SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
“Eu não acreditei quando vi que Lena Dunham tinha me mandado uma mensagem no Instagram”, diz Megan Stalter, em entrevista por videochamada na manhã da última terça-feira (8). Em um cenário nada sofisticado, com duas maria-chiquinhas presas bem baixas, sem maquiagem e uma camiseta qualquer, ela parece bem pouco com suas duas personagens histriônicas em duas das melhores séries cômicas do momento.
Uma é “Hacks”, da HBO, cuja quarta temporada acabou no final de maio com a quinta já anunciada em que interpreta Kayla, uma menina rica que trabalha como a assistente abilolada de Jimmy, personagem de Paul W. Downs, criador da série.
E a outra é “Too Much”, que entrou na programação da Netflix no último dia 10, em que interpreta Jessica Salmon, a personagem principal, que é uma espécie de alter-ego de Dunham. Não só isso, Stalter foi a atriz em quem Dunham pensou ao transformar sua própria vida real em uma série cômica. Ou melhor, sua vida amorosa, desde um rompimento traumático com um namorado de longa data em Nova York, que a teria trocado por uma influencer linda e “cool”, até o encontro com um músico indie londrino, cidade para a qual se mudou depois do fim do namoro.
“Too Much” é inclusive assinado por Dunham e Luis Felber, seu marido, o tal músico indie por quem ela se apaixona em Londres. Na pele dele, o ator inglês muito bonitinho e sexy Will Sharpe, da segunda temporada de “The White Lotus”.
Ser procurada pela criadora de uma série que já veio ao mundo pop com tamanho pedigree, caso de Stalter em “Too Much”, é quase como um prêmio prévio, como se Hollywood a estivesse abençoando oficialmente pelo conjunto de sua obra.
Por DM, ou “direct message”, de Instagram para Instagram, sem agentes, produtores ou empresários no meio do caminho e sem o estresse de ter que passar por um teste, então, é um desses luxos da vida de uma estrela. E olha que ela só tem um grande sucesso no currículo, justamente na série “Hacks”, sua estreia na TV.
Stalter nasceu em 1990 em uma família religiosa e humilde do meio-oeste dos Estados Unidos. Fazia parte da turma do teatro de sua escola desde cedo, sempre em papéis secundários.
“Eu nunca tinha nem a ambição de interpretar uma mocinha, a comédia sempre foi um universo mais confortável para mim, por motivos óbvios”, afirma. Em 2018, começou a fazer esquetes caseiras cômicas que publicava nas suas redes sociais, tudo bem improvisado, sem grandes pretensões.
Durante a pandemia, um de seus vídeos viralizou. “Hi, gay”, era o título, e fazia uma paródia das mensagens corporativas performáticas durante o mês do orgulho gay. Chegou a dois milhões de visualizações, e ela ganhou o apelido de “rainha da quarentena”.
Então, sem nenhuma experiência, sem papéis relevantes como atriz, foi escalada para viver a filha mimada do dono da agência de talentos que vira assistente de Jimmy, em “Hacks”. E foi justamente sua falta de experiência, seu exagero na maneira de se vestir e de se comportar, sem nenhuma amarra ou adequação, que a transformaram na atriz perfeita para o que Dunham procurava.
“Eu nem sei dizer o que vem do roteiro e o que eu acabo improvisando no meu trabalho, depois de fazer uma cena eu esqueço dela completamente”, me diz Stalter, tanto sobre seu trabalho em “Hacks” quanto em “Too Much”.
Ela considera uma sorte ter os criadores de ambas as séries presentes no set o tempo inteiro, “assim posso ter perguntas sobre o que fazer em cada cena até o último minuto”, conta.
“Too Much”, assim como “Girls”, é uma série irregular, com episódios hilários, icônicos, bem escritos, e outros nem tanto. Com uma trama super bem amarrada e várias sub-tramas que se perdem no caminho, a série tem em seu elenco de apoio nomes como Naomi Watts, Richard E. Grant, Stephen Fry, Andrew Scott e Rita Wilson.
A modelo Emily Ratajkowski interpreta a influencer por quem o ex-namorado da protagonista a deixa. Na vida de Dunham, que não é nem de longe uma menina tão desavisada quanto sua personagem e já era bem famosa quando tudo aconteceu a verdade pode ter sido até mais cruel.
A mulher por quem seu ex-namorado da vida real, o músico Jack Antonoff, se apaixonou e com quem é casado desde 2023 é a atriz impossivelmente linda Margaret Qualley, de “A Substância”.
“Eu não posso comprovar quem é quem na vida real ou que situações aconteceram de verdade na vida de Lena”, diz Stalter na entrevista, “mas eu fiz todas as perguntas, tinha todas as curiosidades que todo mundo tem”, provoca a atriz.
“A série funciona não porque é baseada em uma história real, mas porque a gente é mesmo muito parecido, não importa como é do lado de fora. A gente sempre se compara com a namorada ou o namorado de nossos ex, faz parte da experiência humana”, afirma.
Quando é transferida para Londres, louca para viver uma história de amor à la “Notting Hill” ou “Bridget Jones”, a protagonista conhece Felix, o músico indie, papel de Will Sharpe. Felix é adorável, mas Jessica passa os primeiros episódios analisando tudo que ele faz com lupa, atrás de potenciais alertas de perigo.
Enquanto isso, não consegue superar o fato de que seu ex-namorado ficou noivo da influencer linda e os dois parecem apaixonados. Para conter a raiva, Jessica faz vídeos em forma de cartas para a noiva de seu ex, trancada no banheiro, como um diário muito louco, ou muito de gente jovem, não sei dizer.
Sempre em voz alta, ou seja, mais de uma vez ela é flagrada por Felix falando uns textões imensos sozinha, e claro que uma hora isso dará muito errado.
Tem muita droga, muito sexo, muita gente esquisita. Que fala de droga e de sexo quase o tempo inteiro. E há cenas e personagens inesquecíveis, a começar pela avó de Jessica, uma velhota sapeca que dá os conselhos mais absurdos, interpretada por Rhea Perlman.
Todos os pais e mães são infantilizados, a começar pela personagem interpretada por Dunham, a irmã mais velha de Jessica, uma mulher deprimida que passa o dia na cama empurrando o filho para o ex-marido. A maturidade, assim como a moderação, às vezes só atrapalham.
Por sorte, nem Dunham nem Stalter parecem correr esse risco.