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Brasília

Violência contra a mulher: uma longa história a combater

Após séculos de opressão, Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres se está na linha de frente contra cenário desafiador

Vítor Mendonça

25/11/2019 6h38

Atualizada 26/11/2019 15h30

Foto: Vitor Mendonça

Camilla Germano e Vítor Mendonça
[email protected]

Noélia Rodrigues, Erica Souza, Denise Aparecida e Letícia Curado são algumas das vítimas de feminicídio deste ano no Distrito Federal. Os casos aumentaram na capital de acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP/DF), ultrapassando o número de 2018. Enquanto o ano passado terminou com 28 ocorrências, em 2019 estão contabilizadas 29 – recorde histórico. O feminicídio é apenas um dos tipos de violência contra a mulher: assédio e importunação sexual são também outros crimes que também têm contabilizado altos índices. 

Hoje é o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres e, nos próximos dias, a temática é pauta para o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Este ano a abordagem é o estupro, que apresentou, entre janeiro e outubro deste ano, uma diminuição no comparativo com 2018. 

Em 1999, a Organização das Nações Unidas (ONU) escolheu o dia 25 de novembro para honrar a memória das irmãs Mirabal, na República Dominicana, assassinadas por motivos políticos em 1960, quando havia uma ditadura no país. A história das Mariposas, como são conhecidas, ao mesmo tempo que distante, se torna atual em vista aos casos registrados. A frase de Minerva Mirabal, irmã mais velha, ainda é símbolo: “Se me matam, levantarei os braços do túmulo e serei mais forte”. 

A principal intenção do dia estabelecido é que histórias como a de Jaqueline Maino, 35 anos, não se repitam. Desde a adolescência até a fase adulta, a hoje ativista pela causa feminina, empresária e marketóloga, sofreu com assédio e abuso psicológico pela cultura machista estrutural que citou haver no Nordeste, onde viveu por 30 anos. Segundo ela, se perceber como vítima por algumas atitudes tóxicas masculinas demorou pois estas ações já estavam normalizadas na sociedade nordestina em que estava inserida.

“O meu caso foge do ‘tradicional’ da violência. Sou uma vítima invisível e só consegui perceber o que eu vivi alguns anos atrás porque certas atitudes masculinas são socialmente aceitáveis”, relata. De acordo com Jaqueline, a falta de conhecimento e instrução sobre o tema a impediram de reconhecer os sinais de abuso em relacionamentos.

Ela acredita que a mudança vem principalmente pela educação; que instruir homens e mulheres sobre machismo e equidade entre gêneros é positivo para toda a sociedade. “Atualmente, esse assunto é, em sua maioria, noticiado em casos de feminicídio. Esse é o problema. Está relacionado na Lei Maria da Penha que é preciso lidar com três tópicos: punição, prevenção e educação. E só lidamos com a punição; é preciso dar enfoque também a prevenção e a educação”, propõe. 

#16diasdeativismo

Motivada pela agenda da ONU, a Secretaria da Mulher do Governo do DF (GDF) entrou no esforço mundial de 16 dias de ativismo no enfrentamento e eliminação da violência contra a mulher. A mobilização faz parte da campanha com tema “Informação é transformação”, que teve início em 20 de novembro, Dia da Consciência Negra. A partir de hoje, contam-se 16 dias até o encerramento das atividades, em 10 de dezembro, aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Trazendo a pauta para o Distrito Federal, a secretária da Mulher, Ericka Filippelli, traz um dado relevante e preocupante. “Observamos na última pesquisa realizada pela Secretaria de Segurança Pública (SSP) que mais de 70% das vítimas de feminicídio não procuraram nenhum equipamento do GDF para acolhimento ou denúncia das violências e agressões. Isso é grave e, portanto, cada vez mais necessário informar para transformar o futuro das mulheres do DF”, afirmou.

Possíveis caminhos

“Essa onda de violência é reflexo da ausência de políticas públicas educacionais nessa área”, afirmou a promotora Mariana Fernandes Távora em entrevista ao Jornal de Brasília sobre a temática da violência contra a mulher no Brasil e DF. Para a coordenadora do Núcleo de Gênero do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), a implementação de programas de educação cunhados pelo poder executivo é uma das portas efetivas de transformação social.

“Podemos dizer que estamos melhores que outras regiões do país em termos de políticas públicas para sanar essas problemáticas, mas ainda precisamos estruturar mais esses serviços para a prevenção à violência doméstica contra a mulher. Nós temos serviços que podem ser importantes para eliminar o ciclo da violência, que a gente sabe ser complexo de ser quebrado”, ressalta.

Para ela, a saída não se resume às intervenções do sistema de justiça; é preciso um acompanhamento psicossocial, que pode ser preponderante na quebra do ciclo da violência. “Olhando para dentro do DF, não temos um plano de ação para o eixo educacional, sabemos que não existe. E isso tem um impacto porque a violência contra a mulher é estrutural. Estas questões são construídas ao longo de muito tempo e não são desfeitas de uma hora para a outra. É necessário que o sistema executivo assuma essa lógica de trabalhar esses temas desde o primeiro até o último ciclo da educação”, defende.

Estatísticas 

Entre janeiro e outubro, foram registrados 27 casos confirmados de feminicídio no levantamento da SSP/DF. Um aumento de dois casos, no comparativo do mesmo período em 2018. Desde que a Lei do Feminicídio foi aprovada, em 2015, 99 crimes do tipo foram cometidos somente no DF. Há também um comparativo para as tentativas deste tipo de crime no último ano. Foram registrados 75 casos de feminicídios tentados entre janeiro e outubro em 2019 contra 56 no mesmo período de 2018. 

Houve um aumento de 3,9% nos números registrados de violência doméstica. Foram 13.372 em 2019 contra 12.876 em 2018. São 496 casos a mais. No entanto, no levantamento de estupros, foi apontada uma diminuição de 15,3%; 618 casos em 2018, contra 524 em 2019. Desse número, 59% foram casos de estupro de vulnerável – prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de 14 anos ou contra pessoa que, por doenças ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. 

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