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Ciência da Psicologia
Ciência da Psicologia

Ideologia, um vespeiro carregado do efeito Dunning-Kruger

É impressionante como a rigidez cognitiva criada pelos processos ideológicos se entranham nas mentes como um parasita, cegando seu hospedeiro

Demerval Bruzzi (CRP 01/21380)

11/07/2023 11h59

Imagem ilustrativa

Demerval Guilarducci Bruzzi
CRP 01/21380

Na coluna da semana passada, trouxe um tema de extrema relevância social e cientifica — além de muito polêmico — que tem trazido muito sofrimento a muitas pessoas mundo afora. Justamente por ser polêmico, deixei claro desde o inicio que me pautei no Código de Ética Profissional do Psicólogo e que eu não estava opinando, mas replicando um fato histórico acerca do psicólogo John Money e de um estudo cientifico com símios.

Ocorre, como era de se esperar, que os “intelectuais” de plantão, ideologistas que provavelmente fariam parte dos estudos de David Dunning e Justin Kruger, iniciaram uma série de ataques sem sentido. Pior: sem sequer entender que o que eu estava abordando, em alguns casos, era exatamente o que eles defendiam.

Par ser ter uma ideia do que estou falando, reproduzo aqui um trecho da coluna da semana passada:

“Sempre que trato deste ou de outros temas cuja resposta se embasa na frase: ‘Isso é uma construção social’, falo aos meus alunos: se é uma construção social, quero conhecer o arquiteto e o engenheiro para saber seus reais interesses.”

Este trecho rendeu o seguinte comentário de uma leitora em um grupo de psicólogos numa rede social:

“Quem seria o arquiteto e o engenheiro dentro desse contexto, Dr. Demerval G. Bruzzi? Na sua opinião, né?! Porque, sim, isso é apenas a sua opinião. Ou você está afirmando como psicólogo, na coluna de um jornal, sem qualquer tipo de embasamento científico, que construções sociais coletivas e estruturais não existem?”

É impressionante como a rigidez cognitiva criada pelos processos ideológicos se entranham nas mentes como um parasita, cegando seu hospedeiro. Pois esta pessoa acima e eu estamos criticando exatamente a mesma coisa. Afinal, se é uma construção social, ela atende a algum interesse, assim sendo, quero conhecer o arquiteto ou engenheiro deste processo para tentar entender seus reais objetivos.

É isso que ensino a meus alunos: a não serem passivos às diversas informações que recebem diariamente durante sua formação, e neste caso, inclusive às que eu passo a eles.

Ainda sobre o comentário que recebi, note, abaixo, que a leitora continua questionando a fala sem se atentar que estamos tratando das mesmas coisas, e pior ainda, ela me alerta para uma construção social que adotei na escrita ao tratar no masculino e não no feminino, uma vez que todos os substantivos podem, invariavelmente, ser classificados em masculinos e femininos dentro da língua portuguesa. Em geral, temos por regra que todos os substantivos masculinos são caracterizados pela desinência “o”, enquanto os substantivos femininos são classificados pela desinência “a”. Assim, para não ser vitima da construção social criticada, eu deveria ter escrito arquitetos(as), ou mesmo arquitetas(os).

“Concordo que a coluna não deve ser um ponto de verdade, mas, como psicólogo e representante da classe, seria bom ter mais cuidado e escolher melhor as palavras. Se não tiver sido uma construção social que te faz falar e escrever “arquitetos e engenheiros” ao invés de “arquitetas e engenheiras”, não sei o que poderia ser. Não tenho a paciência e nem o intuito de te ensinar nada, mas gostaria de deixar registrado a minha total discordância em relação ao seu posicionamento duvidoso. Paz.”

Ter um olhar critico é fundamental a um psicólogo cujo um dos treinamentos é buscar a neutralidade, sem julgamento, a fim de evitar levar sua opinião, em especial, por não se tratar dele e sim do outro. Quando comentei na discussão sobre essa busca pela neutralidade, outra colega se posicionou:

“Antes de ler isso aqui, eu pensava que já era passado a crença no mito da neutralidade científica e pedagógica, hahaha. Até mesmo não se manifestar é tomar um posicionamento… e acredito que o Demerval, a partir disso, tomou um posicionamento em suas escolhas de referências para esse texto.”

Sabemos que a isenção, ou melhor, a neutralidade, é algo complexo e de difícil alcance para a maioria de nós, para não dizer todos. Por isso, existe o método. E com relação ao posicionamento citado, é claro que me posicionei, pois o objetivo do texto da semana passada foi exatamente mostrar que meu posicionamento é apresentar a complexidade e seriedade do tema e, de certa forma, “alertar” as autoridades competentes da necessidade de aprofundamento nos debates.

Ainda sobre neutralidade e método, neste sentido, procuro sempre me pautar nas quatro causas de Aristóteles: (causa material, causa formal, causa eficiente e causa final), a fim de evitar meu próprio viés a respeito do tema estudado/pesquisado.

Mas, a cada dia, aportam em nossas universidades pessoas carregadas de ideologias que, como vespas, atacam ao menor sinal de perigo, e é esta a critica que faço na coluna de hoje. Para estas pessoas, qualquer opinião que não atenda aos seus princípios ideológicos é um perigo.

E o mais engraçado nas diversas mensagens recebidas é que são comentários de psicólogos que, feridos em suas ideologias, partiram para ataques cegos, como sempre o fazem, sem sequer conseguir entender o que estavam criticando, na intenção única e exclusivamente de proteger seu mundo socialmente construído.

Parece-me que se esqueceram que outro grande pilar da psicologia é a empatia. E antes que o amigo(a) leitor pense que empatia é se colocar no lugar do outro, já informo que não: empatia é, antes de qualquer coisa, acolher com respeito o que o outro te diz — e este é o maior desafio, pois trata-se de acolher com respeito o que o outro diz sob a referência do outro e não a sua.

Como disse no início deste texto, era de se esperar tais comportamentos, afinal, de acordo com o senso da psicologia, mais de 80% dos psicólogos(as) possuem apenas graduação, o que provavelmente faz com que se retroalimentem de conteúdos com os quais se identificam e acreditam, fortalecendo ainda mais o efeito Dunning-Kruger em suas mentes.

Até a próxima…

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