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Ciência da Psicologia
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Efeito Dunning Kruger: do que se trata?

O avanço dos meios de comunicação tem também alavancado o aumento das fake news, que, por sua vez, tem proporcionado um aumento exponencial do Dunning Kruger. Mas afinal, do que trata este efeito?

Demerval Bruzzi (CRP 01/21380)

18/07/2023 10h05

Na semana passada, mais uma vez, a coluna foi recebida com certa dose de raiva em determinado grupo. Mas como o objetivo desta coluna é levar conhecimento por meio da ciência da psicologia e não entrar em debates ideológicos infrutíferos, vamos tratar hoje do efeito Dunning Kruger e sua parcela no desmonte do conhecimento.

O avanço dos meios de comunicação tem também alavancado o aumento das fake news, que, por sua vez, tem proporcionado um aumento exponencial do Dunning Kruger. Mas afinal, do que trata este efeito?

De acordo com Costa (2019), trata-se, na realidade, de uma síndrome estudada por dois psicólogos da Universidade de Cornell, chamados Justin Kruger e David Dunning, que a descreveram em um artigo original publicado no final dos anos 1990 sob o título de “Unskilled and Unware of it: How difficulties in recognizing one´s own incompetence lead to inflated self-assessments” (ou “Sem talento e sem noção: como as dificuldades no reconhecimento da própria incompetência levam a autoavaliações inflacionadas”, numa tradução simples). Os autores concluíram, no estudo, que ” a ignorância, com mais frequência do que o conhecimento gera confiança”.

Guzzo (2018) afirmou que “Esses autores ficaram intrigados com a história de um ladrão que havia roubado dois bancos à luz do dia, sem disfarce ou qualquer outra tentativa aparente de esconder a sua identidade. O homem, Sr. Wheeler, preso na noite do mesmo dia dos roubos, parecia incrédulo com o fato de que a polícia o havia reconhecido e pego, pois ele havia esfregado suco de limão no rosto e isso, acreditava, o tornaria invisível para as câmeras de vigilância” (GUZZO, 2018, p. 78).

Já para Miguel (2017, p277): “O Efeito Dunning-Kruger, também chamado de Efeito de Superioridade Ilusória, é a expressão empregada para designar a ignorância, a incapacidade, a inconsciência ou falta de
habilidade das pessoas em reconhecer a própria incompetência e seus erros, bem como em estimar a dificuldade de tarefas e atividades nas quais estão envolvidas” (MIGUEL).

Das diversas definições, me atrai mais a de Alvez (2018), que afirma que: “Enquanto uma tendência cognitiva (ou viés cognitivo), o Efeito Dunning Kruger apresenta-se como uma limitação de ordem metacognitiva. Esta pode ser capaz de nos impedir de apreender e compreender a realidade, os fatos, as situações em que nos encontramos, porque, de início e na maioria das vezes, preferimos nos agarrar às nossas crenças, opiniões, preconceitos e intuições. Por consequência, isto pode estimular ações desastrosas, fomentar comportamentos inapropriados, promover atitudes execráveis e levar a péssimas decisões.”

Analisando o exposto, fica mais fácil entender o motivo de grande parte das pessoas atacarem os mensageiros ao invés de debaterem a respeito dos temas complexos. Isso ocorre primeiro por acreditarem que só a visão delas é a correta; e segundo, por não terem flexibilidade cognitiva. Isso faz com que sempre leiam as mesmas coisas, sigam os mesmos grupos, sempre na intenção de ler, ouvir e aprender apenas aquilo que lhes é apropriado e confortável.

Diante do efeito Dunning Kruger, não existe o método cientifico, existe apenas o método que atenda as expectativas dos protagonistas contaminados pelo efeito. Para eles, um artigo ou um capítulo de livro é ciência, e não há o que se discutir.

Não só por pensarem assim, mas em especial por acreditarem no que pensam, é que diversas desinformações se tornaram verdades absolutas, como, por exemplo, a pirâmide de Maslow, vista em milhares de livros por todo o mundo. Entretanto, a hierarquia de necessidades de Maslow é uma teoria da psicologia proposta por Abraham Maslow em seu artigo “A teoria da motivação humana”, publicado em 1943 na revista Psychological Review. Maslow nunca se referiu a ideia da pirâmide como representação de sua teoria. Apesar da popularização do esquema em formato de pirâmide, a representação proposta foi elaborada por Charles McDermid em 1960, em uma adaptação da verdadeira teoria de Maslow.

Ou ainda a ideia de empatia como sendo a capacidade de se colocar no lugar do outro, quando, na verdade, trata-se da capacidade de acolher com respeito o que o outro te diz, sob a referência do outro e não a sua referência.

Assim, como o leitor pode observar, as tecnologias crescentes nos meios de comunicação potencializaram o efeito Dunning Kruger, contaminando milhares de pessoas das mais diversas classes, cuja resposta frequente frente ao desconforto de ser questionado é a agressão, o ataque sem qualquer conexão com o assunto/fato debatido. Assim, palavras como “babaquice”, “idiota”, “comunista”, “fascista”, surgem como contraponto, ao invés de argumentos.

A ideia daqueles que ignoram o verdadeiro sentido de ciência não é o debate, e sim a imposição forçada de suas narrativas, transmutando opiniões duvidosas em fatos concretos. Isso pode ser facilmente entendido ao lermos o levantamento ‘Education at Glance 2022’, elaborado pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), onde é apontado que, no Brasil, apenas 21% dos jovens entre 25 e 34 anos concluíram o Ensino Superior. E ao terminar os estudos da graduação, o brasileiro não passa para as próximas etapas de estudo. No país, apenas 0,84% dos jovens entre 25 e
64 anos com Ensino Superior completo possuem mestrado — a média da OCDE é de 14,33%. Já no doutorado, a média brasileira é de 0,11%, uma grande diferença da média da Organização, que é de 0,84%.

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