Em pleno século XXI o mundo parou, e ao contrário do que o mais futurista dos futuristas poderia prever, não foi pelo bug do milênio ou por uma guerra mundial. Paramos por um vírus. Um minúsculo organismo gerou uma pandemia, algo impensado diante de tanto avanço médico e tecnológico. Nem o pior dos pessimistas acreditaria se lhe contássemos.
Mas, diante de tamanho absurdo, me chama atenção aaquilo que venho falando há anos em palestras, reuniões ou mesmo em um simples bate-papo entre amigos. É a primeira vez que convivemos em sociedade, e de forma ativa, com quatro gerações ao mesmo tempo. Temos em uma mesma família, bisavô, avô, pai e filho convivendo em todos os sentidos.
A pandemia aumentou o contraste entre as gerações. O simples fato de estarmos em um isolamento potencializou não só a diferença geracional, mas também, acima de tudo, a resiliência geracional. Nossos jovens não estão sabendo lidar com os recentes acontecimentos, não paramos de ler nas redes sociais a respeito de possíveis problemas mentais ocasionados pelo isolamento a que fomos todos submetidos.
Não bastasse a angústia que vivemos com as incertezas nas áreas de saúde e economia, o isolamento social tem se tornado motivo de desespero de igual valor à iminência da doença.
O ópio da nova geração teve seu fornecimento suspenso, na medida em que a cada segundo as redes sociais foram invadidas por milhares de informações a respeito da covid-19, não dando espaço para os famosos likes, emojis e sorrisos de eterna felicidade postados ativamente por esta mesma geração. Geração que agora agoniza em real estado de abstinência, à espera de um momento para retornar ao que Aldous Huxley chamou de “pílula da felicidade”, em seu clássico romance Admirável Mundo Novo (1931).
A sociedade líquida de Zygmunt Bauman se escancara diante da liberdade imposta pela falta de liberdade do simples ato de ir e vir. Acostumados com o controle que lhes é dado no mundo virtual, os jovens se perderam no mundo real que a pandemia impôs do dia para a noite. A ferramenta utilizada para vencer a dor da solidão não esta sendo suficiente para vencer a dor do convívio.
No isolamento do lar não foi possível bloquear, deletar aqueles que lhe incomodaram. Não se pode ser seu próprio juiz no mundo real, é preciso conviver. E para nova geração, não estar feliz, estar mal e não poder atingir a máxima potencia de “likes” diários, foi e é para muitos inadmissível.
O confinamento expôs a solidão diária de nosso viver. Entretanto, a solidão aparentemente afetou e ainda tem afetado mais aqueles cuja cláusula pétrea do viver era a felicidade virtual. Como bem aborda Leandro Karnal, para aqueles que vivem a era da liberdade de escolha de forma intensa é inadmissível aceitar a reclusão, afinal, não precisam de convivência para serem felizes, toda solução para as mazelas da humanidade estão nas redes sociais.
O real venceu o virtual. Não temos poder para bloquear o vírus e suas consequências. Não adianta falsos perfis, nem avatares, o vírus não é cibernético. Não temos como diluir nossa responsabilidade na rede, por mais que muitos tenham tentado. Não adianta insultar, xingar, berrar, que de nada adiantará o lamento, se a ação não for concreta, real e acima de tudo pessoal.
Ao contrário do que muitos podem pensar com o tom deste texto, não culpo e nem reprovo a nova geração, afinal, são apenas diferentes formas de pensar e agir, diante de uma mesma situação. Meu ponto está na capacidade de superação que nos foi sendo imposta pela vida, que não aceita fantasia. Vida que, por ser real, nos repele o virtual.
Realidade que se apresenta sem nossa permissão, ou pior, sem que tenhamos qualquer controle sobre ela. O que me leva a lembrar do conselho de meu avô, bisavô de meu filho e tataravô de meu neto: “Calma, meu filho, o que não tem solução, solucionado está.”
Até a próxima…