Quando foi se inscrever para os testes do musical A Pequena Sereia, o ator Gabriel Vicente olhou a lista de personagens e, de cara, descartou o Príncipe Eric. “Normalmente, é escolhido alguém loiro, de olhos azuis e branco, o que não é o meu perfil”, contou ele ao Estadão. Daí sua surpresa quando foi convidado pela produção do espetáculo para tentar justamente esse papel – e foi escolhido. Assim, quando a peça estrear oficialmente no domingo, 17, no Teatro Santander, Gabriel estará vestindo trajes da realeza. “Para nossa representatividade, isso é muito importante”, assegura. “Especialmente quando uma criança negra na plateia observar que o príncipe também é negro.”
O efeito, de fato, deverá ser promissor. “Será um dos assuntos da temporada e vai ajudar a mudar conceitos como o dos papéis que são sempre interpretados pelos mesmos atores”, acredita Andrezza Massei, que vive a divertida vilã Úrsula. “E espero que logo chegue o dia em que o que celebramos hoje como novidade seja considerado algo corriqueiro”, completa Fabi Bang, que vive a sereia Ariel.
O momento também é celebrado por Róbson Nunes, que interpreta Sebastião, o divertido caranguejo encarregado de evitar os tropeços de Ariel em sua curiosidade de se tornar um ser humano. “Viver esse personagem é a confirmação da minha representatividade como ator negro. Outro trunfo é participar de um musical, gênero ao qual não estou acostumado”, conta ele, que se inspirou em profissionais do samba, como Thobias da Vai-Vai, para criar a alegria do papel.
Montado inicialmente em 2018, A Pequena Sereia retorna mais ágil e com efeitos especiais mais elaborados. Conta a história de Ariel que, apesar de viver no fundo do mar, sonha em fazer parte do mundo dos humanos – especialmente depois de salvar o príncipe Eric de um afogamento. E, apesar de alertada por seu tutor, Sebastião, e pelo amigo Linguado (Lucas Cândido), ela aceita a proposta de sua tia Úrsula, a esperta bruxa do mar, de ceder sua bela voz em troca da possibilidade de viver fora do mar.
Sarcasmo
“Nesses quatro anos desde a primeira temporada, passamos por uma pandemia e eu tive uma filha, o que me fez olhar de forma diferente para Ariel”, conta Fabi. “Hoje, quando o pai vem com uma retórica autoritária, querendo mandar no seu destino, ela busca seu lugar e firma sua posição.” A atriz revela até mudanças no texto, que sinalizam uma adequação aos tempos modernos. “Antes, Sebastião dizia que ela devia dedicar-se a coisas de menina; agora, ele diz ‘coisas mais delicadas’. Não pode haver essa separação.”
Mudanças também são notáveis em Úrsula. “Depois da pandemia, tenho outro olhar para o mundo e ela acaba refletindo meu sarcasmo mais intenso, o que a torna mais interessante”, acredita Andrezza. “O musical continua com a magia do conto de fadas, mas não se esquece da diversidade do dia a dia”, pontua Stephanie Mayorkis, da IMM e EGG Entretenimento, produtoras do espetáculo.
A Pequena Sereia
Teatro Santander. Av. Pres. Juscelino Kubitschek, 2.041. 5ª/6ª, 21h. Sáb., 16h e 20h. Dom., 15h e 19h. R$ 75 / R$ 300
Estadão Conteúdo.