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Brasil

O detetive das enchentes

No fim das contas, o espetáculo das acusações não reconstrói nenhuma casa, não resgata nenhum cidadão ilhado e muito menos previne a próxima catástrofe

Redação Jornal de Brasília

09/05/2024 18h30

As enchentes no Rio Grande do Sul viraram o palco mais recente do teatro político brasileiro, onde cada ator parece mais interessado em apontar o dedo do que em estender a mão. Em uma reviravolta digna de novela das nove, nossos ilustres políticos transformaram a tragédia em uma verdadeira sessão de “quem é o culpado?” – uma espécie de “Detetive”, mas sem o charme e com muita lama.

Começamos com o prefeito, que com sua habilidade nata de escapista, consegue desviar das responsabilidades como quem desvia de buraco em estrada rural. Segundo ele, a culpa é das chuvas, que claramente têm uma agenda política contra sua gestão. O curioso é que a chuva, aparentemente, só decidiu cair com força após anos de alertas ignorados sobre o sistema de drenagem que mais parece uma peneira.

Do outro lado, temos os vereadores, que encontram culpados com a mesma facilidade que encontram justificativas para aumentar o próprio salário. Para eles, a culpa é da administração passada, que por sua vez, culpa a administração ainda mais passada. É a clássica técnica do “não fui eu”, adaptada para o universo político.

E não podemos esquecer dos deputados estaduais, que veem nas enchentes a oportunidade perfeita para ganhar visibilidade, surgindo nos locais afetados com botas brilhantes e promessas vazias. Segundo esses nobres representantes, a culpa é do governo federal, que deveria ter enviado uma carta aos céus pedindo gentilmente que as chuvas cessassem.

Enquanto isso, no palco federal, as acusações são lançadas de volta para os níveis locais e estaduais com a precisão de um boomerang. O debate sobre quem deixou de fazer o quê se torna tão turvo quanto as águas que inundam as ruas.

No fim das contas, o espetáculo das acusações não reconstrói nenhuma casa, não resgata nenhum cidadão ilhado e muito menos previne a próxima catástrofe. Mas certamente garante uma coisa: um esplêndido show de passagem de responsabilidades, com ingressos gratuitos para todos os moradores afetados, quer eles queiram ou não.

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