Ocupar um cargo de confiança, à primeira vista pode parecer algo promissor para a carreira de um profissional.
Mas, a verdade é que essa posição tem sido utilizada de forma indevida por algumas empresas que, assim, tiram proveito do funcionário ao não pagar horas extras.
Para falar sobre o assunto, convidamos o advogado Jonas Figueiredo, especialista em Direito do Trabalho em São Paulo, e que irá esclarecer pontos importantes sobre o cargo de confiança, além de trazer dicas sobre como identificar possíveis fraudes por parte do empregador. Acompanhe.
O que é o cargo de confiança
O termo “cargo de confiança” é amplamente conhecido por ser comum entre os empregadores e tem previsão na CLT no art. 62.
Ainda, apesar de muito comum, o empregado ocupante deste cargo deve atentar-se se realmente cumpre os requisitos para tal e se recebe todos os direitos garantidos.
Num mercado onde a dinâmica do trabalho muitas vezes desafia as normas estabelecidas, entender seus direitos e saber identificar possíveis abusos é essencial para garantir uma relação de trabalho justa e equilibrada.
Nesse sentido, o empregado que ocupa um cargo de confiança possui poderes de alta gestão, como intervir nas decisões da empresa, admitir e demitir seus subordinados, equiparando-se ao poder do dono da empresa.
Ou seja, é o empregado que coordena e fiscaliza atividades, assim como gestores, diretores e gerentes (dependendo do caso).
O trabalhador nessa posição tem poderes dentro de sua área equiparados aos donos da empresa, sendo a última pessoa a tomar decisão no departamento.
E, além de toda a responsabilidade depositada pelo empregador, há outros diferenciais, como ausência de controle de jornada de trabalho, autonomia e salário, que discutiremos mais a frente.
É importante atentar-se pois, apesar de possuir um cargo de gestão, responsabilidades e subordinados, tais diferenciais não são suficientes para você ser enquadrado como cargo de confiança.
Então, quais são os requisitos para o cargo de confiança?
Para caracterizar o cargo de confiança é necessário que haja remuneração diferenciada e significativa e atribuição e desempenho de um cargo de gestão. Estes são os requisitos trazidos pela CLT em que deve se enquadrar nesse emprego.
O empregado nomeado a um cargo de gestão, deve comportar-se como um líder, um substituto do empregador, possuir uma credibilidade peculiar, estabelecendo uma relação de confiança e poderes, possuir uma equipe de subordinados e poderes de gestão para admissão e demissão.
E, o que descaracteriza esse cargo?
A ausência de poderes de gestão é um dos fatores que descaracteriza o cargo de gestão, ou seja, quando o empregado não tem autoridade para tomar decisões importantes, como contratação, demissão ou supervisão de equipe.
Além do poder de gestão o funcionário deve ter autonomia, sendo a última instância na unidade ou na filial, respondendo por todos os aspectos no departamento.
A existência de vários empregados no mesmo setor, com essa denominação, também sugere que o cargo não é excepcional e tal situação pode ter sido utilizada para se evitar o pagamento de horas extras.
A subordinação direta, o controle rígido de jornada, a execução de atividades rotineiras e operacionais, bem como a gratificação não condizente também podem explicitar um caso de ocupação indevida do cargo de confiança.
É importante esclarecer um ponto que costuma confundir os funcionários. Cargos de médios ou cargos mais baixos na hierarquia da empresa, NÃO POSSUEM CARGO DE CONFIANÇA.
Portanto, em regra, auxiliares, assistentes, analistas, gerentes e coordenadores não possuem cargo de confiança se houver um diretor ou alguém acima deste.
Assim, a mera atribuição do título não exime de ter controle de ponto.
Os requisitos para esse enquadramento são específicos e devem ser rigorosamente seguidos e deve ser avaliado caso a caso.
Como as empresas têm usado o cargo de confiança para não pagar horas extras?
Como dito, para se considerar o trabalhador como detentor do cargo de confiança, deve atender a uma série de requisitos.
Mas, o que temos visto é que muitas empresas afirmam que um trabalhador possui tal fidúcia diferenciada sem cumprir esses requisitos.
O objetivo é evitar o pagamento de horas extras, o que é ilegal.
Portanto, se os requisitos mencionados não forem atendidos ou se a situação se enquadrar na descaracterização do cargo de confiança, é provável que o trabalhador esteja sendo vítima dessa fraude e, na verdade, tenha direito a horas extras.
Por exemplo, um gerente que possui 10 (dez) subordinados acima dele.
Temos o coordenador, que orienta todos os gerentes e subordinados, controla férias, admissão, demissão, faz o controle financeiro da área e toda decisão que for tomada no departamento teria que passar por esse coordenador.
Esse gerente de fato, não possui cargo de confiança por mais que receba um adicional para isso.
Nesse caso, ele deveria receber horas extras caso ultrapasse a sua jornada de trabalho.
Assim, é fundamental avaliar cada caso individualmente, sendo recomendável consultar um advogado especializado em Direito do Trabalho para se avaliar se o cargo é de fato de confiança.
Quais direitos possui o empregado em um cargo de confiança?
Ao ser nomeado a um cargo de gestão, primeiramente o empregado deve ter a condição registrada na carteira de trabalho.
Além disso, ele passa a ter uma remuneração diferenciada dos demais empregados. Esse aumento salarial corresponde a 40% do salário do subordinado.
Apesar de ser verba salarial, tal valor não passa de uma gratificação, um plus salarial, pela ocupação do cargo diferenciado, e, por não integrar ao salário, caso você perca o cargo de confiança, perderá também a gratificação de função.
Este empregado também possui grande autonomia, já que a esse tipo de função é cobrado por metas e não pela forma tradicional como os demais.
Assim, se torna incompatível determinar horários e controle de jornada. Logo, por não haver controle de jornada, ele não receberá horas extras, também não sofrerá desconto de atrasos e faltas.
Como o trabalhador pode provar que não existe o cargo de confiança?
É possível provar por meio das atividades reais do empregado, testemunhas, holerite que demonstrem a ausência de superioridade salarial, ou que não há pagamento da gratificação de função, ausência de subordinados e de registro na carteira de trabalho.
Além disso, os requisitos para ocupar um cargo de confiança devem ser cumulativos.
Logo, se um deles não estiver sendo cumprido, este será descaracterizado.
Por exemplo, o empregador te nomeou ao cargo. Teoricamente você passa a realizar as funções para tal, contudo, na realidade, você não possui poderes de gestão, já que responde ao seu empregador, não possui autonomia, nem subordinados.
Outro exemplo é você ocupar um cargo e não receber a gratificação de função.
Nesses exemplos, esse empregado não possui cargo de confiança, não passando de um empregado comum e teria direito ao recebimento de horas extras.
E o cargo de confiança bancário? Possui diferenças?
Sim, a CLT diferencia o empregado ocupante de cargo de confiança de um Banco dos demais.
Dessa forma, o cargo de confiança bancário está previsto no parágrafo 2º do art. 224 da CLT.
Em suma, a jornada de um empregado bancário normal não seve ultrapassar de 6 (seis) horas.
Contudo, os ocupantes de cargos de confiança, que exercem funções de direção, gerência, fiscalização, chefia e equivalentes, possuem jornada de 8 (oito) horas ou mais, com controle de jornada.
Aqui, a gratificação de função será de 1/3 (um terço) do salário do cargo efetivo.
Assim, como os demais, é importante o empregado se atentar se preenche os requisitos e recebe todos os direitos que o cargo garante.
É muito comum que, quando o bancário realiza uma jornada de 8 (oito) horas, o banco enquadrá-lo como cargo de confiança.
Mas, isso é apenas para se livrar do pagamento de horas extras, já que na verdade esse empregado não possui poderes que um cargo exige, e está perdendo valores que teria direito.
Alguns bancários também possuem o cargo de confiança “padrão”.
Quem possui cargo de confiança não recebe horas extras, qual outro direito que é prejudica?
Como dito acima, por ter uma remuneração diferenciada e não ter controle de jornada, o empregado com cargo de confiança não recebe horas extras, porém, os demais direitos como estabilidade em razão de acidente de trabalho, estabilidade gestante, férias e outros tais empregados tem direito normalmente.
* Jonas Figueiredo de Oliveira, Advogado trabalhista com sócio do Figueiredo Sociedade de Advogados, auxiliando juridicamente trabalhadores e empreendedores sempre de forma personalizada. Pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho pela EPD (Escola Paulista de Direito), MBA Direito do Trabalho e Direito Previdenciário, possui formação em Técnicas de Negociação e Planejamento Estratégico para Escritórios de Advocacia ambos pela Fundação Getúlio Vargas (FGVSP).