Brasília se despede de um astro. Não qualquer um, mas o primeiro astro da capital. Natural de Inhumas (GO), Fernando Lopes morreu, nesta terça-feira (4), aos 93 anos, em Brasília, onde passou a maior parte da vida.
No início da carreira, o jovem intérprete de músicas românticas transitava entre Inhumas (GO) e Goiânia, assim como de profissão. Quando anoitecia, o gerente de uma loja de tecidos dava lugar ao artista de timbre encorpado, característica comum aos seus antecessores — cantores como Silvio Caldas, Orlando Silva e Carlos Gardel.
O destaque veio rápido. Em 1959, com apenas 21 anos, foi contratado pela Rádio Nacional de Brasília e, devido ao carisma, logo fez amizade com o então presidente Juscelino Kubitschek.
Com voz de saudade, o também artista Tião Rodrigues conta com detalhes as lembranças do amigo. Os dois se conheceram em 1971, um ano após Lopes deixar a rádio e migrar para a TV Nacional, onde apresentava um programa de Show de Talentos.
“Ele veio para cá também porque era muito complicado trazer artistas do Rio de Janeiro. Ele veio como o primeiro artista contratado da Rádio Nacional. Ele é formado em canto pela Escola Técnica de Goiânia. Era um tempo em que as escolas técnicas formavam músicos. Também era um período em que os cantores mexicanos, como Miguel Aceves Mejía, eram bem populares no Brasil, antes mesmo da bossa nova”, detalhou.
Rodrigues contou ainda, em entrevista ao Jornal de Brasília, que Fernando Lopes é o nome artístico. Isso porque lhe disseram que “Eduardo Gomes” não caía bem como alcunha para um cantor da época. Em pouco tempo, o novo nome se tornou conhecido.
“Ele veio como uma grande atração e se destacou tanto, que, na sequência, virou o cantor favorito do JK, a ponto da Sarah Kubitschek olhar para ele e brincar: ‘já vai levar meu marido para farra'”, lembrou.
A cidade ainda estava em construção, e a Rádio servia de ponte entre os trabalhadores da nova capital e seus familiares, que moravam em diferentes regiões do país. Além disso, o veículo teve outro papel fundamental.
“Foi através dos chamamentos da Rádio Nacional, da nossa participação no acampamento, que nós fazíamos o convite para o nordestino, para ajudar Juscelino a construir a capital da República”, disse Lopes em entrevista à EBC (Empresa Brasil de Comunicação) em 2022.
Lopes permaneceu em Brasília e, em 1970, na TV Nacional, virou apresentador.
“Ele era um homem bonito e elegante, com ternos feitos por alfaiates e sapatos sempre impecáveis”, contou Rodrigues.
Racismo
Mesmo tendo carisma, elegância e popularidade, Lopes ainda precisou ter jogo de cintura para lidar com algumas situações. Como na época as rádios eram mais populares que a TV, muitos não o reconheciam.
“Teve um momento em que ele foi jantar no Hotel Nacional, e o gerente pediu para ele entrar pela porta dos fundos. Depois isso foi superado, porque ele ficou sabendo que o Lopes era o cantor da Rádio Nacional. Foram situações que ele sempre tirou de letra”, explicou Rodrigues.
Para situar a relevância artística do amigo, Rodrigues faz o seguinte paralelo: “Ele superou essa questão porque se tornou um astro de Brasília. Um cara não vai fazer uma coisa desse tipo com um Pelé ou um Ronaldinho Gaúcho da vida”.
Despedida
Lopes amou a música intensamente e nunca deixou de cantar. Cantava três ou quatro músicas no Bar Grau e também foi responsável por lotar o Feitiço Mineiro. Mais de 100 pessoas ainda ficaram de fora, por terem chegado um pouco mais tarde. O show contou ainda com a presença de Paulo Pestana e Heraldo Pereira.
Fernando Lopes será enterrado na tarde desta quarta-feira (5), entre amigos e familiares.