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Rumo à censura, governo proíbe filme a menores

A publicação também recomenda que o longa seja exibido após às 23h, quando passar na TV aberta

FolhaPress

16/03/2022 21h25

Medida cautelar também atinge outras plataformas que exibam o filme de Danilo Gentili; cena com Fábio Porchat está no centro da polêmica

Foto/Reprodução

João Perassolo e Leonardo Sanchez
São Paulo, SP

O Ministério da Justiça alterou a classificação indicativa do filme “Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola” para 18 anos. A mudança está no Diário Oficial da União desta quarta-feira (16) e é assinada pelo secretário José Vicente Santini, amigo dos filhos de Jair Bolsonaro. A publicação também recomenda que o longa seja exibido após às 23h, quando passar na TV aberta.

O filme está no centro de uma polêmica após ser acusado de promover a pedofilia pelo secretário da Cultura, Mario Frias, e outros expoentes bolsonaristas. A classificação indicativa da obra, lançada originalmente em 2017 e que chegou ao streaming há poucas semanas, era de 14 anos. A nova indicação de faixa etária deve ser cumprida em cinco dias.

A decisão do Diário Oficial menciona “ato de pedofilia” e “situação sexual complexa” para justificar a alteração. Na comédia, há uma cena na qual o personagem interpretado por Fábio Porchat pede a dois garotos que o masturbem.

Eles negam o pedido.

Advogados consultados pela reportagem afirmam que as plataformas de streaming são obrigadas a seguir a determinação e mudar a classificação. Caso não queiram, devem contestar a medida na Justiça, já que é uma prerrogativa do governo alterar a idade sugerida para um filme ou obra audiovisual, expediente utilizado com certa frequência.

O entendimento entre os advogados é que a decisão desta quarta passa a valer sobre a de terça, que pedia a suspensão da exibição do longa, medida considerada ilegal pela comunidade jurídica, dado que a administração pública não pode censurar uma obra de arte, determinando sua exclusão dos vários canais de distribuição.

“O governo viu que tinha feito uma bobagem enorme e voltou atrás. É tudo muito avacalhado, é tão bizarro”, afirma Daniel Sarmento, professor de direito constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a Uerj.

Vale mencionar, contudo, que não há uma revogação expressa da ordem de suspensão de exibição de “Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola”. Ou seja, o futuro do filme parece incerto, dado que ambas as medidas do ministério seguem válidas, de acordo com um texto publicado no site da pasta. A reportagem procurou o ministério questionando sobre o imbróglio, mas não obteve resposta até a publicação da reportagem.

O filme pode ser visto em diversos serviços de streaming. Netflix, Apple TV+, Globoplay e Telecine ajustaram a faixa etária para 18 anos. YouTube e Google Play não comentaram.

Se as plataformas não exibirem a classificação indicativa de 18 anos, podem ser multadas entre 20 e cem salários mínimos, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente.

A portaria mais recente do Ministério da Justiça e Segurança Pública sobre classificação indicativa foi publicada em novembro e entrou em vigor em janeiro. Em linhas gerais, as produtoras fazem uma autoclassificação das obras, baseadas num guia disponível no site do ministério, e então submetem o pedido à pasta, que pode aprovar ou mudar.

De acordo com o guia mais recente do governo, “Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola” poderia se encaixar em duas faixas, de 14 ou 16 anos. A de 14 trata de exploração sexual, afirmando que cenas com “indução ou atração de alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, como facilitar, impedir ou dificultar que alguém a abandone” não são recomendadas para menores dessa idade. Já a de 16 anos menciona explicitamente pedofilia, em que se enquadram quaisquer atos libidinosos envolvendo crianças e adolescentes nessa faixa etária, mesmo que não haja consumação de ato sexual.

Cris Olivieri, advogada consultora para arte e cultura, chama de “censura velada” a mudança de classificação da comédia, “uma vez que a cena não justifica o aumento para 18 anos”. Acrescenta ainda que a polêmica está sendo feita sobre um trecho num filme ficcional, não um crime.

Desde a chegada de Bolsonaro à Presidência, mudanças na classificação indicativa se tornaram frequentes, em parte porque sob seu governo o processo classificatório para televisão, cinema, streaming, jogos, aplicativos e espetáculos passou por uma revisão. As mudanças atingem principalmente as obras antigas.

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