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Lockdown é um erro político, diz autora de ‘Precisamos Falar sobre o Kevin’

“Eu me preocupo de termos criado uma semi-permanente neurose em torno da doença”

Redação Jornal de Brasília

21/04/2021 12h55

Foto: Divulgação

Marina Dias
Washington-EUA

Lionel Shriver se preparava para jogar fora o rascunho de um novo livro quando o Reino Unido declarou seu primeiro lockdown para conter o coronavírus. Era março de 2020, e a escritora best-seller americana, que hoje vive em Londres, viu na obrigação de ficar em casa a maneira mais eficaz de escrever “Should We Stay or Should We Go”, deveríamos ficar ou ir, em português, com lançamento previsto para junho.

“Medo e ansiedade têm alguma energia dentro deles e, muitas vezes, canalizo essas emoções no meu trabalho. Raiva e desgosto também”, afirma Shriver.
A longa duração do confinamento e a piora nos números de casos e mortes ao redor do mundo, porém, mudaram seu humor e sua percepção.

“Mas a desesperança é mortal. Desespero, temor, essa falta de fé no futuro. Nesse último período, essas emoções mais inertes e sem vida dominaram meu comportamento, e eu me tornei muito menos produtiva.”

Em março, Shriver lançou no Brasil “A Família Mandible: 2029 – 2047”, pela Intrínseca, escrito justamente com essa motivação do medo, ainda sob o temor da crise do sistema financeiro internacional de 2008.

O romance foi publicado pela primeira vez há cinco anos, mas a escritora avalia que sua chegada este ano ao Brasil é “muito oportuna.”
A história conta a luta de um clã americano para sobreviver em meio ao colapso de uma nova ordem global, em que os tempos áureos dos Estados Unidos acabaram, o dólar não vale mais nada, os jornais pararam de circular e há guerra por comida e água limpa.
Para Shriver, a pandemia aumentou –e muito– as chances dessas calamidades se tornarem reais.

“Escrevi esse romance depois do susto que tive com a crise de 2008”, diz. “Em 2021, o enredo tem maior probabilidade de se tornar vida real.”
“Estou apavorada com o tipo de colapso fiscal mundial que poderemos ver nos próximos anos. Posicionei meu colapso ficcional em 2029, mas ele pode acabar virando só um atraso por engano.”

Formada e pós-graduada pela Universidade de Columbia, uma das mais prestigiosas instituições americanas, Shriver diz que pesquisou muito sobre economia antes de escrever “A Família Mandible” e se assustou com o que aprendeu. “Percebi o quão facilmente minha vida e as das pessoas com quem me importo poderiam virar o inferno se estes abstratos sistemas que a maioria de nós nem entende entrassem em colapso.”
Agora, porém, a escritora diz que está muito mais ansiosa do que em 2008, e não vê o fim da crise tão perto.

“Quero enfatizar os perigos de tantos países confeccionando grandes quantidades de moeda de uma vez, como resultado do sufocamento de suas economias, e levando potencialmente ao tipo de instabilidade econômica e colapso que descrevo em ‘A Família Mandible’.”

Aos 64 anos, Shriver é também autora dos best-sellers “Precisamos Falar sobre o Kevin”, de 2007 -vencedor do Prêmio Orange- e “O Mundo Pós-Aniversário, de 2009, e já trabalhou como jornalista, com contribuições para veículos como The Guardian, The Wall Street Journal, The Economist.

O hábito de ser uma consumidora voraz de notícia não mudou com a pandemia. “Faço flexões e abdominais em frente à TV, geralmente depois das 23h, quando paro de trabalhar.” Mas a temática que a dragou nos últimos meses foi uma só: o lockdown.
A medida é efetiva para conter o avanço do coronavírus, segundo autoridades de saúde, mas Shriver diz ser contrária ao confinamento.

“Minha posição sobre lockdown não é política”, diz. “Mas o considero o maior erro político que já vi na minha vida.” A escritora afirma defender a vacinação –e já tomou a primeira dose do imunizante da AstraZeneca– mas teme que os países, vez ou outra, lancem mão do lockdown para aplacar o avanço de novas crises.

“Eu me preocupo de termos criado uma semi-permanente neurose em torno da doença.”
Com lockdown desde o início do ano, somado ao avanço da vacinação, o número de casos, mortes e hospitalizações por Covid-19 no Reino Unido despencaram, e Londres –a cidade onde vive Shriver– teve dias sem registrar uma única morte pela doença.

As informações são da Folhapress

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