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Brasília

Fragilidades e malandragens: golpe da pirâmide mira mulheres

Mandala da Prosperidade promete ganhos a quem indica novas participantes para esquema

Pedro Marra

19/08/2020 7h34

Com investimento inicial de R$ 5 mil e a promessa de lucro financeiro oito vezes maior, um golpe batizado de Mandala da Prosperidade ou Tear dos sonhos tem feito várias mulheres de vítimas na internet. O grupo teria a finalidade de arrecadar dinheiro para supostamente ajudar as participantes.

Cada uma teria direito a receber uma quantia. Por trás de discursos de solidariedade, confiança entre mulheres e desenvolvimento pessoal, o esquema nada mais é que a famosa pirâmide.

Após ser cooptada, a vítima é direcionada a uma outra mulher que se passa por atendente, entra em contato com a interessada por mensagem com um convite para algo lindo, maravilhoso que mudou a vida dela. “Ela vai te contar uma história de superação e dizer que pensou em você de forma intuitiva, que você veio na cabeça dela ou em um sonho, que ela se conectou com você na meditação, coisas desse tipo. Ela vai te convidar para um grupo de mulheres incríveis que ajudam umas às outras e não vai falar nada de dinheiro nesse ponto. Apenas da irmandade, da sororidade (solidariedade entre as mulheres), da abundância contra a escassez, do poder de união das mulheres”, diz a youtuber Sheylli Caleffi, uma das que denunciou o esquema.

Segundo ela, as principais vítimas são mulheres que acabaram de terminar relacionamentos, perderam o emprego, jovens mães no puerpério ou mulheres grávidas. “Como o discurso é focado em sonhos — como se esse fosse o objetivo do grupo que se fará super presente na sua vida, te dando uma super atenção, desde que você pague e traga mais gente para o esquema —, qualquer mulher que está com um problema grande e que o dinheiro pode ajudar a resolver se torna um alvo delas. Mas elas nunca vão te dizer isso diretamente”, explica.

Em seguida, Sheylli conta que é feito um convite para uma reunião on-line pela plataforma digital Zoom, onde muitas mulheres vão dar apoio emocional e vão querer saber sobre os sonhos da interessada pelo investimento. “Vão perguntar sobre sua vida e vão contar histórias muito comoventes de como suas vidas mudaram após darem o sim para a Mandala. Em certo ponto, entra o valor em dinheiro, que nunca chamam de dinheiro, mas de presente ou ‘regalo’ (presente, em espanhol). Elas vão falar de doação, que doar para uma mulher realizar o sonho dela é algo altruísta e lindo de sua parte, e que é dando que se recebe. Elas vão explicar que você doa por volta de R$ 1.400 para uma mulher que está no centro de uma mandala. Mas têm mandalas de R$ 100 a R$ 8 mil. Aí você recebe a sua doação e de mais sete mulheres, e que quando você chegar a esse mesmo ponto você também ganhará isso”, acrescenta.

Sheylli diz ainda que prometem à mulher já inserida no esquema mais R$ 5 mil por cada nova investidora. Mas com uma condição: somente quando essas novas integrantes chegarem ao centro da Mandala também. “Existe uma falácia de que é um movimento antigo com mais de 400 mil pessoas envolvidas no mundo. Mas esse é um modelo mais moderno de pirâmide formado por várias pirâmides pequenas. Basta oito salafrárias dizerem que fazem parte disso que elas começam a roubar quem vem depois e é isso que acontece. Grupos de mulheres espertas que já entenderam a matemática”, reclama a youtuber.

Dinheiro a juros de 200%

A denunciante informa também que no momento em que a mulher aceita participar do esquema, as outras comemoram e pedem para a interessada fazer o depósito em até sete dias na conta da mulher do centro, que chamam de água. “Aí tem muita conversa fiada de elementos da natureza envolvido. Pedem para assinar uma carta de doação de acordo com o modelo que elas mandam. Levar mais duas mulheres para esse golpe que elas chamam de movimento ou oportunidade de crescimento. Participar dos grupos de WhatsApp, grupo da tríade, grupo geral, grupo da força da deusa, grupo de reza e nomes como esses. Muitas vezes, também é sugerido que você escreva uma ‘carta do coração’, onde descreve os motivos emocionais de doar, e que será esfregada na sua cara quando você tentar sair. Também há uma carta de medos que você vai queimar num ritual online junto com elas”, relata Sheylli.

As perguntas sobre contas e dinheiro são atreladas a frases como “cuidado com suas crenças limitantes”; “você pode materializar isso”; “dinheiro é uma energia neutra”; “você provará para si mesma que consegue”. Mesmo se a mulher não tiver, as golpistas dão dicas de como emprestar R$ 250 de 20 pessoas diferentes. “A agiotagem corria solta com elas mesmas emprestando dinheiro a 200% de juros, mas não está mais rolando isso porque o golpe está todo quebrado. Ninguém consegue mais pessoas com esse valor e já existem grupos com 250 pessoas que estavam em mandalas diferentes tentando desesperadamente reaver seus valores. Como tudo já está indo pelos ares há tempos e elas precisam camuflar o dinheiro no sonho, hoje fazem concessões: no lugar de dar o valor total em dinheiro, você pode comprar uma passagem para a mulher do centro [da mandala] viajar se esse for o ‘sonho’ dela ou bancar outras despesas”, finaliza.

“Querem até cópia do RG”

“Me chamaram também. Ouvi a proposta, aceitei, mas depois que você fala o sim é que elas falam dos seguintes passos. Então percebi que o buraco era mais embaixo e estava muito parecido com um esquema de pirâmide. Querem até cópia do RG para protestar o nome se não pagar o ‘regalo’. Tô fora!”, protesta uma investidora do golpe.

“Fui convidada, assisti ao blá blá blá muito lindo dessas mulheres e achei incrivel elas pensarem que eu iria dar esse dinheiro assim, sem motivo algum. Que pena, nesse mundo, mulheres sozinhas e perdidas serem exploradas por outras mulheres. Isso nao é ser irmã, isso é roubo! Se aproveitar de uma ‘sister’ que não está bem. Que pobreza espiritual”, expõe outra mulher.

A assessoria de imprensa da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) diz ainda não ter informações sobre esse golpe.

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