Thaise Mandalla é musicista, compositora e professora. Tem música na veia desde a infância e, aos 17 anos, começou a atuar profissionalmente. Para executar e registrar suas composições, Thaise formou a Mandalla’s Band, em meados de 2017. Além das músicas autorais, a banda propõe-se a fazer releituras de grandes canções dos estilos Blues, Jazz e Folk.
“Ainda criança, eu já brincava de compor. Pegava meu bloquinho, deitava na rede e escrevia versinhos sobre amor e amar. Tudo muito pueril, mas ali já tinha a vontade de expressar sentimentos por meio de palavras. Para mim, sempre foi natural, mas somente na fase quase adulta que fui perceber o impacto social e a não aceitação de uma mulher que fala o que quer, ou melhor, canta o que quer”, revela Thaise.
Quais as principais lembranças que você tem da sua infância?
Nasci no interior de São Paulo e depois me mudei para o interior de Minas Gerais, Bebedouro e Guaxupé, respectivamente, cidades próximas com paisagens e culturas parecidas. São cidades pequenas, pacatas, com a música sertaneja bem em evidência. Brinquei muito na rua e cheguei a ver reinado na rua de casa. Tenho lembranças fortes. Mas não lembro quando de fato a arte entrou em minha vida, porque a sensação é de que ela sempre esteve. A música sempre foi completamente marcante para mim. Mas, para mencionar, me recordo de aulas de iniciação musical, aos 7 anos, e de cantar junto às músicas das rádios ao microfone que ganhei dos meus pais.
Você começou a compor bem cedo. Como você enxerga essa posição de poder, sendo mulher, de contar as próprias histórias e reivindicar esse espaço de autoria?
Ainda criança, eu já brincava de compor. Pegava meu bloquinho, deitava na rede e escrevia versinhos sobre amor e amar. Tudo muito pueril, mas ali já tinha a vontade de expressar sentimentos por meio de palavras. Para mim sempre foi natural, mas somente na fase quase adulta que fui perceber o impacto social e a não aceitação de uma mulher que fala o que quer, ou melhor, canta o que quer. Desde os namorados até parceiros de banda, o incômodo (dos homens, sobretudo) estava presente.
E como é seu processo criativo na hora de compor?
Quanto mais se compõe, mais fluidez o processo ganha. Eu já parti do processo de estar inspirada para compor movida por emoções, sejam alegres ou tristes, porém, hoje é um processo mais automático. Se preciso compor um som novo para um novo álbum, eu sento com o instrumento, seja violão, guitarra ou cigar box, e componho. Ser professora de música ajudou muito nesse processo, pois estou sempre tendo que criar para com os alunos.
Você estudou flauta doce, percussão, violão, piano e até guitarra. Como esses prazeres de entender de cada um desses instrumentos te influenciam?
Comumente me perguntam qual meu favorito. Acho impossível escolher, pois todos são instrumentos de diversão. Cada forma de se expressar (pelo sopro, com as mãos ou com as baquetas) traz uma magia, e saber a técnica do instrumento auxilia a nos expressarmos de forma mais fidedigna ao que estamos querendo passar. E quando essa magia acontece, independente de por qual instrumento, o prazer é inexplicável!
E essa paixão pelo blues…
Eu já ouvia rock e pop com meus pais, como Beatles, Led Zeppelin e Michael Jackson. Então, os derivados do blues eu conheci ainda bem criança, mas com os companheiros da minha primeira banda, aos 17 anos, eu tive acesso a B. B. King, Albert King, Etta James, Aretha Franklin, Sister Rosetta Tharpe, e aí o arrebatamento foi total. De forma empírica, naquele momento eu percebi que ali estava a raiz de tudo, e depois, estudando a história do blues e da música mundial, eu soube de forma cognitiva.
Até chegar à Mandalla’s você passou por outras bandas e projetos. Como isso te acrescentou como musicista?
Cada relação, porque banda é relacionamento em grupo (risos), nos ensina muito. Ensina sobre o que queremos, sobre o que não queremos, sobre como conduzir nossos processos pessoais e saber expressar o que sentimos… sem dúvida, para mim, enquanto mulher, o maior aprendizado nessas relações, para além da música, foi saber dizer não.
E como foi a construção da Mandalla’s Band? Inclusive, vocês já passaram por diversas formações…
Ainda sobre o processo de dizer não, a inicialmente Mandalla’s Band foi exatamente esse exercício. Parar de só ouvir ‘não’ é também dizer os meus ‘nãos’. Eu estava cansada de não ter espaço nos projetos para imprimir minha identidade, tocar minhas composições. Estava cansada de ter que caber dentro do projeto dos outros. Então, criei o meu, com meu nome, para não haver dúvidas de que ali eu faria (e faço) o que eu quisesse.
Vocês acabaram de representar o Brasil no “Quito Blues Festival”, realizado no Equador…
Sim, e essa foi a segunda vez que fomos representar o Brasil nesse festival. Em maio deste ano, inclusive, trouxemos o festival para o nosso país. Eu teria que escrever por um tempo para contemplar tudo que sinto e que tenho a dizer sobre essas experiências, porque, de certa forma, é a materialização de um sonho: viajar com meu trabalho levando meu som para além de fronteiras. O intercâmbio cultural é algo que me fascina!
Vocês estão preparando algo ainda para este ano?
Estamos! Ainda em setembro, estamos completamente dedicados em finalizar e lançar o álbum Capoeira’n’Blues, um álbum de dez faixas que traz a fusão de dois estilos regionais emblemáticos, frutos da diáspora nas Américas: o blues e a capoeira. Eu aprovei um projeto do Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal (FAC-DF) para isso e já estamos com o trabalho bem encaminhado. Em novembro, estará nas plataformas digitais.
Junto com outras artistas, você criou o “Blues Dellas”. Para a cena cultural do DF, qual mensagem e importância que você vê no projeto?
O “Blues Dellas” completou sua quinta edição recentemente. Foram três no Clube do Choro de Brasília e duas em festivais renomados da cidade. A potência e o poder de mulheres/artistas quando se juntam é indescritível! A mensagem do projeto é enaltecer mulheres do blues, que sempre escreveram a história, porém ficaram à margem das notícias.
Thaise, você também atua como professora de Música pela rede de ensino do Governo do Distrito Federal. Você acredita que a música é um passo para mudar as pessoas? Como você enxerga seu papel dentro da educação?
A música permeia tudo a todo momento. Somos diretamente influenciados pelas frequências que nos cercam, e o poder terapêutico e curador da música é inegável. Para além da minha vivência pessoal, acompanho diariamente a revolução que é produzir arte com crianças e jovens. Dentro da Secretaria, atuei em centros muito privilegiados artisticamente, como a Escola Parque 308 Sul e, atualmente, no Centro de Ensino Especial de Deficientes Visuais (CEEDV). Neste, que atuo com cegos, pessoas de baixa visão e paralelamente outras deficiências, vejo o poder de fazer uma pessoa sair da cadeira de rodas e caminhar, de alguém com extrema dificuldade de falar, cantar, e por aí vai. A música opera milagres!
Além da Mandalla, Thaise também integra, como baterista, o projeto “Nuggettz”, um power trio de duo orgânico composto por Frango Kaos (da banda Galinha Preta e técnico de som do Hamilton de Holanda) e Caio Bahia.
Acompanhe o trabalho da artista: