Mais de uma semana depois de uma luta que tomou conta do noticiário esportivo, o que fica não é o resultado em si, mas o retrato escancarado de uma distorção que atravessa o mundo das lutas. Jake Paul faturou alto, mesmo saindo do ringue com o maxilar fraturado em dois pontos, após enfrentar Anthony Joshua em um evento promovido pela Netflix e exibido para uma audiência planetária.
A bolsa conjunta da luta chegou a cerca de 92 milhões de dólares. Um número que, por si só, ajuda a entender por que o boxe-espetáculo segue crescendo. O combate foi vendido como entretenimento global, não como uma disputa esportiva clássica. Paul é o centro do negócio, o promotor, o personagem e o produto. O risco físico existiu, desta vez de forma real e até perigosa, mas o retorno financeiro estava garantido antes mesmo do primeiro soco.
Esse modelo explica também por que suas lutas sempre caminham ao lado da suspeita. O confronto anterior contra Mike Tyson, encerrado em empate, ainda hoje é tratado por muitos como marmelada. Tyson teria recebido cerca de 5 milhões de dólares, e a desconfiança é que não tenha ido com tudo para não destruir o espetáculo e o personagem. Não há prova, mas a sombra da encenação acompanha esse tipo de evento.
O contraste fica brutal quando se olha para o UFC. Ali, não há roteiro, não há proteção e não há margem para atuação. O brasileiro Alex Poatan construiu sua carreira enfrentando a elite mundial do MMA, acumulando cinturões, nocautes e lutas duríssimas, sempre sob risco real. Ainda assim, seus ganhos ao longo de anos ficam muito distantes do que Jake Paul e seu adversário arrecadaram em uma única noite.
A desigualdade não está apenas no dinheiro, mas no conceito. De um lado, o espetáculo planejado, barulhento e altamente lucrativo. Do outro, o esporte de verdade, que exige excelência técnica, entrega violência real e recebe uma fatia bem menor do bolo.
Quanto Alex Poatan já ganhou no UFC
UFC 276
Vitória por nocaute contra Sean Strickland
Bolsa: 76 mil dólares
UFC 281
Vitória por nocaute contra Israel Adesanya e conquista do cinturão
Bolsa: 500 mil dólares
UFC 287
Derrota por nocaute para Israel Adesanya
Bolsa: 500 mil dólares
UFC 291
Vitória por decisão contra Jan Blachowicz
Bolsa: 316 mil dólares
UFC 295
Vitória por nocaute contra Jiri Prochazka e conquista do cinturão
Bolsa: 556 mil dólares
UFC 300
Vitória por nocaute contra Jamahal Hill e defesa do cinturão
Bolsa: 2,8 milhões de dólares
UFC 307
Derrota por decisão para Magomed Ankalaev e perda do cinturão
Bolsa: 3 milhões de dólares
UFC 313
Vitória contra Magomed Ankalaev, recuperação do cinturão
Bolsa: 3 milhões de dólares
Total acumulado no UFC, a partir da terceira luta: cerca de 14,3 milhões de dólares, sem bônus, patrocínios ou participação em pay-per-view.
No fim, a conta é simples e incômoda. Um influenciador fratura o queixo, perde a luta e sai milionário. Um campeão do UFC constrói uma carreira inteira no mais alto nível para chegar a números muito menores. É essa disparidade que segue alimentando o debate — e mostrando que, no mundo das lutas, nem sempre quem luta mais duro é quem ganha mais.