Menu
Brasil

Grupos rivais disputam avenida Paulista no 7 de Setembro com manifestações pró e contra Bolsonaro

O embate ganhou força nos últimos dias, com a crescente mobilização de bolsonaristas em torno de bandeiras como o voto impresso

Redação Jornal de Brasília

17/08/2021 15h35

Joelmir Tavares
FolhaPress

A convocação simultânea de manifestações favoráveis e contrárias ao presidente Jair Bolsonaro para 7 de Setembro acendeu o alerta para o risco de conflitos nas ruas. Em São Paulo, grupos rivais disputam a avenida Paulista, que, por decisão judicial, só pode ser usada por um lado de cada vez. Diante do impasse, líderes da oposição querem pressionar o governador João Doria (PSDB) para que impeça a realização na capital paulista de ato pró-golpe militar e contra as instituições. Já apoiadores do governo mantêm a convocação para o local e esperam a participação do presidente na passeata.

O embate ganhou força nos últimos dias, com a crescente mobilização de bolsonaristas em torno de bandeiras agitadas pelo chefe do Executivo, como o voto impresso -já derrubado pela Câmara dos Deputados- e o impeachment de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Grupos simpáticos ao presidente já organizavam a ida às ruas no feriado da Independência quando veio à tona no fim de semana a informação de que o cantor Sérgio Reis organizava uma grande manifestação de caminhoneiros com pautas autoritárias, com risco de paralisação e ameaça de caos.

Reis foi desautorizado por líderes da categoria que estão à frente de negociações com o governo e por ruralistas. Eles afirmaram que o cantor não fala em nome do setor e desaconselharam o movimento, dizendo que pode prejudicar demandas da classe. Apesar disso, o temor está colocado. Bolsonaro voltou nesta terça-feira (17) a estimular a participação de apoiadores nos atos. “Eu sou leal ao povo brasileiro. O povo que tem que nos dar o norte do que devemos fazer”, disse em entrevista à Rádio Capital Notícia Cuiabá. A data tem sido tratada por bolsonaristas como “nova Independência”.

Em 30 de julho, setores da oposição reunidos na Campanha Nacional Fora Bolsonaro –fórum com partidos, movimentos sociais e centrais sindicais que desde maio faz atos pelo impeachment e por mais vacinas contra a Covid-19- anunciaram também uma convocação para 7 de Setembro. O comando central, que é formado majoritariamente por grupos de esquerda, mas ganhou adesão de siglas e organizações que se identificam como de centro, decidiu se juntar à mobilização do Grito dos Excluídos, tradicional levante promovido no feriado da Independência por alas da Igreja Católica.

Aí tem início a novela da utilização da Paulista, a avenida-símbolo das grandes manifestações políticas ocorridas no país desde 2013. Todas as quatro passeatas neste ano com a bandeira do “fora, Bolsonaro” ocuparam a via, assim como uma série de atos de apoiadores do presidente, em datas distintas. Cada grupo deve notificar antecipadamente a Polícia Militar, informando previsão de público na manifestação e trajeto (quando há). Baseada em decisão judicial de 2020 que impede a ida ao local de “movimentos ideologicamente opostos”, a corporação pede que o solicitante se classifique como oposição, situação ou neutro.

O referencial jurídico diz que o objetivo não é o de censurar manifestações, mas unicamente “evitar confrontos”. E recomenda um rodízio caso haja pedidos de grupos rivais para um mesmo dia, estabelecendo uma alternância. O descumprimento pode ser punido com multas pesadas. Na terça-feira passada (10), o representante da Campanha Fora Bolsonaro avisou a PM sobre o ato contra Bolsonaro em 7 de Setembro. Ata obtida pela Folha com registros da negociação informa que a antecedência foi considerada adequada pela PM, mas já havia notificação da chamada situação.

O 11º Batalhão de Polícia Militar, que responde pela área, disse que, na vez anterior em que ocorreu empate, com solicitações de grupos opostos, o revezamento foi decidido em favor da oposição. Agora, então, a vez seria da situação. Os detratores do presidente foram aconselhados a optar por outro local, com a garantia de também haver acompanhamento das forças de segurança, mas sem qualquer marcha em direção à Paulista. Em ocasiões anteriores, o largo da Batata, em Pinheiros (zona oeste), foi utilizado como alternativa.

Mesmo com a obediência ao protocolo, a separação geográfica embute o risco de conflitos entre grupos antagônicos em estações de metrô e praças usadas como ponto de encontro, por exemplo. O cenário deixa em alerta o comando do policiamento e os próprios organizadores de manifestações. Em reunião nesta segunda-feira (16), porta-vozes da Campanha Fora Bolsonaro decidiram contestar o veto ao uso da Paulista pela oposição. Eles planejam recorrer ao o Ministério Público e a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em busca de ajuda para que o protesto seja mantido na avenida.

Raimundo Bomfim, coordenador da CMP (Central de Movimentos Populares) e um dos líderes das marchas, diz que o grupo discorda do entendimento da PM sobre a decisão judicial e levanta pontos que sustentam sua posição. “Vamos lutar até o fim para que possamos fazer na Paulista”, afirma ele. A PM diz que o “empate de notificações” mais recente foi relacionado ao dia 24 de julho e que, na ocasião, a oposição ficou com o direito de ocupar a Paulista, já que o solicitante rival -identificado pela polícia como de situação- concordou em fazer seu ato longe da avenida, no parque Ibirapuera (zona sul).

“Era um representante de um grupo pequeno, que queria fazer um ato de cunho religioso. Ele nem participou de reunião de mediação. Então, quando um lado estiver planejando ato, basta uma pessoa pedir o mesmo e fazer a concessão para que, na vez seguinte, tenha prioridade? Não concordo”, diz Bonfim. O coordenador da CMP argumenta ainda que, se o critério é o de rodízio, a prerrogativa para 7 de Setembro é da oposição, já que a última manifestação política na Paulista foi a de partidários de Bolsonaro, no dia 1º deste mês, quando defenderam o voto impresso e atacaram o sistema eleitoral brasileiro.

“Não queremos desrespeitar nenhuma decisão da Justiça, mas queremos debater essa interpretação da liminar, que nos parece injusta. O local tem sido o palco das nossas manifestações e é também usado há anos pelo Grito dos Excluídos. Temos a preferência”, acrescenta o líder do movimento social. “Não é razoável que a Paulista seja priorizada para quem defende intervenção militar e fechamento de instituições, em prejuízo de quem defende a democracia e aceleração da vacina. Vamos buscar os meios jurídicos, mas também não vamos deixar de fora o Doria. Ele vai ter que se posicionar”, diz Bonfim.

Doria, eleito governador em 2018 com a dobradinha “BolsoDoria”, rompeu politicamente com o presidente e quer enfrentá-lo nas eleições presidenciais de 2022. Para se cacifar, dispara críticas diárias ao atual titular do Planalto e se contrapõe a ações dele que ameacem a democracia e as instituições. Segundo o documento da PM, corporação que está subordinada ao governo do tucano, há pedidos de bolsonaristas para uso da via a partir das 8h do dia 7.

O empresário Mauro Reinaldo, fundador do movimento União pelo Brasil e um dos que estão convocando para o ato favorável a Bolsonaro, afirma à Folha que os governistas estão preparados para se concentrar na avenida Paulista e seguem todas as orientações das autoridades de segurança. “Vai ter muita gente. Muitos ônibus de vários estados vão vir para cá”, diz Reinaldo, que quer usar o protesto para defender uma investigação do Poder Judiciário, nos moldes da CPI da Lava Toga que foi proposta no Congresso. Bolsonaro também está empenhado em fustigar setores da magistratura.

Segundo o empresário, o presidente indicou à organização que comparecerá à Paulista. Ministros do governo, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do mandatário, e outros expoentes bolsonaristas também são aguardados no local pelos manifestantes. Já o movimento divulgado por Sérgio Reis, que teria Brasília como foco principal, não tem chance de prosperar, na opinião de Reinaldo. “Não acredito que paralisação ou acampamento terá força. Lá vai ter a cerimônia militar do 7 de Setembro, mas não essa manifestação que anunciaram”, diz.

Aliados de Bolsonaro estão fazendo em redes sociais uma divulgação intensa da mobilização na Paulista e em outras cidades, tentando arregimentar multidões com ataques a ministros do STF e frases de apelo como “por uma nova Independência”, “hora do tudo ou nada” e “redemocratização já”. A prisão do ex-deputado federal Roberto Jefferson, por decisão do ministro do Supremo Alexandre de Moraes, atiçou ainda mais o chamado para as ruas. Defensor fiel de Bolsonaro, o presidente nacional do PTB vinha insuflando a retórica golpista do mandatário e as ameaças à ordem democrática.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado