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Brasília

Recusa de transplante de órgãos no DF atinge os 45% e afeta fila de espera

Para enfermeiro do ICTDF, o tratamento do paciente dentro da rede de saúde também influencia na decisão

Redação Jornal de Brasília

20/11/2025 12h27

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Crédito: Caroline Purificação

CAROLINE PURIFICAÇÃO

No Distrito Federal, 1.744 pessoas aguardam atualmente na fila de espera por um transplante de órgão ou tecido, segundo dados do Painel de Transplantes da Secretária de Saúde (SES/DF). Além das burocracias que envolvem esse processo, como a logística e a compatibilidade, a negativa das famílias se torna o maior problema. No primeiro semestre deste ano, a taxa de recusa no DF era de 46%, o número está na média nacional de 45%. Outros estados apresentam uma maior porcentagem na recusa, como Tocantins (79%), Goiás (72%), Amazonas (71%) e o Mato Grosso (70%). O levantamento é da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO).

O painel da SES/DF também aponta que 631 transplantes já foram realizados este ano na capital. O Instituto de Cardiologia e Transplantes do Distrito Federal (ICTDF) lidera o ranking com 192 procedimentos efetuados. O Enfermeiro Supervisor do Programa de Transplantes do ICTDF, Rafael Costa Filgueiras, comentou ao Jornal de Brasília a respeito dos motivos que levam os familiares a recusarem a doação de órgãos dos parentes.

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Enfermeiro Supervisor do Programa de Transplantes do ICTDF, Rafael Costa Filgueiras. | Crédito: Caroline Purificação

Além das crenças religiosas das famílias, para Rafael, a maneira como o paciente é tratado em vida também é um indicador para a tomada de decisão. “A experiência da família dentro da rede influencia na possibilidade da doação ou não”, comenta ele.

O enfermeiro também relatou que “as campanhas deveriam ser de forma contínua, e não apenas sobre a doação em si. Muitas vezes as pessoas já sabem sobre a importância da doação, mas a desinformação a respeito do processo de doação leva até essa recusa”. 

O processo de doação 

Para que seja iniciado o processo de doação, o paciente precisa ter o diagnóstico de morte encefálica (confirmado por meio de exames complementares). Após, a família é informada sobre o falecimento e a possibilidade da doação. Com o aceite, o doador passa por exames avaliativos, uma auditoria é aberta e o caso é encaminhado para a Central Estadual, para que possa ser feita a oferta para todos os centros transplantadores do país. 

A logística de transporte é feita com o auxílio de outras autoridades, como a Força Aérea Brasileira, o Corpo de Bombeiros e o Detran. Outro fator que interfere na logística é o tempo isquemia (ausência de fluxo sanguíneo ou de oxigênio) de cada órgão. Desde o início do programa, em 2007, o ICTDF realizou mais de 2.800 procedimentos, sendo uma referência nacional.

André Watanabe, coordenador de transplante de fígado do Hospital Brasília, comentou ao Jornal de Brasília sobre o recorde de fígados transplantados no DF em 2024: “85% desses transplantes foram realizados com órgão de outros estados, então há um esforço muito grande para que o processo aconteça. Eu atuo na área de transplantes há 13 anos e minha equipe já efetuou mais de 1.200 procedimentos”.

Quando a burocracia impede o renascer 

Rosemeire Félix, doadora e autônoma, contou ao Jornal de Brasília o caso de uma amiga próxima que foi impedida de doar os órgãos devido ao “processo burocrático”, segundo o próprio hospital (não informado). A situação aconteceu há 12 anos e na época Rosemeire não possuía conhecimento de como era realizado o transplante. 

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Rosemeire Félix, autônoma. | Crédito: Caroline Purificação

Vera Leatriz, com 62 anos na época do falecimento, era uma profissional da saúde e adepta a doação. Realizava todos os check ups anuais e era uma senhora saudável. A notícia do aneurisma cerebral foi um choque para a família e amigos próximos. Mesmo sem um plano de saúde foi encaminhada para um hospital particular e internada. Na época, o médico informou que ela não poderia ser transferida para a rede pública devido aos riscos de saúde.

“O médico me mostrou os exames e me informou que o quadro dela era irreversível. Então, eu mencionou a possibilidade de doarem os órgãos, já que era a vontade dela.  E fui informada de que era muito complicado e uma burocracia enorme e que não seria possível”, comenta Rosemeire. Ela afirma ainda que o ocorrido foi um descaso da parte do hospital e um meio de o estabelecimento lucrar. A família pagou mais de R$ 25 mil reais com a internação e um imóvel precisou ser vendido para pagar a dívida.

Enquanto alguns podem doar e não o fazem, outros são impedidos devido a problemas médicos. É o caso da cobradora Thais Souza. “Eu tive alguns problemas de saúde e por conta disso não posso doar. Mas também confesso que não sei como é o processo”, diz ela. 

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Thais de Souza, cobradora. | Crédito: Caroline Purificação

Brasiliense ganha uma nova chance com o transplante de fígado

Diagnosticado com hepatite aos 8 anos de idade, Leonardo Arantes (hoje com 36 anos) teve uma infância e adolescência difíceis. Em 2021 o fígado se deteriorou e evoluiu para uma cirrose e em 2023 foi incluído na lista de espera para um rim. Logo depois, foi diagnosticado com peritonite bacteriana. No momento que recebeu a notícia que havia um doador compatível já estava em estado crítico e inconsciente.

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Leonardo Arantes, antes do transplante. | Crédito: Leonardo Arantes
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Leonardo Arantes, depois do transplante | Crédito: Leonardo Arantes

No pós-transplante vieram os novos desafios: “ reaprender a andar, recuperar minha força, minha mobilidade e minha voz, com o apoio da fisioterapia e da fonoaudiologia”, comenta ele.

Leonardo relata que a perspectiva da família mudou totalmente sobre o assunto depois do que ocorreu com ele e todos se tornaram doadores. Por fim, ele deixa uma mensagem para a população: “Seja um doador. Um gesto simples pode significar a chance de uma nova vida para alguém que está lutando para sobreviver. Converse com sua família, manifeste sua vontade”.

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