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Brasília

Quando pedalar revela um ato de amor

Claudio Van Damme começou a pedalar com Luíza, filha com deficiência intelectual, e percebeu o avanço na parte física

Afonso Ventania

09/05/2024 6h26

Claudio Van Damme com Luíza. Foto: Afonso Ventania / Jornal de Brasília

Ser pai é uma das missões mais nobres na vida de um homem. Ser pai é amar incondicionalmente, proteger e estar presente com os filhos. É ser colo e ser exemplo. A paternidade, muitas vezes, transforma a maneira de enxergar o mundo. E, em alguns casos, a reinventá-lo. Sobretudo, quando se é pai de menina. E de uma menina especial!

É o momento de se desafiar a conhecer o outro gênero, entrar em contato com o lado feminino e estabelecer uma relação baseada no cuidado e no afeto para fortalecer o vínculo com a filha. E, também, para amadurecer ainda mais como homem e, sobretudo, como um ser humano completo. É a chance de ouro de reavaliar conceitos e ressignificar a própria existência. Foi com essa consciência que o corretor de imóveis Claudio Van Damme se tornou pai da Luíza, de 25 anos. Caçula de dois filhos, ela nasceu com deficiência intelectual e passou a demandar um pouco mais de atenção.

Claudio ainda tem um filho mais velho, de 28 anos, formado em Direito. Com o tempo, Claudio, que também é ciclista, notou que a filha apresentava alguma dificuldade motora. Foi quando, em 2015, ele decidiu usar a bicicleta como meio para fortalecer os membros inferiores da filha. Feliz com o resultado positivo, três anos mais tarde, em 2018, ele procurou a instituição em que a filha é assistida, a Associação de Mães, Pais, Amigos e Reabilitadores de Excepcionais (AMPARE), e apresentou a ideia de usar a bicicleta como ferramenta de inclusão e de reabilitação entre os assistidos.

“Decidi pedalar com a Luíza de bicicleta-tandem (de dois lugares) e, como os dois precisam pedalar juntos, há um trabalho de força e de coordenação motora envolvido. Foi, então, que percebi o desenvolvimento físico dela e convidei a AMPARE a firmar uma parceria para desenvolvermos o projeto”, conta. A resposta positiva veio logo e a iniciativa foi prontamente colocada em prática na unidade da entidade que fica na 709 Norte.

Para a coordenadora-geral da AMPARE, Mirna Bueno, a ideia foi acolhida de forma unânime e é um sucesso até hoje. “É muito gratificante receber os voluntários aqui realizando um trabalho tão positivo e funcional”, comemora. De acordo com Mirna, 120 pessoas são atendidas na entidade, das quais, 30 participam do projeto.

“Apenas os assistidos do núcleo ocupacional estão aptos a participar, aqueles que têm 12 anos para cima. E as cinco bicicletas e os equipamentos que utilizamos foram doados com a intermediação do Claudio”, acrescenta.

Para a aposentada Josefa Franco, mãe de dois assistidos, a bicicleta é uma ferramenta de inclusão muito importante. De acordo com ela, tanto para a parte física quanto para a emocional de quem pedala. “Notei um desenvolvimento incrível da minha filha. Acho a ideia tudo de bom”, celebra.

Todas as quintas-feiras, das 16h às 17h, os voluntários pedalam nas imediações da sede da AMPARE, na 709 Norte, com entusiasmo e alegria. Apesar do número pequeno de bicicletas, Claudio e seus amigos dividem os assistidos em turmas para que todos tenha a chance de curtir a liberdade e o vento no rosto proporcionados pela bicicleta.

Enfermeiro ciclista

O enfermeiro, Marcos Giesteira, acompanha de perto as pedaladas semanais. Foto: Afonso Ventania/ Jornal de Brasília

Para garantir a segurança e o bem-estar de voluntários e assistidos, o projeto conta com o apoio do enfermeiro ciclista, Marcos Giesteira, que acompanha de perto as pedaladas semanais. Natural do Rio Grande do Sul e formado em enfermagem, Marcos chegou em Brasília a quase uma década e decidiu aliar sua profissão com a paixão pela bicicleta.

“Sempre tive o sonho de juntar minhas duas paixões. Quando cheguei a Brasília comecei a acompanhar diversos grupos de ciclismo para prestar uma assistência especializada e, assim, garantir um pedal mais tranquilo”, explica.

Marcos também promove ações educativas e profere palestras sobre a importância dos primeiros socorros. “É preciso que as pessoas estejam preparadas, não só nas trilhas e durante o pedal, mas no cotidiano, para salvar vidas, completa.

O enfermeiro ciclista leva sempre um estojo com instrumentos e outros itens para procedimentos básicos em casos de quedas. Segundo ele, o ciclista costuma levar um kit de ferramentas para reparar a bicicleta, mas esquece de levar um kit para cuidar de si mesmo.

Para Marcos, que também é um dos voluntários, o projeto de pedalar com os assistidos é uma troca em que todos ganham. “É uma troca muito intensa. São pessoas sensíveis que nos ensinam tanto e fico muito feliz ao vê-los evoluindo na parte da mobilidade e da socialização. É muito gratificante e um projeto apaixonante”, conclui.

Ser pai de menina, no caso de Claudio, significou não apenas estar mais presente com a filha, mas comprometer-se intimamente com a sociedade e suas necessidades. Ser pai da Luíza, o tornou um ser humano pleno e com o propósito de inspirar o próximo a criar maneiras para impactar positivamente o mundo.

Enquanto Claudio pedala para criar memórias afetivas com a filha, ele melhora a qualidade de vida de dezenas de pessoas e transforma o planeta em um lugar mais solidário e humano. Na sociedade individualista e consumista em que a humanidade vive atualmente, o giro das pernas deles renova a esperança no ser humano e revigora o bem comum e o valor da doação e do cooperativismo.

Boas pedaladas, Claudio e Luíza!

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