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Brasília

Ter uma moradia no DF vai muito além de ter um teto

Arquivo Geral

04/12/2018 7h00

Atualizada 03/12/2018 22h53

Foto: Raianne Cordeiro/Jornal de Brasilia

Raphaella Sconetto
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Qual o limite que uma pessoa se dispõe a enfrentar quando o assunto é ter casa própria? Riscos de desabamento, alagamento, choque elétrico ou incêndio são alguns dos perigos de quem mora em áreas de risco. Esse é um dos problemas a serem enfrentados pelo futuro governo na área da habitação, como mostra o JBr. em série de reportagens.

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De acordo com o último levantamento da Defesa Civil, a capital possui 41 áreas de risco em 19 regiões: Arniqueiras, Ceilândia, Estrutural, Fercal, Itapoã, Núcleo Bandeirante, Paranoá, Planaltina, Recanto das Emas, Riacho Fundo I, Setor de Indústrias e Abastecimento, Samambaia, Santa Maria, São Sebastião, Sobradinho I e II, Taguatinga, Varjão e Vicente Pires.

Segundo o coronel Sérgio Bezerra, são mais de 5,3 mil residências localizadas nessas regiões. Sendo uma média de quatro pessoas por domicílio, a estimativa do governo é de que 21 mil pessoas habitem nessas condições. “A área de risco tem características especiais. Não quer dizer que exista uma iminência de desastre ali, mas os riscos estão presentes, principalmente quando há chuva”, explica.

Apesar dos problemas, Bezerra alega que não há necessidade de retirar as famílias. “O que se espera com o estudo é que se façam obras estruturais, como sistema de drenagem, esgoto e edificações mais adequadas. Ou então, o governo pode fazer a remoção em função da disponibilidade de moradia. Retirar todos se tornaria inviável”, pontua. “É possível conviver com o risco, desde que as famílias percebam sua evolução”, completa.

A Vila Cauhy, a menos de 20 km do centro de Brasília, é exemplo real de famílias que se arriscam para ter onde morar. Quase todos os anos a região estampa a capa de jornais por conta de alagamentos, por ficar às margens do córrego Riacho Fundo. Ali, os moradores fazem adaptações nas casas para impedir a entrada da água.

A diarista Ericilha Lima, 48, mora há 17 anos no local. Sua casa fica a 40 metros do córrego. Na parede de um dos cômodos ainda tem as marcas da enchente de 2016, quando perdeu quase todos os móveis. “A água chegava na minha cintura, acho que bateu 95 centímetros. Meu fogão ficou dentro da água. Perdi sofá, cama, colchão”, lembra.

Para a cena não se repetir, a mulher subiu o piso em cerca de 40 centímetros. A pia do quintal agora é da altura de uma criança. Para entrar no quarto é preciso ter cuidado, com a diferença de nível. “Tenho medo de acontecer de novo. Quando o córrego enche, o coração fica na mão”, admite.

Questionada se sentia realizada em sua casa, Ericilha não teve dúvidas e logo afirmou: “Vim morar aqui porque não tinha condições de morar em outro lugar melhor. Mas é muito bom. É seguro e perto de tudo. Consigo pegar ônibus fácil. O problema é só na chuva, sempre sofremos”. Para ela, a regularização é o que falta, apesar do medo de perder a casa. “Disseram que casas que ficam a 30 metros do córrego serão derrubadas. A minha fica a 40m, então bate o medo. Se Ibaneis aprovar a regularização vai ser ótimo, vou poder dormir em paz”, aponta.

A casa de Ericilha Lima, na Vila Cauhy, fica a 40 metros de um córrego. Foto: Raianne Cordeiro/Jornal de Brasilia

Documentação é outro entrave na área

Desde a obtenção do alvará de construção, no início de uma obra, até a expedição da carta de Habite- se, que atesta as boas condições de moradia na entrega do empreendimento, sociedade e empresários reclamam da burocracia para que as edificações saiam do campo das ideias e se tornem reais.

Por isso, para o vice-presidente em Indústria Imobiliária do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Distrito Federal (Sinduscon-DF), João Accioly, o novo governador do Distrito Federal precisará investir na redução de todos os prazos.

“Reconhecemos que melhorou muito com o governo atual, mas ainda há muito o que melhorar. A legislação está desatualizada. Com a aprovação de novas normas, a gente espera que o processo fique mais ágil e mais seguro juridicamente. A informatização desses processos também facilitaria o andamento”, sugere.

Atualmente, a Agência de Fiscalização (Agefis) alega que o tempo médio de liberação da carta do Habite-se é de 11 dias. Esse prazo, no início do governo, já foi de 180 dias. No entanto, esse período é apenas uma parte de todo o processo burocrático.
“Esse tempo é referente apenas à primeira vistoria feita pela Agefis. Eles levantam adequações importantes ou não, e é no cumprimento dessas exigência que o processo demora muito, porque depende da articulação da Agefis com as administrações regionais”, explica João Accioly.

Até oito meses

Segundo o vice-presidente do Sinduscon, no mercado imobiliário há relatos de empresários que conseguiram o Habite-se em três meses – tempo considerado rápido -, mas outros somente o obtiveram após oito meses.

“A gente percebe que a Agefis e as administrações se esforçam, muitas vezes há toda a documentação e exigências corretas, mas falta comunicação entre elas. Esse é o nosso maior problema”, reitera.

Espera

Por conta da demora, Accioly lista quais são os prejuízos da demora: “Corremos risco de pagar multas e até perder vendas”. “No setor da construção civil, temos prazos a serem cumpridos. Quando assumimos o prazo de entrega é, de fato, a entrega do imóvel pronto para morar, com o Habite-se”, acrescenta.

“A gente se programa para terminar a obra com antecedência contando com a demora para liberar o Habite-se, de modo que possamos cumprir com o prazo de entrega aos compradores”, completa ele.

Duas mil unidades pendentes

Enquanto a atual gestão alega que há 50 solicitações de vistorias, que demoram uma semana para serem distribuídas, a Associação de Empresas do Mercado Imobiliário do DF (Ademi- DF) estima duas mil unidades pendentes com o atestado de condições da moradia. Apesar disso, Paulo Roberto Muniz, presidente da associação, reconhece que há um esforço sendo feito para que os números diminuam.

“Tivemos um trabalho muito árduo junto à CAP (Central de Aprovação de Projetos), onde os serviços foram centralizados, e com a Agefis. Um último levantamento que fizemos mostra que demandamos em torno de 17,3 mil unidades, residenciais e comerciais, nos últimos anos. Achamos que é importante dar continuidade ao trabalho que é feito na CAP, dando mais autonomia e celeridade aos processos. Assim como o trabalho da Agefis, de combate à grilagem e construções ilegais na cidade, que é extremamente importante”, acrescenta Muniz. O presidente da Ademi ainda cita a liberação de novas áreas para a expansão do mercado imobiliário.

Paulo Muniz, presidente ADEMI. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília.


Promessas

O QUE IBANEIS PRETENDE FAZER?

Em seu plano de governo, Ibaneis Rocha (MDB) cita o déficit habitacional. Para solucionar o problema, ele propõe a construção de unidades destinadas a famílias que tenham renda bruta de até R$ 4 mil. Os primeiros projetos acontecerão no Itapoã Park, Parque das Bênçãos (Recanto das Emas), Crichás (São Sebastião), QNR (Ceilândia), Quadras 100 (Samambaia), Centro Urbano (Recanto das Emas) e Nova Colina (Sobradinho).

O governador eleito também promete reestruturar os processos de licitação e venda direta de imóveis junto à Terracap e ao Banco de Brasília (BRB), para que possam ser mais rápidos e competitivos. Além de criar linhas de crédito para viabilizar o financiamento de propriedade regularizadas.

Ibaneis comprometeu-se também a construir casas para agricultores familiares que tenham renda bruta mensal de até um salário mínimo, e dar prioridade às novas áreas habitacionais ao fornecimento de água, saneamento, pavimentação, energia e transporte.


Saiba Mais

À reportagem, a atual gestão não deu detalhes de como está o processo de regularização da região.

Em nota, a Terracap informou que o projeto de regularização da Vila Cauhy, segundo a Codhab, está em andamento na Central de Aprovação de Projetos (CAP) para análise.

 

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