As negociações para formar uma coalizão de governo aconteceram nesta segunda-feira (30) na Áustria, um dia depois da vitória histórica do partido de extrema direita FPÖ, cujo líder Herbert Kickl não tem garantias de assumir o país.
“Vencedor, e agora?”, disse a manchete do jornal Kurier, referindo-se ao fato de ninguém querer aliar-se a este político de 55 anos, considerado muito radical, com uma agenda antiliberal e antieuropeia, e que se opõe às sanções contra a Rússia.
Será que sofrerá o mesmo destino de Geert Wilders nos Países Baixos, que teve que desistir das suas ambições como primeiro-ministro, ou do partido francês Reagrupamento Nacional (RN), marginalizado pela frente republicana?
“Os tempos mudam”, sublinhou Wilders após o anúncio dos resultados, citando onze países europeus onde os nacionalistas estão em ascensão.
Na Hungria, o líder Viktor Orban saudou esta “nova vitória dos patriotas”. Na Itália, o líder do partido de extrema direita Liga Norte, Matteo Salvini, falou de um “dia histórico para a mudança”, enquanto na França o líder de extrema direita Marine Le Pen celebrou uma “maré crescente”.
Ao obter 28,8% dos votos, superando os conservadores, Kickl conseguiu um resultado ainda melhor que seus antecessores, Jörg Haider e Heinz Christian Strache.
Desta vez ainda não ocorreram grandes manifestações. “Nós esperávamos isso. Não estamos chocados nem felizes”, disse Isabella, uma mulher vienense de cerca de 50 anos, que não quis revelar o sobrenome.
No entanto, um primeiro protesto foi marcado para quinta-feira (3).
– Atmosfera revolucionária –
A atmosfera é “revolucionária”, escreveu o jornal Kronen Zeitung, o tablóide mais influente do país. Mas “o jogo de pôquer que começa será difícil, longo e turbulento”, explicou.
As negociações para formar um governo costumam durar em média 62 dias neste país, que atingiram um recorde de 124 dias em 1999-2000.
A bola está agora nas mãos do presidente da Áustria, Alexander van der Bellen, procedente dos ambientalistas.
“A tradição diz que o mandato [para formar governo] deve ser dado ao partido que chegou primeiro”, lembra Andreas Eisl, pesquisador do instituto Jacques Delors.
Sem esconder as suas reservas a Kickl, alertaram que o governo deve ter o apoio de uma maioria de 92 deputados, e não impor em causa nem os fundamentos da democracia nem os compromissos do país no exterior.
Confiar negociações ao FPÖ seria simbolicamente significativo. Seria a primeira vez desde 1945 para este partido fundado por ex-nazistas e liderado por um homem que quer ser chamado de Volkskanzler, o “chanceler do povo”, como Hitler.
Mas o chefe de Estado também tem o poder de confiar na tarefa dos conservadores do ÖVP (26,3%), apesar de terem registado a pior derrota da sua história.
“É um verdadeiro desafio”, comentou Eisl. Se o presidente decidir entregar o mandato aos conservadores, isso daria origem à narrativa promovida por Kickl, que já reclama de uma “negação da democracia”.
Nesse caso, o chanceler em fim de mandato, Karl Nehammer, tomou as decisões e analisou a possibilidade de chegar a um acordo com o FPÖ, como em 2000 e 2017.
Os escândalos recorrentes atingiram os conservadores cautelosos e, ao contrário do seu mentor Haider em 2000, Kickl não parece ter qualquer intenção de se retirar, segundo o especialista.
Pelo contrário, aposta em uma “coalizão tripartida” com os sociais-democratas do SPÖ (21,1%) e o pequeno partido liberal Neos (9,2%), uma fórmula inédita.
“Entre o ÖVP e o SPÖ, as diferenças são grandes”, sublinhou Johannes Reiter, um aposentado de 74 anos. “Eles terão que encontrar um terreno comum, mas não chegarão lá”, acredita.
Nesta segunda-feira, o chefe do SPÖ, Andreas Babler, líder de um partido enfraquecido e dividido, estava “preocupado com a guinada para a direita”.
“Estendemos a mão para as negociações e estamos interessados” a conversar, acrescentou.
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