dos dutos que passam pela Ucrânia, indicando que pode haver um corte brutal no inverno.

Cerca de 30% da matriz energética europeia é composta de gás natural, e em 2021 40% disso era russo. Para complicar, o ataque ao sistema Nord Stream, que já estava praticamente inoperante no ramal 1 e nunca chegou a funcionar no 2, deixou apenas 1 dos 4 gasodutos em condições de funcionar -na hipótese de a Europa ceder e pedir gás a Putin, o que só deve acontecer se reduzirem o apoio militar a Kiev.

As explosões, na semana passada, causaram um grande vazamento de gás no mar Báltico, por onde o sistema ligando Rússia e Alemanha passa. Moscou insiste que foi vítima de algum Estado rival, e a Europa só faltou dizer o nome de Putin como culpado. Mas as tensões foram um pouco reduzidas, e agora há negociações acerca de como será feita a investigação do episódio.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado