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Putin diz que Ocidente quer destruir Rússia e faz desfile enxuto no Dia da Vitória

Comemorado nesta terça-feira (9) na Rússia, o Dia da Vitória, que celebra o êxito dos Aliados contra a Alemanha nazista em 1945

FolhaPress

09/05/2023 19h55

Foto: AFP

São Paulo, SP

Comemorado nesta terça-feira (9) na Rússia, o Dia da Vitória, que celebra o êxito dos Aliados contra a Alemanha nazista em 1945, vinha sendo festejado com cada vez mais pompa por Vladimir Putin desde que ele assumiu o poder, mais de 20 anos atrás.

Mas sua segunda edição sob a sombra da Guerra da Ucrânia espelhou as dificuldades que seu governo enfrenta na frente de batalha às vésperas de uma aguardada contraofensiva ucraniana. O momento ainda é cercado de incertezas acerca da capacidade militar russa após um suposto ataque de drone ao Kremlin na semana passada -Moscou acusa Kiev pela ofensiva, que nega a autoria do atentado.

O temor de ataques levou ao menos 20 cidades russas a cancelar ou diminuir eventos relacionados à data, sob alegação de não chamar a atenção de inimigos ao concentrar tropas e equipamentos militares.

Desfiles tradicionais em que a população exibe retratos de parentes que lutaram contra os nazistas também foram suspensos.

Mesmo o desfile em Moscou, antes usado por Putin como uma demonstração de sua força militar, foi reduzido, de acordo com o cálculo do analista independente Oliver Alexander, reproduzido pelo jornal The Washington Post. Segundo ele, apenas 50 veículos foram exibidos na parada de 45 minutos, contra 131 em 2022 -o número ultrapassava os 200 em anos anteriores. Além disso, só um tanque integrou o desfile, um T-34 da Segunda Guerra, e o tradicional desfile aéreo foi cancelado pelo segundo ano consecutivo.

Sem novas conquistas militares para anunciar, Putin voltou a atacar o Ocidente em seu discurso na praça Vermelha, que contou com a presença de representantes de aliados russos como Tadjiquistão, Cazaquistão, Quirguistão, Uzbequistão, Turcomenistão, Armênia e Belarus. “Uma verdadeira guerra foi mais uma vez desencadeada contra nossa pátria. Hoje, a civilização está num ponto de inflexão”, afirmou ele, responsabilizando os “globalistas e elite ocidentais”.

“O objetivo deles, e não há nada de novo aqui, é obter o colapso e a destruição de nosso país”, prosseguiu Putin no pronunciamento de cerca de dez minutos, antes de dizer que a Ucrânia havia se tornado refém de um golpe de Estado e “uma peça de barganha” para americanos e europeus.

Putin já havia feito declarações semelhantes em ocasiões anteriores. Em março de 2022, dias antes de a invasão à Ucrânia completar um mês, ele acusou o Ocidente de tentar “cancelar a Rússia” -uma de suas justificativas para a guerra é que ela representa sobretudo uma reação à expansão das fronteiras da Otan, a aliança militar ocidental.

Ao longo de 2022, com o apoio dos Estados Unidos e da Europa ao governo de Volodimir Zelenski surtindo efeito, Putin reforçou a retórica e passou a retratar o conflito como uma luta existencial de Moscou contra o Ocidente. A visão foi inclusive adicionada à doutrina oficial de política externa este ano, um documento de mais de 40 páginas formulado sob a liderança do decano chanceler Serguei Lavrov.

O pronunciamento de Putin no desfile do Dia da Vitória ainda foi marcado por uma tentativa de incentivar o Exército. Dirigindo-se a uma plateia de soldados e veteranos, ele usou o feriado como gancho para traçar paralelos entre os desafios enfrentados pelos russos no conflito hoje e aqueles com que as tropas soviéticas lidaram na Segunda Guerra Mundial -40% do total de 70 milhões de mortes no conflito foi de soldados do Estado comunista.

“Batalhas decisivas pelo destino de nossa pátria-mãe sempre se tornaram sagradas. Nada é mais importante do que a missão de vocês. Cumpram-na com honra, lutem pela Rússia”, acrescentou Putin.

O tom encorajador foi de certa forma abalado por um vídeo divulgado pelo fundador do mercenário Grupo Wagner, Ievguêni Prigojin, pouco depois do desfile oficial. Nele, o empresário conhecido como “chef de Putin” por já ter comandado os serviços de alimentação do Kremlin não economiza nos palavrões ao se queixar da falta de envio de munições e armamentos para suas tropas em Bakhmut, no leste da Ucrânia.

A cidade se tornou uma das principais da guerra nos últimos meses, sendo apelidada de “moedor de carne”. Prigojin havia ensaiado deixar o combate na semana passada, mas, no vídeo divulgado nesta terça, disse que o governo ameaçou acusar tropas de traição à pátria caso a decisão fosse levada a cabo.

O Dia da Vitória não interrompeu, aliás, os enfrentamentos no local. A agência de notícias AFP relatou que um de seus funcionários, o coordenador do departamento de vídeo Arman Soldin, foi morto por um foguete em Tchasiv Iar, perto do limite com Bakhmut.

Zelenski também destacou o impasse entre as tropas de seu país e os mercenários na cidade. A Rússia havia estabelecido o Dia da Vitória como prazo final para a conquista da cidade -Moscou acredita que ela tem peso estratégico na conquista de Donetsk, uma das regiões que anexou ilegalmente no ano passado.

Zelenski passou a data ao lado da presidente da Comissão Europeia, a alemã Ursula von der Leyen, em Kiev. Ele anunciou que a Ucrânia passaria a comemorar o Dia da Vitória em 8 de maio, data oficial da rendição nazista -tanto a Rússia quanto ex-repúblicas comunistas o comemoram em 9 de maio porque já passava da meia-noite quando a União Soviética recebeu a notícia da vitória.

Assim, o 9 de maio passa a ter um novo significado para os ucranianos: será usado para comemorar o Dia da Europa, marco do início da integração dos países do continente que resultou na fundação da União Europeia.

O simbolismo da ruptura com a Rússia e da aproximação com a Europa foi saudada por Von der Leyen. “Kiev é o coração dos valores europeus atuais. A Ucrânia luta corajosamente pelos ideais da Europa que celebramos hoje”, disse ela ao lado de Zelenski em encontro com a imprensa. Ela não deu, contudo, nenhuma indicativa de que o objetivo da Ucrânia, entrar no bloco, esteja mais próximo.

A nação invadida foi, aliás, alvo de um novo ataque de mísseis russo na madrugada da terça-feira. A informação, anunciada a princípio por Kiev -que diz ter derrubado 23 dos 25 mísseis de cruzeiro disparados-, foi confirmado pelo Ministério da Defesa russo, segundo o qual a ação interrompeu o suprimento de munições para a linha de frente ucraniana.

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