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Economia

Governo Lula bloqueia R$ 2,9 bi do Orçamento e mantém déficit dentro da meta fiscal

Os números do governo mostram uma perspectiva mais otimista do que a do mercado financeiro, que espera um déficit de 0,75% do PIB para este ano

Redação Jornal de Brasília

22/03/2024 11h08

Foto: Evaristo Sá/AFP

IDIANA TOMAZELLI E ADRIANA FERNANDES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou nesta sexta-feira (22) um bloqueio de R$ 2,9 bilhões nas despesas do Orçamento de 2024 para evitar um estouro no limite de despesas previsto no novo arcabouço fiscal.

Por outro lado, o desempenho da arrecadação permitiu ao Executivo apresentar o primeiro relatório bimestral com um resultado primário dentro da meta fiscal, que tem como alvo central o déficit zero, mas permite uma flutuação até 0,25% do PIB (Produto Interno Bruto) para mais ou menos.

As estimativas oficiais indicam um déficit de R$ 9,3 bilhões, o equivalente a -0,1% do PIB. Embora pior do que o superávit de R$ 9,1 bilhões aprovado no Orçamento, o resultado segue dentro do intervalo de tolerância da meta.

Os números do governo mostram uma perspectiva mais otimista do que a do mercado financeiro, que espera um déficit de 0,75% do PIB para este ano, diante de uma expectativa de arrecadação menor.

A necessidade de congelar cerca de R$ 3 bilhões para cumprir as regras do novo arcabouço foi antecipada pela Folha de S.Paulo. O cenário inicial era de um bloqueio entre R$ 5 bilhões a R$ 15 bilhões, mas a economia de recursos com a revisão de gastos do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) gerou um fôlego um pouco maior do que vinha sendo esperado.

Mesmo com essa ajuda, houve aumento das despesas obrigatórias, o que tornou o bloqueio necessário.

Nessa situação, é preciso conter gastos discricionários (que incluem custeio e investimentos públicos) para manter o montante total dentro dos limites do arcabouço. O detalhamento das áreas afetadas será feito em decreto a ser editado por Lula até o fim do mês de março.

Sob o ponto de vista técnico, o bloqueio não é o mesmo que um contingenciamento, outra modalidade de trava usada quando as perdas de arrecadação colocam em risco o alcance da meta fiscal. Como o resultado primário está dentro do alvo, esse instrumento não precisou ser utilizado pelo governo.

A equipe econômica tem a expectativa de que o primeiro relatório consolide um cenário mais benigno para as contas públicas, muito diferente das preocupações de poucos meses atrás, quando o debate fiscal era sobre o tamanho do contingenciamento que o ministro Fernando Haddad (Fazenda) teria de fazer para cumprir a meta de déficit zero.

Em entrevista à Folha de S.Paulo publicada no início de fevereiro, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, antecipou que os ganhos de arrecadação ajudariam o governo a fechar o primeiro relatório com um contingenciamento próximo de zero. A estratégia agora é usar esse fôlego para adiar ou até afastar qualquer eventual debate sobre flexibilização da meta fiscal.

Além disso, o bloqueio pode eventualmente ser revertido nos próximos meses, caso o governo consiga reduzir alguma despesa obrigatória ou preencha os requisitos para a abertura de um crédito suplementar de até R$ 15 bilhões no mês de maio, usando uma prerrogativa prevista na lei complementar do arcabouço fiscal.

A regra permite o uso desse espaço em caso de alta na arrecadação, mas condiciona sua efetivação ao cumprimento da meta.

O relatório de avaliação de receitas e despesas foi divulgado pelos ministérios do Planejamento e da Fazenda.

No documento, mesmo com o bom desempenho da arrecadação nos dois primeiros meses do ano, o governo reduziu sua previsão de receitas para o ano todo em R$ 16,8 bilhões, já descontadas as transferências para estados e municípios.

Segundo o governo, as revisões decorrem de uma expectativa menor de recolhimento de tributos pelas empresas em IRPJ (menos R$ 37,5 bilhões) e CSLL (menos R$ 10,3 bilhões).

O Executivo ainda diminuiu a projeção de arrecadação com royalties e participações especiais (R$ 14,5 bilhões) e concessões e permissões (R$ 12,8 bilhões).

O governo havia incluído no Orçamento uma previsão de receitas de R$ 44,4 bilhões com concessões e permissões, valor que contemplava R$ 34,5 bilhões com a repactuação de contratos de ferrovias. Até agora, o governo só fechou um acordo de R$ 1,5 bilhão com a Rumo. Por isso, economistas viam com a estimativa com ceticismo, apesar do otimismo do governo com as negociações.

Com a revisão, a nova projeção de receitas com concessões ficou em R$ 31,6 bilhões.

Por outro lado, o governo também espera receitas maiores com a contribuição previdenciária (R$ 8,6 bilhões) e outras receitas administradas (R$ 13,7 bilhões) -rubrica que inclui os depósitos judiciais repassados pela Caixa e que começaram a ser pagos em janeiro.

Do lado das despesas, o gasto com benefícios previdenciários (incluindo sentenças judiciais e compensações) subiu R$ 5,6 bilhões. Como mostrou a Folha de S.Paulo, o aumento ocorre apesar da incorporação da economia de gastos com a revisão dos benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).

Por outro lado, o gasto com apoio financeiro a estados e municípios caiu R$ 8,1 bilhões em relação ao inicialmente programado no Orçamento. O Executivo antecipou, em 2023, a parcela que seria paga neste ano.

ENTENDA A DIFERENÇA ENTRE BLOQUEIO E CONTINGENCIAMENTO

O novo arcabouço fiscal determina que o governo observe duas regras: um limite de gastos e uma meta de resultado primário (verificada a partir da diferença entre receitas e despesas, descontado o serviço da dívida pública).

Ao longo do ano, conforme mudam as projeções para atividade econômica, inflação ou das próprias necessidades dos ministérios para honrar despesas obrigatórias, o governo pode precisar fazer ajustes para garantir o cumprimento das duas regras.

Se o cenário é de aumento das despesas obrigatórias, é necessário fazer um bloqueio.

Se as estimativas apontam uma perda de arrecadação, o instrumento adequado é o contingenciamento.

Na prática, porém, o efeito acaba sendo o mesmo: o congelamento de recursos disponibilizados aos ministérios.

Como funciona o bloqueio

O governo segue um limite de despesas, distribuído entre gastos obrigatórios (benefícios previdenciários, salários do funcionalismo, pisos de Saúde e Educação) e discricionários (investimentos e custeio de atividades administrativas).

Quando a projeção de uma despesa obrigatória sobe, o governo precisa fazer um bloqueio nas discricionárias para garantir que haverá espaço suficiente dentro do Orçamento para honrar todas as obrigações.

Como funciona o contingenciamento

O governo segue uma meta fiscal, que mostra se há compromisso de arrecadar mais do que gastar (superávit) ou previsão de que as despesas superem as receitas (déficit). Neste ano, o governo estipulou uma meta zero, que pressupõe equilíbrio entre receitas e despesas.

Como a despesa não pode subir para além do limite, o principal risco ao cumprimento da meta vem das flutuações na arrecadação. Se as projeções indicam uma receita menos pujante, o governo pode repor o valor com outras medidas, desde que tecnicamente fundamentadas, ou efetuar um contingenciamento sobre as despesas.

Pode haver situação de bloqueio e contingenciamento juntos?

Sim. Não é este o cenário atual, mas é possível que, numa situação hipotética de piora da arrecadação e alta nas despesas obrigatórias, o governo precise aplicar tanto o bloqueio quanto o contingenciamento.

Neste caso, o impacto sobre as despesas discricionárias seria a soma dos dois valores.

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